Nunca é Tarde Demais

Zana

Eu me lembro como se fosse ontem. Estava sentada na quarta fileira, mascando um chiclete de menta, quando ele entrou na sala de aula. Tudo estava tranquilo na minha vida até então.

Eu usava um cacho grosso e castanho para cobrir os fones de ouvido durante a aula e não percebi quando a entrada dele foi anunciada nos primeiros dez segundos. 

No décimo primeiro fui ferrada pelo alvoroço e arrastar de cadeiras ensurdecedor que não tinha fone de ouvido que abafasse. Aí que ergui os olhos. 

A primeira coisa que eu vi foi a cara da Melissa. O rosto dela estava totalmente ensopado de lágrimas. Cheguei a sentir um mal estar. Tipo um embrulho no estômago, achando que alguma coisa realmente muito ruim tivesse acontecido enquanto eu tava distraída. Mas não, graças a Deus por isso.

Olhei para a porta e e vi, alguma pessoas com a mão no rosto de perplexidade. Até o senhor Johnson, meu professor de álgebra parecia animado. 

O cara que entrava tinha um livro no sovaco, uma mochila transpassada e mais nada. Além de um rosto conhecido, uma pele bronzeada, cabelos exageradamente loiros, daqueles que parecem ter sido pintados com parafina. Era o tal do Richard Bloom, o surfista australiano.

Eu sabia que ele tinha vindo morar em saquarema. Sabia que estudaria na minha escola.

Quero dizer, eu não sou nerd e vivo enfiada em livros, mas também não sou uma completa idiota que não sabe nada de nenhuma notícia. Leio jornais, mesmo sabendo que é raro. O jornal da minha cidade só custa umas moedinhas então eu simplesmente compro para o meu tio. Ele gosta dessa rotina e eu acabei de me acostumando.

A questão é: todos os jornais falavam de Richard bloom e sua chegada ao Brasil.

Agora ele estava aqui na minha frente e eu? Eu simplesmente não posso entender porque tenho borboletas no estômago, mesmo que não esteja gritando ou freneticamente. 

Não sei se a culpa é daqueles olhos azuis que estão mirando em mim o se é da língua molhada que passa ao redor dos lábios enquanto ele me encara.

Eu nunca na minha vida inteira vi alguém tão descarado assim.

Se Richard Bloom tem algum defeito, definitivamente não é falta de ousadia.