[manu ou 19:07]

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Era o aniversário de seu pai e Manu queria fazer algo especial para ele. Deixou a irmã cuidar dos convites — era o que Duda fazia de melhor: design —, e sua tia da decoração. Manu ficou com a parte da comida. Não, ela não era obrigada a cozinhar, até os seus doze anos seu pai acordava todo dia mais cedo e deixava a comida pronta para as meninas, junto com a casa arrumada e só parou quando Manu pediu.

Seu pai se divorciou da sua mãe quando Manu tinha sete e Duda cinco. Sua mãe viajava muito, não lutou pela guarda das meninas que passaram a maior parte do tempo na escola e em aulas de linguagens de sinais, até voltarem para casa. Pelo menos os dias de Manu eram assim, Duda era nova demais e a tia só conseguiria cuidar de uma mesmo.

Manu passou a ter gosto pela culinária quando via o pai cozinhar aos sábados e domingos. Começou com bolos, passou a tortas até a menina fazer de tudo um pouco. Ela sentia prazer em fazer isso, não obrigação.

— O que de bom você está fazendo, querida? — sua tia pergunta olhando a panela com molho vermelho no fogo. Ela não sentia gosto pela culinária, gostava de comer o que preparavam, mas fazer não.

— Lasanha. — a menina de cabelos parcialmente verdes diz mexendo o molho — E tem bolo de baunilha no forno, os preferidos do meu pai. — a tia lhe sorri.

— A decoração está quase pronta —  pega alguns pratos no armário — Duda disse que a maioria está a caminho e Rodrigo trará seu pai — Rodrigo era quem trabalhava com o seu pai e melhor amigo, era como outro pai para Manu e Duda. — O guichê está pronto para servir os convidados? — ela aponta para bandeja e logo Manu coloca dois molhos em potinhos e entrega a tia. — Obrigada, querida. — sua tia volta para a sala.

Depois que sua tia se retira, o relógio mostra que já está na hora de tirar o bolo do forno. Pega um garfo e constata que realmente está no ponto, tira do forno e deixa esfriar para depois desinformar, rechear e confeitar. Como já tinha feito várias lasanhas em sua vida, foi rápido montar e colocar no forno, só a louça que não foi muito convidativa.

— Você é a filha do Rafael? — uma moça muito bonita de cabelos curtos pergunta. Manu houve algumas vozes vindo da sala.

— Sim. — sorri simpática, o que ela é em alguns casos — Trabalha com o meu pai?

— Finanças — ela fala enquanto vê nossa protagonista que até agora vocês só conhecem as partes boas enxaguar a última panela. — Você que cozinhou? — pergunta curiosa, mas com um pouco de desdém.

— Sim. — Manu sorri por estarem falando de algo que gosta — E fiz o bolo também.

— Nossa. — ela fala, mas não com admiração.

— Eu gosto muito disso. — fala antes que achem seu pai um aproveitador. — Tenho paixão. Faço tricô também, fiz um suéter para o meu pai. — ela continua, mostrando o embrulho em cima do balcão e indo recheiar o bolo.

— Você é machista? — a pergunta pega Manu de surpresa e quase deixa o recheio cair no chão. Não se mostra abalada e recheia como se fosse a pergunta: tudo bem com você?

— Não. — ri para mostrar que aquilo só poderia ser uma piada — Por que seria? — resolve instigar.

— Cozinha, faz tricô. Seu pai te obriga a isso? Ainda vivem no tempo dos homem sapiens?

— Eu cozinho porque gosto. Faço tricô porque gosto. E desde que eu saiba, feminismo é igualdade entre os sexos, não eu ser proibida de fazer certas coisas porque, pelo que você diz, são coisas de mulher. — ele responde mal criada, e isso é só o começo da parte ruim de Manu que vocês estão vendo — Meu pai também tricota. E tricota comigo, por sinal. — a mulher não responde nada, apenas sai para sala depois do olhar que recebeu de Manu, essa é a Manu de quem gosto.

Manu termina de recheiar e decorar o bolo, deixando o assunto para lá, o guarda na geladeira e vai conversar com os convidados. Seu pai está a caminho, a lasanha está quase pronta. Ela não vai se abalar por um comentário de alguém que se considera feminista, mas nem sabe o que é isso. Hoje é o dia do seu herói, e vai comemorá-lo porque ele merece, não por ser homem.

•••
Ironia de novo publicar esse no dia dos pais. Só eu mesmo. Escrevi isso quando disse para alguém que eu que cozinho em casa e fui acusada de machista, sendo que quando chego mais tarde, meu avô faz o almoço. Acho que as pessoas deveriam ver o significado de feminismo antes de falar o que não deve.

Notas de GinaOnde histórias criam vida. Descubra agora