Prólogo

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Sentada no terraço do prédio em que morava, Anne escrevia em seu caderninho preto. Nos últimos dois meses, a escrita fora sua grande aliada, ajudando-a a botar para fora tudo aquilo que sentia, e que reprimia dentro de si mesma. Toda aquela dor, toda aquela saudade. A mágoa, a tristeza... Tudo. Praticamente tudo ia para o caderninho. Ela não podia falar pra ninguém mais, simplesmente porque ela não tinha ninguém. O caderno era como se fosse uma espécie de diário, com exceção de que no diário, ela não escrevia os acontecimentos do dia do ponto de vista dela. Era um diário de lembranças. E Anne tinha um método peculiar na sua escrita: ela escrevia cartas. Cartas que jamais seriam enviadas. Que jamais seriam lidas por ninguém além da própria Anne. Por quê? Bem, porque os destinatários, como diria Augustus Waters, não sofriam mais de pessoalidade. Anne escrevia cartas para os mortos, mais especificamente, sua mãe e sua irmã. Ela gostava daquilo, eram desabafos, segredos, histórias. Uma vez por dia ela subia ali, sentava-se, pegava o caderno e a caneta, e deixava a mente voar pelo passado. Ela entrava em um dimensão que só ela, a irmã e a mãe compartilhavam, ainda que na memória, e colocava tudo no papel, cheia de emoção. Eram os únicos momentos do dia em que ela se sentia feliz, sem dor, sem sofrimento. E melhor ainda, sem o vazio. Ali, naquele terraço, revivendo aquelas memórias, ela se sentia completa. Mas um pedacinho da sua mente dizia que ainda faltava algo, e Anne sabia exatamente o que faltava. E ela faria de tudo para chegar lá. E foi em uma noite estrelada de quinta-feira, com a lua cheia, brilhando, que Anne McCoy começou a elaborar seu plano suicida.

Never Let Me Go [#SetembroAmarelo]Onde histórias criam vida. Descubra agora