Estava dentro do cassino, um sonho realizado. Perambulava por todas as alas, procurava uma aventura amorosa. Vi uma linda mulher próxima a uma mesa de jogos. Em pé, observei. Perfil harmonioso, cabelos loiros e longos, seios ávidos por línguas e dedos. Sua pele brilhava sob a luz, algo avermelhado. Perigoso. A caminhar em minha direção, estremeci. Seus olhos lançaram sobre mim flechas na velocidade da luz. Aquela bela mulher aproximou-se de mim, compassadamente. Meus pensamentos sucumbiram.
Toquei seu braço, senti sua mão. Meus olhos fechados. Senti sua boca contra a minha. Sabor de sangue causado por seus lábios mordendo os meus. Nossos corpos colados. Não sei dizer quantos intermináveis segundos aquilo durou. Abri os olhos. O barulho distante, aos poucos se aproximava, estava vivo, não sei se estava são.
Ousei olhá-la de perto. Seu batom de fogo fazia seus lábios brilharem. Já a amava e ela sabia que seria minha. Eu que estava em busca de prazer, regozijei perante aquele corpo. Nossas intenções estavam afloradas, queríamos um ao outro. Desejo irrefreável externado por meus lábios umedecidos. Frio intenso e nossos corpos ardentes. Levou-me pelo braço:
- Venha sem palavras – disse ela.
Em silêncio segui, escada interminável. Reparei em seu vestido, era azul como seus olhos. Novos beijos enlouquecedores. Já na suíte imperial do hotel do cassino, retirei sua roupa, vi seus seios. Estávamos nus, tateei e beijei seus seios e sexo. Eu era sugado pelo seu regaço. Li em seus olhos uma mensagem de amor. Atravessamos mares em tempestades, era o fogo daquele momento inesquecível.
Todos os meus projetos realizei em instantes naquela noite, vagarosamente com aquela mulher. Contradição, nossa urgência impressionava. Naquele quarto os detalhes eram apenas nossos corpos sobre a cama com lençol de seda. Aquilo sim era amor, nossos corpos eram um só. Nossa caminhada longa em uma noite curta. Explodi dentro dela, instantes depois ela ousou respirar.
Refizemos todo o percurso novamente. Incontáveis vezes. Haveria outra noite maravilhosa como aquela? Depois do prazer, a surpresa. Ela me chamou para conversar. Eu já me preparava para sair. Retornei.
- Sim, estou disposto a ouvir – falei.
- Não precisamos nos apresentar com nossos nomes humanos. Mas preciso contar-lhe que não tenho somente uma versão humana. Antes tenho que avisar-lhe que você estará ligado a mim para sempre.
- Não acredito em lobisomem – retruquei sorrindo.
- Você passará a crer. Meu outro ser é masculino. Cinco horas após fazer amor, eu sempre me transporto para esse outro ente.
- Agora quero ver para crer. Vou esperar. E como ficarei eu ligado a você? – interroguei.
- Uma vez por mês você terá que encontrar-me para fazermos amor, durante toda sua vida. Se acaso não fizermos amor uma vez por mês, você também adquirirá outra personalidade, semelhante a minha.
- Estarei perdido, sou casado – falei assustadíssimo.
- Um motivo a mais para encontrar-me. Você agora é minha vítima.
Ouvi incrédulo e atento ao seu discurso. Por vezes eu ria. Outras vezes demonstrava susto. Queria correr dali. Voltar no tempo e desprezá-la no primeiro contato.
Passado o tempo necessário, começou a transformação. Arregalei meus olhos. Começou com um gemido, vozes cavernosas. Ela se retorcia.
Som de música. Não sei de onde veio. Tom elevado, tribal, penetrante, estridente, impactante e cortante. Seu rosto transformado era um ser masculino com dentes crescidos e afiados em cada canto da boca, e só nos cantos da boca. Na parte inferior uma mandíbula enorme, seca, ou melhor, ossos umedecidos. Parecia haver molas na tal mandíbula cavalar. Abriam e fechavam ao som da música aterrorizante, além do entrechocar dos dentes. Seu pescoço esguichou-se para cima, elevado como uma girafa. Seu corpo feminino e suas vestes azuladas e lindas deram lugar a um corpo masculino vestido do pescoço até o chão em cores berrantes, em estampas. Arranjos de flores e longas fitas eram sua cabeleira desarmoniosa. Um misto de medo e riso tomou conta de mim, fugi assustado com a feia cabeça que batia os dentes. Sua figura, porém, era irresistível e, apesar do temor, seguia me encantando entre risos, gritos nervosos e alegres, dirigi-me ao banheiro. O estranho animal investiu atrás de mim aos saltos, dançando em passos miúdos, ia de um lado para o outro batendo as queixadas, fingindo morder.
Saí em disparada daquele quarto em direção ao saguão e depois à rua.
Comecei a recompor-me em frente ao cassino. Sentei em um banco da praça. Aqueles sons acompanhavam-me. Levei minhas mãos aos ouvidos como quem quer deixar de escutar, mas o som estava dentro da minha cabeça. Música impactante. Deitei-me no chão. Calmo, comecei a pensar: aquilo é um Vampiro desajeitado, desarmonioso e atraente.
Em passos largos, encaminhei-me para minha casa temporária, naquela grande Buenos Aires, capital argentina. Era fato. A partir dali, uma vez por mês era atraído até o local onde aquela linda mulher se encontrasse. Não importava a cidade, não importava o continente, eu era transportado. Eu estaria lá junto a ela. Fazíamos amor em silêncio, em seguida saía em disparada para não presenciar sua transformação em vampiro. Cruel e terrível destino eu tinha que cumprir para sempre.
FIM
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ATRAÍDO E APAIXONADO
Short StoryConto vampiresco. Em Buenos Aires, num cassino, um encontro entre homem e mulher. Depois de contatos íntimos a revelação: vampiros na área.