• F E L Í C I A •

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"Quando o mundo estiver unido na busca do conhecimento, e não mais lutando por dinheiro e poder, então nossa sociedade poderá enfim evoluir a um novo nível."

- Charles Bukowski, Mulheres.








Ela estava sentada no chão imundo do banheiro e seus olhos estavam embaçados, as paredes e chão pareciam se movimentar; Ela não sabia o que culpar, as lágrimas teimosas e que queimavam o contorno do seu rosto ou o enjôo e nojo que sentia de si mesma. Acho que ela nem sequer pensava, apenas abraçava seu joelho, desejando ficar pequena e sumir.

Quanto mais Felícia tentava por um rumo diferente a seus pensamentos mais aquelas imagens invadiam sua mente a fazendo se encolher mais e mais. E eu sei que ela podia ainda ouvir o som alto da música e as risadas de pessoas que nem sequer imaginava que o mundo de alguém ruía naquele lugar que exalava diversão e felicidade.

"Um, dois, três.." Felícia pensava tentando ter coragem para se levantar, mas a dor queimava no seu corpo, já o medo e a vergonha pareciam com um fantasma sentado em seus ombros e a empurrando para baixo. Felícia viveu ouvindo que ela tinha que ficar por baixo, por baixo dos namorados ou maridos, por baixo do seu chefe, do seu colega de trabalho, do seu vizinho, do cara que entregava as suas contas de água, e ela nunca se permitiu engolir isso, nunca aceitou, nunca tomou como seu o que algumas garotas, e mulheres mais velhas diziam; " Se queres sucesso, deites-se com um homem de sucesso. Se queres uma promoção, esteja por baixo do seu chefe, por mais que eu ache que você apenas deveria ficar em casa e servir o seu homem, antes que ele vá procurar na rua o que não tem em casa." E ela achava aquilo um absurdo! E era um absurdo! Era terrível e esmagador, viver presa a um legado que ela nunca quis ou desejou. Desde pequena ela nunca aceitou essas amarras, ela não podia, se ela abaixasse a cabeça uma vez, sabia que nunca mais teria a chance de controlar a sua vida, e assim ela seguiu.. seguiu até hoje.

Depois da faculdade ela e mais uma galera decidiu que seria ótimo ir para uma festa, e ela não negou, ela era livre para fazer ou agir do modo que quiser, ou pelo menos ela pensou que fosse. Felícia não tinha interesse em ninguém estava muito bem consigo mesma e com os seus amigos.

Entre papos furados e dancinhas ridículas, um conhecido de um colega do curso de Felícia se aproximou, ele e a namorada, papo vem e papo vai entre a rodinha de amigos, e Felícia se afasta para avisar a mãe que demoraria para chegar em casa pois estava com os amigos da faculdade numa festa e não precisava se preocupar, pois ela não estava bebendo. Gigantesco e desastroso engano.

"Olá" o rapaz que estava a minutos antes acompanhado da namorada disse sorrindo, enquanto levava o copo de bebida até a boca.

"Olá" Felícia respondeu e sorriu, por puro costume, odiava pessoas emburradas, e valorizava sorrisos, sempre achou que um sorriso poderia mudar a vida de uma pessoa, e quem sabe até o rumo do mundo.

"Sou Eduardo.. e você é Felícia, certo?" Ele perguntou analisando Felícia da cabeça aos pés.
"Sim, Felícia.." Ela respondeu por um momento não se deixando intimidar pelo olhar que ele direcionou a ela, e algo dentro dela gritava para se afastar, mas a única coisa que fez foi pegar o celular e mandar uma mensagem escrito "Eu te amo muito." Para a sua mãe.

O hálito do rapaz fedia a bebida.. Felícia se abraçou enquanto se afastava do rapaz, quando pensou que estava livre daqueles olhares que a deixava desconfortável suspirou pesadamente e continuou fazendo o seu trajeto até o bar. E então Eduardo segurou no braço dela a fazendo girar e mirar em seus olhos. O rapaz não estava mais acompanhado do copo, mas carregava consigo um sorriso de superioridade, e um brilho intenso nos olhos.

"O que você quer?" Falou Felícia para o homem, e ele bufou uma risada e a puxou para uma porta lateral que dava a um beco sujo e mal iluminado. Felícia ficou aturdida enquanto o mesmo a puxava. Ela tentou organizar as palavras e a ordem delas na sua cabeça para então falar "Me solta! Eduardo! Me solta, está machucando!" E então ele a jogou em cima de alguns sacos de lixo e sorriu.

"Pronto Felícia, soltei." E ele riu como se a situação fosse engraçada. Felícia tentou se levantar mas ele a empurrou novamente.

"O que você quer?" Felícia perguntou sentindo algo subir na sua garganta. Eduardo revirou os olhos como se fosse óbvio, e abriu os braços.
"Ué, por quê a pressa? Nós vamos brincar."
As batidas cardíacas de Felícia falharam algumas vezes, dando uma pontada forte no seu peito.

"Não, nós não vamos." Felícia disse se levantando mais uma vez e aproveitando que ele ficou desconcertado com a resposta e a falsa calma da garota e tentou se afastar dele.

"Você só abre a boca para me chupar, vadia!" Eduardo disse quando a pegou pelos cabelos e a jogou novamente nos sacos de lixo enquanto Felícia gritava, mas ninguém a ouviu, estavam todos bêbados demais, ou presos nas próprias bolhas de falsa segurança e paz.

Eduardo se jogou em cima da garota que congelou de medo, pois sabia o que estava por vir. Felícia abria e fechava a boca mas nenhuma palavra podia parar Eduardo, nenhuma palavra faria ela voltar no tempo, e nenhuma tinha impacto ou significado tão intenso para poder ao menos simplificar tudo o que ela sentia naquele momento.

Nenhuma palavra nunca iria reconstruir e purificar a sua alma, a sua mente e seu corpo, nada seria o suficiente para ela se sentir limpa e digna mais uma vez. O controle sobre ela, a vida dela, o corpo dela, era uma mera ilusão.

O pânico corria solto enquanto ele levantava a saia que ela havia pegado emprestada com uma amiga da faculdade. Os olhos dela brilhavam pelas lágrimas acumuladas quando Eduardo rasgou a calcinha dela.

Quando Eduardo a penetrou a força, ela sentiu como se rasgasse por dentro e mesmo assim nenhuma lágrima caiu. Ela até tentou se convencer de que estava gostando, que era bom, mas ela apenas se sentia como um rio límpido que foi poluído. Enquanto Eduardo gemia e suava em cima dela, da garota sem ação, ela repassava todos os momentos desde que Eduardo apareceu com a namorada, ela queria entender o por que, saber se ela tinha dado a entender que queria isso, e em momento algum ela representou querer isso.

Ela sentiu o gozo quente dentro dela, e em seguida Eduardo tentar enfiar a sua língua nojenta dentro da boca dela.

"Eu te amo" Eduardo sussurrou e saiu de lá, deixando a garota para juntar seus restos.
Felícia se levantou e foi até o banheiro, mas antes pode avistar Eduardo beijando a namorada, e sentiu tanta dó da garota da mesma forma que ela sentia dó dela mesma agora. Ela entrou no banheiro e deixou seu corpo escorregar na parede até se sentar no piso frio.

Sua vagina doía, seu corpo, alma, mente, coração doíam como se estivessem dilacerados, e eles estavam. Felícia lavou o rosto e tentou contar até dez, mas ela não conseguia lembrar a ordem dos números.

Ela saiu do banheiro, caminhou para fora da boate se esbarrando em todos, nada importava, não mais. O vento frio a atingindo como se cortasse sua pele com micro navalhas. Ela carregava seu salto enquanto tentava afastar cada pensamento, cada imagem e som.

E ela chegou num viaduto, Felícia sabia que ela não era relevante para a mídia e nem Eduardo, sabia que nem para a polícia seria, que não levaria a lugar nenhum, que apontariam dedos na sua cara que a machucariam fazendo ela relembrar de tudo aquilo.

Felícia sabia que era boa demais para um mundo tão feio e cruel.






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Minha primeira história postada aqui, perdoem qualquer erro. Espero que gostem! Obrigada. ♥

Mianna Ninfs.

FELÍCIAOnde histórias criam vida. Descubra agora