Antes de sair de casa ela ficou alguns minutos em frente ao espelho. Longos cabelos loiros emolduravam a pele clara, olhos verdes. Conhecia bem sua beleza, e usava como podia este dom que Deus lhe deu. Olhou para o relógio. Estava atrasada. Desligou a luz e bateu a porta.
Bastos esperava ansioso na mesa do restaurante – e a música Então é Natal não ajudava. Não gostava muito desse período de festas de fim de ano. Era tudo muito. Muito barulho. Muito presente. Muitos gastos. Muita família – sogra, sogro, primos... E considerando a esposa: muitas e muitas brigas.
Para se desligar de tudo isso, se dava ao luxo de vez ou outra aproveitar alguma noite de diversão com a melhor mulher que seu dinheiro pudesse pagar. A de hoje era cara. Também pudera, era a mais linda da casa. Nova na cidade. Era frequentador assíduo do local e nunca vira tamanha beleza e elegância numa simples prostituta.
A porta do restaurante foi aberta pelo recepcionista. Débora entrou no salão pisando leve, sandálias elegantes, um vestido apropriado para ocasião, preto e sexy. Seu perfume ficava por onde a bela mulher passava. O corpo bem desenhado chamava a atenção de todos, e o seu sorriso iluminou o ambiente quando reconheceu o homem em uma mesa no canto.
Era disso que Bastos gostava. Todos no restaurante olhavam para ela. "Escolhi bem dessa vez", pensou. Gostosa, elegante e bonita. Se não fosse puta era perfeita. Tentava conter o riso quando ela chegou.
– Me atrasei? – provocou, enquanto Bastos se levantava e puxava a cadeira para ela. Sabia o quanto tinha demorado. Ela gostava assim. Deixava os homens nervosos a sua espera. Ao final, eles ficam com mais vontade.
– Nem reparei – retrucou rindo, embora não pudesse esconder o copo com um resto de whisky, diluído no gelo derretido, e o cinzeiro repleto de tocos de cigarros.
– Lindo o restaurante, não conhecia, é novo?
– Não muito, mas ele é reservado. Meio cult. É para um público selecionado.
– Fui selecionada, então – ela sorriu e olhou para o fundo dos olhos do homem. Pelo menos era bem-apessoado o cliente dessa noite, pensou. Analisava o homem, elegante, calça jeans de grife, camisa preta, grande sorriso. Ele teria qualquer mulher, sem precisar pagar. Mas ela sabia que eles gostam é das putas no sexo. Só em casa eles preferem as recatadas, para poderem sair tranquilos em busca de outras. Patéticos! Mas ela não se importava. Era o seu serviço, estava ali para fazer o joguinho dele e depois voltar para casa, tomar um banho e descansar. Já fazia algum tempo que não via a luz do sol.
– O que você está pensando? – ele quis saber.
– Nada. Apenas reparei nessa aliança na sua mão esquerda – disse ela testando o homem.
– Vocês sempre reparam? – Ele não se sentiu acuado.
Riram. Tinham um senso de humor parecido. Ela ficou mais tranquila, a noite seria agradável.
As horas passaram correndo. Comeram uma comida australiana, que dois minutos depois ela não lembrava mais do nome. Era bom. Apenas isso. Mas, para agradar o parceiro, fingiu gostar mais do que gostara. Bastos pediu um vinho caro, de uma excelente safra, conforme explicou. Débora estava encantada com o homem. Bastos sabia agradar uma mulher.
Teria com ele uma bela ceia de Natal, pensou – e riu.
Saíram de lá no carro dele. Bastos dirigiu rapidamente pelas ruas movimentadas da cidade, ignorou os semáforos e entrou na garagem coberta de folhagens do motel mais próximo. Pegou as chaves da suíte com a velha da portaria e não deixou de sentir um leve descontentamento ao reparar que ela conhecia a sua acompanhante.
Bastos fechou a porta do quarto. Olhou para a mulher escolhida para fazer um pouco de sexo. Tomaram champanhe, olhares vidrados, ela tomou a iniciativa, partiu para cima dele. O beijo foi longo, uma verdadeira troca de experiências, onde o gosto dos dois se confundiam com o do álcool.
Débora se levantou e o deixou deitado na cama. Abriu o zíper lateral do vestido, revelando a pele clara e o corpo perfeito. Os olhos estavam escondidos pelos cabelos loiros, e a boca continha um sorriso provocante. Bastos olhava para ela, ansioso. A mulher serviu mais uma taça da bebida, enquanto sentia uma pressão nos ouvidos e no pescoço. Sentia o coração dele batendo em ritmo descompassado, era assim que ela gostava. Podia escutar o sangue passando apressado pelas veias, deixando o rubro na face do outro.
Colocou um joelho e depois o outro na cama, e engatinhou para perto do cliente, já entregue a ela. Seus olhos verdes brilhavam, mas um brilho maior do que o normal, e o cheiro do homem acelerava a respiração da prostituta. Beijaram-se outra vez, entretanto, com mais violência, com uma força brutal, quase raiva, onde os corpos pareciam apenas um, e mãos e bocas descobriam os lugares mais íntimos um do outro.
Chegara o momento pelo qual ela mais esperava. A boca salivando, o som vindo do peito do homem era cada vez mais alto. Tirou o cabelo do rosto, e os olhos verdes brilharam ainda mais, de forma sobrenatural. Bastos, de olhos fechados, estava alheio ao que acontecia.
Débora foi beijando a barriga, o peito e chegou ao pescoço, deu um último beijo e ele começou a gemer. Ela sabia que as pessoas sentiam um enorme prazer nessa hora. E havia duas alternativas: ou ia até o fim, ou parava no meio e Bastos se tornaria um deles.
O beijo foi longo e o prazer imenso. Não deu tempo para ele descobrir o que acontecia. Morreu em silêncio enquanto seu sangue aquecia o corpo e escorria pelos dentes afiados da prostituta.
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Contos Sangrentos (Degustação)
HorrorO livro completo está disponível na Amazon. Alguns comentários de leitores: "Adorei, muito bom. Me prendeu. Seu conto é muito envolvente, :D" - Crislene Mello "Maravilhoso! Uma escrita envolvente, me deixou muito empolgada, e quando chegou ao fim fo...