Capítulo 7

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1 hora e 11minutos antes.


A garagem da casa de Leila fica no subsolo, uma rampa ao lado do caminho para a porta permite que o carro saia. Para entrar diretamente de dentro da casa, é preciso descer uma escada que fica em um corredor iluminado por fachos de luz amarelada entre a cozinha e a sala de TV. Imagine você o esforço que não foi para conseguir descer os degraus bêbado e com a multidão de adolescentes curiosos para ouvir as confissões que seriam as fofocas do mês inteiro.

Depois de me espremer por entre corpos suados, baforadas de álcool e copos respingando, eu consegui chegar até a garagem. O cômodo cabia dois carros, contudo naquela noite só estava ocupado por um. A metade da festa que decidiu acompanhar o jogo se esforçava para caber na outra metade ao redor do circulo formado com os dez jogadores.

Sentados na roda vi garotos das várias turmas de terceiro ano do ensino médio do Colégio Marista, dentre eles com a cara mais lavada e cheia de bebida, estava Dante. O cabelo amarrado em seu tradicional coque bagunçado, o copo na mão e a camisa xadrez amarrada na cintura, dava maior veracidade ao seu ar confiante e tranquilo.

Meus olhos logo foram parar no garoto atrás dele. Vestindo uma camiseta verde limão com a manga enrolada, estava Roger com seu cabelo cuidadosamente bagunçado. Na sua mão, um copo exatamente igual o de Dante, me fez sentir vontade de empurrá-lo para longe e deixar claro que o namorado era meu e que quem deveria beber com ele era eu.

"Todo mundo conhece as regras, né?" Leila entrou no meio da roda, segurando o vestido curto com uma das mãos. "Cada um faz uma confissão na sua vez, quem já tiver feito, toma uma dose. Ganha quem desistir por último, ou não cair..."

Ela se sentou entre suas duas amigas dos dados. "Eu começo! Eu nunca transei..."

Todo mundo vaiou, como se fosse a pergunta mais idiota do mundo. E com unanimidade, todas as doses de tequila foram viradas na roda.

"Eu nunca transei no carro do meu pai," a amiga da esquerda confessou.

Dante tomou uma dose, assim como Leila. Senti meus olhos arderem e meu rosto se aquecer.

Não fiquei surpreso com o teor das confissões. Jogar Eu Nunca era uma oportunidade de descobrir as coisas mais secretas das pessoas da roda. Descobrir quem pegou quem, quem já fez o quê, assim como era a chance de se gabar.

Conforme as rodadas foram passando mais difícil foi ficando para os jogadores confessarem coisas diferentes, começando a aceitar sugestão das pessoas que acompanhavam ao redor com entusiasmo. Dante havia bebido na maioria das confissões, me deixando extremamente constrangido, como se todo mundo pudesse saber que a maioria daquelas coisas ele tinha feito comigo.

Rubens, um dos garotos mais inteligentes de todos os terceiros anos surpreendeu ao confessar já ter ficado com uma prima. Luiza confirmou o que todo mundo já suspeitava ao tomar sua dose quando falaram "eu já peguei um professor".

Àquela altura do campeonato, somente quatro jogadores estavam resistindo. Leila era uma delas, que mais parecia uma égua bebendo água do que uma adolescendo tomando tequila. Dante, claro, que mesmo com os olhos vermelhos ainda parecia estar aguentando bem. Luiza havia acabado de desistir, deixando para trás seu namorado, Carlos Valença, e um antigo romance, o outro Carlos, o Fogaça.

Na vez de Dante falar, Roger, com as mãos em seu ouvido, sussurrou uma sugestão para ele. Os dois riram em seguida, enquanto tentava me aproximar cada vez mais dos dois. O formigamento subindo pelas minhas pernas e o ciúme tentando me tirar daquele momento. Foquei nos meus passos – esquerdo, direito – tentando não me perguntar por que diabos o Roger achava que tinha intimidade o suficiente para ficar cochichando no ouvido de Dante, ou para ficar alisando seu ombro.

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