Robert Desnos.

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Os espaços do sono – Robert Desnos (Tradução de Eclair Antônio Almeida Filho)

À noite há naturalmente as sete maravilhas do mundo e a grandeza e o trágico e o encanto.

Nela as florestas se chocam confusamente com criaturas de lenda escondidas nos bosques.

Há você.

Na noite há o passo do caminhante e o do assassino e o do agente de polícia e a luz do revérbero e a da lanterna do trapeiro.

Há você.

Na noite passam os trens e os barcos e a miragem dos países onde é dia.

Os derradeiros sopros do crepúsculo e os primeiros arrepios da aurora.

Há você.

Uma ária de piano, um brilho de voz.

Uma porta range. Um relógio.

E não somente os seres e as coisas e os ruídos materiais.

Mas ainda eu que me persigo ou sem cessar me ultrapasso.

Há você a imolada, você que eu espero.

Por vezes estranhas figuras nascem no instante do sono e desaparecem.

Quando cerro os olhos, florações fosforescentes aparecem e murcham e renascem como carnosos fogos de artifício.

Países desconhecidos que percorro em companhia de criaturas.

E há você sem dúvida, ó bela e discreta espiã.

E a alma palpável do espaço.

E os perfumes do céu e das estrelas e o canto do galo de há 2 000 anos e o choro do pavão em parques em chama e beijos.

Mãos que se apertam sinistramente numa luz baça e eixos que rangem sobre estradas medusantes.

Há você sem dúvida que não conheço, que conheço ao contrário.

Mas que, presente em meus sonhos, te obstinas a neles se deixar adivinhar sem aparecer.

Você que permanece inapreensível na realidade e no sonho.

Você que pertence a mim por minha vontade de possuí-la em ilusão, mas que não aproxima seu rosto do meu como meus olhos fechados tanto ao sonho como à realidade.

Você que a despeito de uma retórica fácil em que a onda morre nas praias, em que a gralha voa em usinas em ruínas, em que a madeira apodrece rachando-se sob um sol de chumbo.

Você que está na base de meus sonhos e que excita meu espírito pleno de metamorfoses e que me deixa sua luva quando beijo sua mão.

À noite há as estrelas e o movimento tenebroso do mar, dos rios, das florestas, das idades, das relvas, dos pulmões de milhões e milhões de seres.

À noite há as maravilhas do mundo.

À noite não há anjos da guarda, mas há o sono.

À noite há você.

No dia também.

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