1/3: palavras não valem

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Quando me sentei no mesmo banco, como se fosse a mesma noite, com as mesmas pessoas, paisagem, sonora e visual, e as mesmas músicas tocando nos fones de ouvido, não desconfiei que os ares sopravam diferente da noite anterior (por uma diferença mínima e percentual). É aí que prevalece minha ignorância.

Concentrando-me somente nos próprios fracassos, guiados pelo silêncio — dizia-se que os calados tinham sobreposto direito à última palavra, mas não estava interessado em palavras, porque elas não tinham o potencial do sentimento que fervilhava em meu peito:

Solidão.

Errado.

Lembro-me bem dos corredores lotados de moças bonitas e rapazes com jaquetas maneiras, mas nenhuma das palavras que saíam de suas bocas provavam esse valer aproximativo, perguntar sobre suas jaquetas ou se as meninas queriam sair para dar uma volta. Só me interessava  nas tardes atrás do muro da quadra, matando aula, escutando música...parecia a única de validez.

Diziam que eu era um garoto quieto, porém gentil. Que podia ser feito de capacho, porque nunca negava altruísmo. Mas isso também não fazia de mim o salvador, porque havia das impurezas, tão sujas quanto as que julgava muito piores; egoísta. Tão egoísta considerar boas palavras? ah, eram descartáveis. Porque talvez elas quisessem me ensinar uma lição, me humilhar perante bonanças e mudanças. Um pedido, uma tortura. Um olhar,  corrosão autoinflingida.

Se havia uma coisa que apreciava era o silêncio. Por isso, todas às noites, sentado no banco da praça principal, pessoas passavam silenciosas, sem nem olhar para trás ou murmurar sobre minha solidão de merda; era ali onde me sentia um outro alguém, apesar da ambiguidade noturna; eram esses momentos de mortalha que a felicidade visitada, são e livre de qualquer pecado, flagelado da personalidade; um desconhecido sozinho em um banco de praça, somente. A questão em si: não saber é submissão à razão de aguentar mais um dia sob a própria pele.

Por saber da monotonia, por saber do praxe, deitei a cabeça e analisei as estrelas brilhantes no céu. Nunca fora esse tipo que se interessa pelas particularidades da imensidão, embora, naquele instante, parecesse um aviso.

Dizem que mudamos com o esforço. Que tudo pode aquele que crê. Eu não me importava, anestesiado de emoções. Talvez porque o exercício da fé fosse uma reprimenda.

E foi nessa noite, uma como outra qualquer, que a vi pela primeira vez.

Sim, talvez o vento realmente soprava numa diferença mínima e percentual.

ㅡ sapatos que escondiam 148 estrelas. rv + nct | seulyongOnde histórias criam vida. Descubra agora