~ Parte II ~

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    Por muito tempo na minha vida eu me importei demais e logo senti demasiadamente também, isso foi o que me quebrou em milhares de pedaços ao longos dos anos. Depois veio o amor, sentimento que nunca fora recíproco em minha vida, e tiveram com isso as partidas; muitas vezes sem um único 'tchau'.

Desde sempre todos diziam: "Júlia, você dramatiza demais as coisas.". Mas só apenas eu sabia o que se passava aqui dentro de mim. É bem verdade que nada muito trágico me aconteceu, não posso mentir.

Pela primeira vez desde que começamos a conversar, Cássia ficou quieta. O silêncio se instalou por alguns minutos, até que um médico o quebrou assim que adentrou o quarto.

— Olha só, você parece bem — ele falou olhando diretamente para mim. — Sabia que você estar viva é um milagre?

— É o que parece — respondi rapidamente. — Posso ir embora agora?

— Não. Você está de observação. Poderá ir amanhã, mas antes tem que falar com nosso psicólogo, ele virá em breve — disse ele, virando-se para minha colega de quarto. — E você, Cássia?

— Estou bem.

— Isso é ótimo! — falou animado.

— Gostaria que falasse com meu pai, quero ir para casa — o semblante dela se fez sério. — Eu lutei com todas as minhas forças, fizemos o que era possível, você sabe doutor, quanto tempo. Não há mais nada aqui para mim e eu aceito isso — falou. — Por isso quero que peça a ele, para me levar.

— Você sabe que estando aqui você tem...

Ela o interrompeu:

— Mais algumas horas? Não. Por favor, fale com ele, diga que ele pode me levar para a estrada, não quero morrer aqui.

O médico assentiu e saiu do quarto sem nada dizer. Aquelas palavras de Cássia, tocaram meu coração, ele estava apertado. Até meus olhos se encheram de lágrimas, que eu veemente segurei.

As pessoas se agarram resistentemente ao tempo, todos o querem mais. Acredito eu, que ele seja muito injusto.

Por alguma razão não consegui deixar de pensar que tudo que essa garota tinha era tão pouco agora, sabe-se lá quanto tempo me resta de vida, enquanto ela estava preparada, mas nitidamente não desejava morrer.

— Para onde você quer ir?

— Para qualquer lugar — ela respondeu. — Meu pai insiste que eu fique aqui, não posso culpá-lo por querer que sua única filha fique viva o máximo de tempo possível. "Não é certo que um filho morra antes dos pais."  Ele sempre diz — Cássia falou um tanto desanimada. — Mas se não fosse por ele, eu estaria sem dúvida nenhuma na Itália agora. Eu não estaria aqui, estaria aproveitando o bem mais precioso que ainda tenho: a vida, seguindo em frente. Porque já perdi muitas coisas e pessoas, só que esse é o curso da vida.

— Sinto muito — foi tudo que consegui dizer.

— Você já me disse isso — ela riu.

— Juro que não consigo entender como pode rir num momento desses.

— Eu já chorei muito, e isso não mudou nada. E você ainda quer morrer? — ela inquiriu de supetão.

Olhei diretamente nas íris dela. Em torno dos seus olhos se podia ver as olheiras que a tempos se formaram ali. Todas as vezes que eu olhava para ela, sentia raiva de mim mesma, por querer desistir, por sequer cogitar a ideia... A visão de Cássia transmitia esperança, eu sentia que em pouco tempo até mesmo as paredes bege-fusco do quarto estariam tomados por tal sentimento.

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