Diferente *

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   Eram seis e quarenta quando meu celular despertou. Eu não queria acordar, para mim ainda estava cedo e aquele frio que havia começado a  alguns dias me fazia querer dormir até a hora do almoço, mas meu trabalho me esperava.
  Eu trabalho em uma lanchonete, praticamente a única da minha cidade (isso mostra o quão pequena é a cidade em que moro), trabalho lá vão fazer 4 anos e eu gosto. Algumas pessoas geralmente me perguntam porque não procuro emprego melhor, mas sabe como é né? Adolescente sempre aceita qualquer trabalho e quando eu tinha 18 anos, trabalhar na lanchonete me pareceu uma boa maneira de ganhar meu próprio dinheiro. Agora com quase 22 anos eu me acomodei na lanchonete, pois foi ali meu primeiro e único emprego, foi ali que devolvi troco errado, que não cobrei certo as contas dos clientes, foi ali que eu peguei nota falsa e tive que repor com o meu dinheiro, que derrubei suco de laranja em uma senhora e café quente em mim mesma. Ah... Muitas histórias para contar, com esse meu jeito estabanado, foi ali que paguei muito mico, mas não me arrependo de nada.
   Levantei e ao calçar minhas pantufas de joaninha, fui ao banheiro. Abri a torneira na água fria e quase congelei meu corpo, mudei para a água quente e enquanto estava escovando os dentes, sentei no vaso para fazer xixi, mais uma vez quase congelei meu corpo com o gelo que estava na borda do vaso; terminei de escovar os dentes e lavar o rosto e voltei para o quarto.
   Abri o guarda roupa e fiquei ali, parada, olhando e pensando em que roupa usar, como faço todos os dias. Escolhi colocar uma calça jeans, uma camiseta, e duas blusas, no pé coloquei uma bota e já escolhi o cachecol e a touca que iria usar. Escovei os cabelos e apenas o joguei para trás, já que iria bagunçá-lo quando colocasse a touca. Peguei minha bolsa, meu celular e desci para a cozinha.
   Minha mãe ja estava lá, com água no fogo para fazer meu café, coloquei pão na torradeira e então, encostada na pia olhei para ela, que estava ainda de pijama e pantufa, tentando esquentar suas mãos no fogo alto.
- Bom dia. - Falei baixo, mas em um tom que ela conseguisse ouvir.
- Bom dia querida. Dormiu bem? - Minha mãe virou para mim e sorriu. Sei que perguntou de coração.
- Dormi sim. Que frio não é?
Nesse momento a água ferveu e minha mãe cautelosamente desligou o fogo e começou a derramar a água no filtro de café, o que fez subir um ótimo cheiro de café. Sorri. - Está frio mesmo. Parece que o inverno esse ano vai ser forte.
Concordei com ela pegando minhas torradas e sentando na mesa; enquanto estava passando manteiga, ela me deu uma xícara de café quentinho e eu sorri pra ela, agradecendo em pensamento. Minha mãe subiu, provavelmente para se arrumar e eu tomei meu café rapidinho, terminei de me aprontar e sai de casa para não entrar atrasada.

***

   Cheguei quase em cima da hora, deixei meu guarda chuva e meu casaco em seus devidos lugares, logo na entrada onde tinha o porta guarda chuva e o cabideiro; óbvio que esses eram para uso dos clientes mas o Sr. Tompson nunca se importou que eu usasse, aliás, os outros funcionários também usam e já vi ele usando o cabideiro também.
   Dei bom dia ao Sr. Gregory que fazia os lanches, a D. Ana que trabalhava no caixa e a Julia, Marcela, Lucas e Carlos que serviam as pessoas. Coloquei meu avental e fui para trás do balcão para mais um dia de trabalho.
   Logo chegou os mesmos clientes de sempre, com as mesmas histórias e reclamações de sempre. O Sr. Antônio e o Sr. Fred chegaram e pediram o café de sempre, eles sentam na mesma mesa e ficam discutindo sobre os assuntos do jornal diário, só saem da lanchonete depois de umas 3 xícaras de café e após terem conversado sobre todos os assuntos possíveis. Adam e Sophia passavam sempre juntos à caminho da escola, Adam sempre pede um cappuccino e a Sophia pede um cookie e chá de amora; eles dizem ser só amigos, mas tenho certeza que um dia ainda vão ver que são apaixonados um pelo outro e vão namorar. John passa sempre na correria antes do trabalho, na maioria das vezes está conversando com alguém no telefone e só pisca para mim, quando ele faz isso eu já sei que ele quer um café com leite médio e para viagem. A D. Anastácia chega com a Maria e elas sempre tomam chá de camomila, comem bolo de fubá e ficam conversando sobre tudo o que acontece na vizinhança. Emilly passa com os dois filhos, Gustavo e Guilherme, antes de levá-los na escola, pede sempre pão na chapa e café pra ela, chocolate quente e pão de queijo para os meninos... É sempre isso, nunca muda. Cidade pequena é assim, todo mundo conhece todo mundo e um sabe do que o outro está falando.
   Eu estava no balcão livre, esperando algum cliente chegar e ir até lá ou ser atendido por algum garçom, quando de repente o sino da porta bate e de um jeito diferente. Todos olharam e notaram que era uma pessoa diferente, que ninguém ali conhecia. Era um rapaz, muito bonito por sinal, tinha cabelos pretos e pele bronzeada, não parecia estar acostumado com tanto frio (e olha que o inverno estava só no comecinho). Quem será esse rapaz tão diferente?

Só mais um invernoOnde histórias criam vida. Descubra agora