Célia não soube o que fazer ao abrir o presente de aniversário que ganhou de seu genro. Ficou alguns momentos olhando para o conteúdo daquela caixa de madeira forrada de veludo sem saber o que dizer.
Já tinha se acostumado com o jeito meio esquisitão de Laercio: sempre falando de assuntos místicos, esotéricos... palavras que ela achava estranhas como "egrégoras" e "devas".
Totalmente diferente de sua filha Lia. Aquela era absolutamente cética: só acreditava naquilo que um (ou mais) sentido pudesse comprovar. Nem religião ela tinha.
A despeito disso, Lia e Laercio se davam muito bem. Já estavam casados há quase dois anos, o que, convenhamos, nos dias de hoje é uma marca respeitável.
E agora ele aparecia com esse presente: dentro da caixa, que tinha mais ou menos o tamanho de metade de uma caixa de sapatos, repousava sobre um veludo azul, a mais perfeita bola de cristal que ela já vira!
Depois de alguns momentos finalmente conseguiu dizer algo:
– Obrigada! É linda...
– Realmente é muito bonita – respondeu Laercio – eu sei que a senhora gosta dessas coisas de adivinhação então achei que ia gostar desta bola de cristal. Ela pode ser consultada, sabe? Como um jogo de búzios ou um baralho de tarô.
Célia que sabia ver a sorte pelo tarô (na verdade mais brincava do que realmente interpretava realmente aqueles arcanos) ficou interessada. Imagina "ver" alguma coisa, de verdade, numa bola de cristal!
– Na verdade, consultar uma bola de cristal requer muito treino – continuou Laercio – e eu sei que não dá para ensinar muita coisa em poucas palavras, mas eu queria dizer só duas coisinhas:
– Primeiro, consulte a bola num lugar sossegado, tranquilo, em que não seja interrompida a qualquer momento. Longe de celulares e com pouca claridade. Segundo, acenda uma vela, e isso é importante: sempre a coloque a ESQUERDA da bola! Nunca à direita, ok?
Célia prestou atenção nas palavras de Laercio e concordou. Iria experimentar quando tivesse tempo.
...
E a oportunidade surgiu uns dois dias depois, num dia em que tinha voltado mais cedo do trabalho, umas 3 horas da tarde, e não tinha nenhuma tarefa importante a fazer em casa.
Tirou a bola da caixa e colocou-a sobre seu suporte (um pequeno cálice dourado) em cima da mesa que tinha no quarto. Fechou a porta e as cortinas, acendeu uma vela branca e posicionou-a a esquerda da bola, conforme orientação de seu genro, um pouco para trás da mesma.
Sentou-se em frente da mesa e ficou olhando.
Concentrou-se no reflexo da luz da vela que brilhava no suporte da bola que podia vê-lo nitidamente através da mesma, tal era sua transparência.
Alguns minutos se passaram e Célia já estava ficando entediada por não conseguir enxergar nada de especial. Apenas o reflexo da vela, o suporte, e o tampo da mesa atrás da bola, de madeira escura.
Então pareceu que o fundo da bola começou a ficar leitoso. Célia piscou e a impressão desapareceu. A bola voltou a ficar totalmente transparente como antes. Ela soltou um suspiro de desânimo, mas continuou a fitar a bola.
Concentrou-se ainda mais e o fundo da bola começou a ficar novamente opaco. Era como se uma fina névoa estive se formando no fundo da bola, de tal forma que ela já não conseguia ver direito o suporte e a mesa através da bola.
Mais alguns minutos e a 'névoa' começou a se dissipar. Célia percebeu então, que havia algo verde por baixo. Um gramado! E algumas flores também.
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O Presente
Short StoryCélia ganha um presente diferente de seu genro. Aonde ele o levará, Célia não imaginaria nem nos seus sonhos mais loucos... ou será que ela já sabia?