Prólogo

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Gwen abriu os olhos lentamente, sua cabeça latejava por causa de uma dor insuportável no couro cabeludo. Ela levou uma das mãos até o que parecia ter sido uma pancada forte que lhe deixara inconsciente por algumas horas e fez uma careta de dor ao encostar na ferida aberta. A menina limpou os dedos – agora sujos de sangue – na calça jeans surrada e se levantou com cautela do chão frio e úmido onde deitava. Seu olhar passeou pela cabana de madeira pequena e extremamente mal cuidada. Parecia que um furacão havia passado por ali – as janelas estavam rachadas, os móveis cobertos de poeira e alguns objetos quebrados – havia pedaços de vidro e porcelana para todo o lado. Ela escutou o barulho das árvores altas se movendo no lado de fora e, no mesmo instante, uma brisa gelada invadiu a casa deixando os pelos de seu corpo arrepiados.

A garota girou o corpo dolorido e encarou seu reflexo caótico no espelho pendurado logo a sua frente. Ela tinha um corte comprido na lateral do rosto e vários outros espalhados pelas mãos branquelas; seu coturno preto estava coberto de lama, sua calça rasgara na altura do joelho e seu casaco militar havia lhe salvado de outros possíveis ferimentos nos braços; o cabelo loiro estava totalmente desgrenhado e com milhares de nós.

Mais uma vez o machucado em sua cabeça latejou, deixando claro que, quem fora que tivesse feito aquilo, não estava para brincadeira. Ela não sabia como chegara até aquele local e também não tinha a mínima ideia de onde poderia estar – seus olhos não reconheciam a paisagem ao redor.

A última coisa que Gwen lembrava era de estar caminhando livremente pelo campus da faculdade. A imagem de Josh se distanciando dela depois da aula ainda estava muito vívida em sua memória: o largo sorriso reluzente em seus lábios e o emaranhado de cachos acobreados, que quase caíam sobre os olhos azuis do rapaz – olhos aqueles que mudavam de cor conforme seu humor e que não escondiam a felicidade dele naquela manhã. Assim como a serenidade que a garota carregava no coração não escondia a sua própria felicidade. Estar com Joshua era como estar em paz, e Gwen finalmente se sentira em casa depois de muito tempo deslocada.

Mas ele não estava ali com ela naquele momento. Espantando os pensamentos que começavam a lhe distrair, a loira abriu os olhos para a realidade – estava sozinha, como jamais estivera. Seu peito apertou e a garota pode sentir algo ruim prestes a acontecer, algo sombrio, que aumentava gradativamente sua ansiedade e fazia seu coração querer saltar pela boca.

Com o desespero batendo, Gwen agarrou o primeiro objeto pontudo que encontrou no chão – um pedaço de vidro que se estilhaçara – e o colocou dentro do bolso do casaco. Procurando seu celular, ela deduziu que o mesmo havia sido confiscado e, agora, as únicas coisas que ela carregava eram um pedaço de chocolate derretido e um botão que havia caído de alguma camisa velha.

Lentamente, começou a dar passos curtos e silenciosos. Seus olhos verdes ficaram bem abertos e atentos a qualquer outra movimentação estranha, suas pernas a guiaram por um corredor escuro, até a porta da frente. Ela checou nas janelas, mas não conseguiu ver ninguém no lado de fora, estava tudo tão calmo quanto água parada. Assim, com cuidado, pegou na maçaneta e a forçou para frente, na esperança de que a fechadura não estivesse trancada.

Tentativa falha.

No mesmo momento, vozes soaram através da porta. O chão de madeira estalou com passos pesados e um barulho de salto alto batendo sobre a varanda ecoou. Os olhos da loira se arregalaram com o repentino medo que lhe atingiu. Ela andou para trás e enfiou a mão – que agora tremia – no bolso, segurando firme aquilo que guardara alguns minutos atrás. A porta fora aberta antes que Gwen pudesse se preparar.

Sua primeira reação foi apontar a única arma que possuía para a garota que surgira na sua frente. A expressão assustada da loira se contraiu e seus músculos ficaram ainda mais tensos. Um grande ponto de interrogação parecia estar estampado em sua cara quando ela reconheceu aquela imensidão de fios negros e sedosos: com certeza não esperava aquilo. Os cabelos ondulados desciam por toda a extensão de suas costas, o par de olhos castanhos e misteriosos estava extremamente escuro naquele dia, seus lábios carnudos carregavam o batom cor terra de sempre, e a pose – com certa vulgaridade – continuava intacta. Charlotte Young sorriu e o corpo inteiro de Gwen entrou em alerta. O que ela estava fazendo lá?

A Shot in the DarkOnde histórias criam vida. Descubra agora