Escuro.
Eu observava o escuro a dias. O cheiro do mofo invadia minhas narinas e incomodava meu estômago, que faminto rejeitara aquela comida horrivel - se é que se pode chamar aquela lavagem de comida -, e doía em agonia querendo algo para o preencher. Assim se igualava meu coração, que faminto de saudade esperava meu amor. Eu contava os minutos desde a matina, quando o filho do carcereiro havia me anunciado as horas antes de partir. Meu coração explodia em agonia, eu havia sonhado um futuro para nós...
Mas eu sabia. Sabia como as moças que casei escondido com os soldados de guerra que o futuro com filhos e a convivência com a pessoa amada, o futuro tão sonhado, não viria.
Oh, sombra que me guiava eternamente por meu passado desprezível, as horas para minha execussão passavam lentamente esmagando minhas esperanças, fazendo minha alma cravar as unhas no chão batido de terra em que eu estava dolorosamente sentado desde a vinda de meu convidado. Ele pegara não só meu coração, mas minhas esperanças...
Enquanto a solidão dolorosa percorria minhas veias as deixando doloridas eu me perguntava o porque de ter os casado. Porque eu havia o feito mesmo com o imperador me dizendo para não o fazer? Eu não entendia o porque, eu não entendia o porque de eu o ter feito.
Mas metade da explicação foi me dada ao ver ele, seus olhos amendoados, seus cabelos pareciam raios de sol ao entardecer, de um loiro meio escuro. Sua pele branca e macia que parecia algodão, sua risada longa e melodiosa, seu olhar gentil, seus lábios doces e macios... Eu havia ficado enfeitiçado, ele havia jogado uma praga em mim, havia me feito apaixonar por ele.
Como eu, um homem religioso poderia me apaixonar por outro homem? Eu também não conseguia entender, mas eu sei que me apaixonei ao sentir minhas borboletas no estômago quando este deu um abraço mais demorado em mim e suspirou em minha nuca, me causando um arrepio.
Isso aconteceu no dia ao qual minha sentença foi dada. Maldito carceireiro! O pai de meu amor havia nos denunciado, nos achava repugnantes, e o imperador em menos de dois dias já havia me sujeitado ao crime de traição, e minha punição era a morte.
Não consigo compreender meus próprios pensamentos. A sabedoria de que dali a algumas horas eu conheceria o verdadeiro inferno, pois, o crime que eu havia cometido em sã consciencia, era punido com a morte eterna.
Todo amor é punido com a morte? Pois eu estava sendo punido com a morte por parte em realizar o matrimônio dos casais apaixonados que vinham a mim, e por parte em amar um homem. Porque morrer soa tão ruim?
Um homem corajoso é aquele que morre todos os dias para viver mais um dia amando. E eu queria ser esse homem, eu queria ter a coragem de meu amor.
Oh, que triste ilusão seria poder viver e transparecer esse amor puro e lindo que aprendi que existe. Doce e dolorida ilusão de que um dia, em um futuro longíquo, o mundo e as pessoas achassem algo assim lindo. Seria pecado fazer um pedido desastroso a Deus?
Pois, se eu tivesse um último pedido, pediria que existissem mais amores puros e sinceros, mais igualdade e mais perdão.
Ah, o perdão. Me soa tão familiar essa palavra; pois fui educado a perdoar meu agressor, meu subordinado, meu superior, meus familiares, as pessoas que me fizeram ou fazem mal. Entretanto nunca me fizeram aprender a me perdoar. E é dificil pensar no conceito de perdão, pois, como perdoar a mim por pecados que cometi por amor?
Enquanto minha mente alimentava um monólogo sem fim os minutos se arrastavam, então decido me levantar e andar por minha cela, eu precisava esfriar minha cabeça, precisava respirar pois a adrenalina já estava aplicada em meu sangue, que percorria tão rapidamente em meu corpo fazendo meu coração dar saltos e pulsar tão violentamente que me fazia passar mal.
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Senhor Céu
Short StoryVocê acredita no amor? Ou que ele faz milagres? Mas e se os verdadeiros milagres forem na verdade tão simples que seriam invisíveis ao olhos? Deixaria de ser um milagre? E seu eu, o céu, lhes contasse uma história? Uma história de dor, sofrimento...