Era um dia de verão como qualquer outro em Portland: carros para todo o lado, moscas, pessoas para todo o lado, moscas, eu atrasada e moscas. O relógio no meu pulso marcava 12:50 e o colégio ficava a dois quilômetros de casa. Dei uma última escovada no cabelo com uma tentativa falha de desembaraça-lo e corri para meu quarto. Coloquei alguns cadernos e livros na mochila sem tempo para pensar quais aulas eu teria naquele dia, em seguida voei para o hall da entrada onde peguei meu celular jogado no sofá e sai de casa. Montei na bicicleta o mais rápido que pude e comecei a pedalar furtivamente.
12:52, não daria tempo. Pedalei mais rápido. Meu cabelo ruivo embaraçado estava aos ares fazendo-me perceber que esqueci de prendê-lo. Quando cheguei na calçada do colégio, freei a bicicleta, derrapei e a deixei no chão perto de um corsa vermelho. Subi de dois em dois degraus a escada que dava para a entrada e.... estava fechada. 13:16, ótimo, minha madrasta ia me fuzilar. Soquei a porta de vidro algumas vezes para tentar pedir que a porteira me deixasse entrar como uma última alternativa, mas ela estava encostada na escada de mármore do lado de dentro, que dava para o segundo andar, balançando a cabeça freneticamente e cantando algo como: "...Hello from the other side...". Soquei mais algumas vezes e gritei seu nome, mas ela continuava balançando a cabeça e cantando: "...I must have called a thousand times...".
Então eu desisti e sentei em um dos degraus na escada, pensando no que minha madrasta ia me dizer quando eu chegasse em casa e contasse o que aconteceu. Isso se eu não precisasse ir para a casa. Olhei para trás e vi que a porteira ainda estava em uma cantiga, então sem mais esperanças de ter aula, corri até minha bicicleta e pedalei avenida acima, a caminho do bosque. Lá pelo menos era um lugar em que eu ficava longe de problemas, longe da minha madrasta, e o mais inusitado: longe das moscas. O bosque não ficava muito longe do colégio, então todas as quartas-feiras -único dia da semana em que a madrasta me deixava livre de qualquer tipo de trabalho para a casa-, eu ia para lá com o fim de refletir e descansar, apenas com a presença dos animais. O canto dos pardais juntamente com o som do riacho faziam-me acalmar e esquecer de quaisquer problemas que eu teria de voltar a enfrentar na próxima longa e irritante semana.
Torcia para atingir a maioridade o quanto antes e me tornar uma zoóloga, assim eu ficaria perto de apenas o que eu gostava. Muitas das meninas da minha idade não apoiavam essa ideia, dizendo que é algo para meninos ou gente louca, essa coisa de sujar as mãos com animais. Dezesseis anos é uma idade difícil, a maioria dos meninos saem com a maioria das meninas para uma balada ou uma festa adolescente com a esperança de sair aquela noite com uma namorada, o que muitas vezes acontecia. Eu já era daquele tipo de meninas excêntricas que preferiam um livro do que se preocupar em arrumar um namorado, e o bosque do que a balada.
Quando cheguei no bosque, suspirei fundo. O cheiro fresco me fazia relaxar. Tudo estava perfeitamente normal, sem problemas, sem afazeres, completamente nos eixos, a não ser por...
"Um banheiro? ". Perguntei-me. No meio dos vários pinheiros estava um daqueles banheiros químicos que você encontra geralmente em praças públicas ou em eventos de rodeios. Eu não me lembrava de haver algum banheiro público em pleno bosque. Vencida pela curiosidade, desci da bicicleta e a deixei por ali, seguindo até o local.
Pensei em chamar alguém para ver se havia mais alguma pessoa naquele bosque, mas tudo estava em tão absoluto silêncio -até mesmo as águas correntes do riacho e o canto dos pardais pareceram sumir- que era impossível haver alguma vida humana por ali. O banheiro químico não era nada novo e exalava um cheiro desagradável de excrementos e amônia, o que dava a crer que havia sido colocado há anos. Abri a porta vagarosamente e coloquei a cabeça para dentro, me deparando comigo mesma do outro lado.
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Meu Lobo Voraz
RomanceCoisas estranhas estão acontecendo na cidade de Portland e tenho medo de que eu seja a responsável por isso. Eu juro, tentei ficar longe dele, mas não consegui. Ao seu lado eu me sentia segura, abraçada e aquecida. Ele me guiava através das sombras...