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Théo,

Sabe quando você quer fazer algo, mas nunca o faz? E quando decide fazer, alguém fez primeiro? Foi isso que senti quando abri a porta do meu apartamento e me deparei com a sua carta. Confesso que fiquei adiando, sempre que sentava para escrever algo não deixava as palavras fluírem. Elas me escaparam no dia em que entrei naquele avião e você não correu atrás para me parar. Eu nunca quis realmente te deixar. E você não ter me parado me destruiu de tantas maneiras que você não consegue imaginar. Então, não sei se algum dia eu irei perdoá-lo por isso. Você sempre foi tão bom com as palavras, tudo seu parecia uma poesia. Com a sua carta não foi diferente. Não consigo juntar as sílabas para formar parágrafos tão belos quanto os seus, eu sou muito mais simplória que você. Mas éramos bons juntos. Mais que bons...

Você se lembra porque eu tomei a decisão de ir embora? Eu estava tão ansiosa para te encontrar e contar que havia conseguido o emprego em Lisboa. E aí eu perdi o metrô. Pedi um táxi, mas você sabe como é o trânsito de São Paulo. E ainda assim, cheguei em casa toda alegre, só para encontrá-lo com aquela cara. Como eu odiava quando ficava daquele jeito, todo argumentativo. Enfim, foi uma das nossas piores brigas. E, consequentemente, a gota d'água.

E após tantos anos, eu percebi que meu coração ainda é seu. Mas agora, não sei se isso adianta. Tem alguém aqui comigo, e ele é a minha prioridade. Meu coração é mais dele do que seu. Sabe, Theo, descobri que isso não é algo ruim. Na verdade, provavelmente foi a melhor coisa que me aconteceu. Ele me lembra você, acredita? O jeito de sorrir só um pouquinho, o olhar brincalhão e principalmente o temperamento.

Mas chega disso, respondendo a sua pergunta eu estou bem. Percebi que você não está nada bem, pelo que entendi. Me desculpe por não estar com você nesse momento tão difícil. Nossas promessas se perderam. Tantas juras de amor... Tantas noites de amor... Se lembra dos carinhos na cozinha? Era tão bom sorrir e brincar assistindo minha série preferida com você. Eu não me esqueci, Théo. Nunca esquecerei. Você está gravado em mim eternamente como uma tatuagem, mas não aquelas em que você se arrepende depois. Você é a minha tatuagem especial. Espero que eu também seja a sua.

Sabe, eu alcancei o meu maior sonho. E o mais engraçado é que eu nem sabia qual era até ter conseguido. E você? O que fez durante esses cinco anos? Já tem cabelos brancos? Eu achei um em mim e quase morri! Não que estejamos velhos nem nada, imagina! Aquela viagem que fizemos para a Argentina fica se passando pelas minhas memórias quase todos os dias depois que achei esse cabelo. Nós juntamos que iríamos envelhecer juntos... Que teríamos dois filhos, Thomas e Catarina. E agora olha onde o mundo nos levou.

Receber essa carta me mostrou que nem tudo está perdido, Théo. E o vazio no meu peito me mostra que eu devo voltar para ficar com você. Talvez você não me queira, não me aceite, mas eu preciso vê-lo uma última vez. Pelo menos para nos despedirmos direito. Aguente firme. Eu espero que essa carta chegue antes de mim aí para você. Está no mesmo endereço, posso ver. Isso é ótimo. Em pouco tempo eu chego aí. Bem, nós. Sim, vou levá-lo. Eu e Thomas estamos indo te encontrar.

Sempre sua, Cecília.

Para ThéoOnde histórias criam vida. Descubra agora