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Terminei as últimas linhas do meu diário e o larguei na mesa de cabeceira da cama junto com a caneta que estava usando. Me virei de lado para encarar Spence: era 8 da manhã e ele já estava vestido, impecável como sempre, recostado nos travesseiros e concentrado em sua leitura. Eu ainda estava de pijama, com o rosto amassado e morrendo de preguiça de levantar.

Observei Spence mais um pouco. Enquanto sua mão esquerda segurava o livro antigo por trás da capa dura, a direita percorria com o dedo indicador levantado as palavras de cada página numa velocidade inacreditável. Até hoje ainda não entendia como ele conseguia ler e entender tudo tão rápido.

- O que foi? - ele perguntou com um sorriso nos cantos dos lábios, mas sem parar com sua leitura.

- O que você está lendo? - respondi com outra pergunta.

- Relendo, na verdade. Jane Austen, "Orgulho e Preconceito". - ele disse sério. Seus dedos ainda não hesitavam na página.

- Você só pode estar brincando, né? - soltei uma gargalhada que finalmente o fez parar de ler por um segundo - Por que você está relendo isso?

Não que eu não gostasse de Jane Austen (pelo contrário, já havia lido quase todas as obras publicadas dela). Mas aquilo não parecia em nada com o tipo de coisa que Spence releria em algum momento.

- Garcia e eu estávamos falando sobre a história esses dias. - ele soltou o livro em seu colo - Ela contou sobre um filme novo que traz uma releitura do livro com zumbis. - ele franziu a testa - É claro que na hora eu achei uma péssima ideia, mas pensando agora até que poderia ser interessante...

Spence se perdeu em seus pensamentos por alguns instantes antes de dar de ombros e voltar ao livro. Fiz nenhum comentário, apenas continuei olhando para ele.

- Ok, - ele disse fechando o livro e largando na cabeceira - não consigo fazer isso.

- Isso o quê?

- Você está olhando muito. - ele ameaçou se levantar da cama numa tentativa falha de tentar esconder, mas era tarde demais: eu já tinha enxergado suas bochechas rosarem.

Pousei a palma da mão em seu peito e o impedi de se levantar.

- Você não vai fugir de mim com essas bochechas vermelhinhas.

Me inclinei sobre ele e deixei meus lábios encostarem nos dele. Depois beijei sua bochecha e afastei meu rosto, voltando a observá-lo. Ele também virou de lado e me olhou por alguns segundos antes de falar:

- Não larguei minha leitura só pra isso. - com um sorriso irônico nos lábios ele me beijou de novo, de novo e de novo. Quando percebi, já estava inteiramente de costas para a cama. O cabelo macio de Spence caia sobre seu rosto e tocava suavemente o meu.

As mãos dele estavam apoiadas na cama enquanto as minhas acariciavam seu rosto, seus cabelos e sua nuca.

- Preciso ir me trocar... - sussurrei com dificuldade num instante que seus lábios desencontraram os meus. Eu não tinha vontade de sair dali, isso ficava bem claro.

- Está bem... - ele disse com um nítido aborrecimento na voz. Me deu mais um beijo e abriu espaço para que eu levantasse da cama.

Fui direto à sala, onde encontrei meu celular com incontáveis notificações, a maioria eram mensagens de minha amiga Anna. Ela estava em férias viajando com James para algum país estranho da Ásia, o que fez todas aquelas notificações me deixarem preocupada. Pulei direto para a última mensagem para tentar descobrir do que tudo aquilo se tratava.

"MAGGIE, ELE PEDIU!!!! Era por isso que tava tudo tão estranho!! ELE ME PEDIU EM NAMORO!!! Não posso acreditar que você não está atendendo o telefone. Mas não sei que horas são aí por causa do fuso horário. Enfim, me ligue assim que ler isso, ok? ME LIGUE! Preciso contar tudo."

Terminei de ler a mensagem e suspirei aliviada. Era claro que Anna faria um escândalo por qualquer coisa fora do comum que acontecesse nessa viagem. E, bem, realmente era algo muito bom (eu acho). Fiz rapidamente um cálculo mental e cheguei à conclusão de que quem estaria dormindo naquele momento seria Anna. Achei melhor ligar para ela mais tarde.

Toda essa confusão me fez lembrar de outra coisa.

- Já está tudo certo para sua viagem? - perguntei a Spence enquanto ia para o banheiro. Provavelmente ele havia voltado para seu livro.

- Sim. Passagens reservadas, Garcia já combinou tudo com Emily. - ele respondeu.

Spence iria viajar dali duas semanas para Londres, onde participaria como um dos doutores convidados de um congresso sobre ciências criminais. Penelope iria junto, mas não para o congresso. Ela aproveitou para tirar uns dias de folga e decidiu que iria visitar Emily em Londres (como fazia todos os anos desde que Emily havia se mudado para lá).

Emily Prentiss, ex-agente do FBI. Atualmente, ela chefiava o escritório da Interpol em Londres. Antes de se mudar, ela trabalhou durante muito tempo na BAU e criou um forte vínculo com todos os agentes. Eu nunca havia visto Emily pessoalmente, mas ouvia falar tanto e tão bem dela que sentia como se já nos conhecêssemos.

Spence e Penelope ficariam hospedados na casa de Emily, já que ela havia se disponibilizado e insistido muito. E eu ficaria por mais de duas semanas sozinha, sem ter Spence por perto.

Tá, não é como se minha vida fosse acabar ou eu fosse entrar em depressão profunda. Eu sou independente, sei e vou me virar muito bem sozinha como sempre fiz. Mas não posso negar que já sentia um aperto no peito  quando pensava que ele iria ficar longe por tanto tempo. Eu, com certeza, sentiria a falta dele.

Entrei no banho e tentei deixar para trás aqueles pensamentos. Não adiantava nada ficar sofrendo antes da hora, já dizia minha mãe. Além disso, eu não poderia demonstrar esse sentimento para Spence. Eu havia o encorajado a ir nessa viajem desde que o convite surgiu, não queria que ele cogitasse ficar por causa minha. E tenho certeza que ele desistiria de tudo ao meu menor sinal de fragilidade. Era assim que ele agia depois do "incidente", ele tomava conta de mim melhor do que eu jamais poderia imaginar. Não, eu não faria isso. Tudo ficaria bem.

Um amor inesperado II (Criminal Minds)Onde histórias criam vida. Descubra agora