A Coroa

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     A mais nova das irmãs escovava o seu longo cabelo ruivo enquanto encarava o reflexo no espelho. Pousou a escova de pedra e balançou-se em direção à sua concha, pronta para dormir e assim finalizar aquele dia.

     -Ariel! - gritou Alana, uma das suas irmãs mais velhas - Ariel, acorda!

     Com um suspiro, olhou para a irmã já sabendo que se trataria de mais um dos seus dramas.

     -O que se passa? Já ia dormir.

     -Eu perdi a minha coroa! Como é que eu vou casar sem a minha coroa? - navegava de um lado para o outro - Estás a ouvir-me?

     -Vais ao mercado amanhã de manhã e compras outra. Problema resolvido! - virou-se para o lado oposto e aconchegou-se.

     -ARIEEEL!

     Já impaciente, a pequena sereia levantou-se, cruzou os braços e olhou seriamente para a irmã. O que queria que ela fizesse? Procurasse a coroa da irmã por todo o oceano?  Era uma ideia ridícula mas, infelizmente, não poderia descartar o facto de que Alana podia muito bem tê-la em mente.

     -A minha coroa era única e preciosa, mais nenhum ser do mar tinha uma igual, era feita só para mim! - relembrou ela - Tu és engenhosa com as coisas, podes fazer-me outra para o meu casamento de amanhã!

     -Mas não tenho tempo de procurar materiais e fazê-la em poucas horas quando acordar. - negou Ariel.

     -Então vai procurar agora!

     A ruiva soltou uma gargalhada escandalosa pelo castelo. Aquela ideia era ainda mais ridícula do que a que ela temia. Era mais fácil contratar um grande grupo para encontrar a coroa perdida. Não só traria a peça única da princesa como ainda recompensaria vários seres que, com aquelas pérolas, comprariam coisas úteis para todo o seu cardume. 

     -Alana, a água já escureceu. É perigoso!

     -Ninguém vai atacar uma princesa, não sejas dramática! - fez uma pausa - É o meu casamento!

     -Eu vou mas, caso alguém dê pela minha falta, inventa qualquer coisa! - apontou-lhe o dedo e ela sorriu, confirmou e abraçou-a enquanto soltava gritinhos de histerismo.

     Depois de se esquivar do castelo, pensou onde haveria vários materiais que poderia usar na construção do acessório tão especial para a irmã, mas os únicos lugares que lhe pareceram perfeitos não eram recomendados. As profundezas e a superfície! As águas profundas porque estariam sem luminosidade alguma, seria perigoso demais, para além de não ver os objectos. A superfície porque ainda lhe era proibida, só a poderia visitar quando completasse os quinze anos e isso era apenas daqui a três meses. Ariel soube naquele momento que teria um longo trabalho pela frente naquela noite.

     Navegou pelos mares, aproveitou umas correntes para se deslocar mais rápido e recolheu várias peças que juntas dariam uma belíssima coroa, mas faltava algo. Precisava de qualquer coisa que se destacasse ali no meio, algo brilhante!

     Pousou tudo junto de um coral vermelho e olhou em volta de olhos semicerrados. Um pequeno brilho chamou a sua atenção e Ariel começou a aproximar-se até a água aquecer uns graus, parando por ali. Não poderia avançar mais ou arranjaria problemas! Mas aquele brilho estava a despertar-lhe uma enorme curiosidade porque agora, daquele lugar, não parecia o que ela pensava ser. Era mais como um reflexo. Perto dele viu movimento e logo as suas escamas ficaram em alerta. O que seria aquilo? Não querendo arriscar, Ariel virou costas, pronta para agarrar nos seus achados e ir procurar o brilho noutro lugar, mas o som que ecoou transmitiu desespero. Olhou em volta e, como não viu nenhum guarda marinho, subiu com movimentos lentos para as águas superficiais.

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