Reboot

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Sábado de sol,saí do aniversário de uma amiga, havia marcado de encontrar uma garota que parecia legal... Joguei nela a cantada mais improvável de dar certo nesse mundo: "tem um cara que tá querendo te conhecer"
"Quem?"
"Eu... E aí, bora sair?"
Ainda não podia crer que tinha realmente a convencido a sair comigo, nunca havia chamado ninguém pra sair de verdade,era algo novo pra mim.
Fui até a frente do posto, esperando ela chegar, nunca havíamos trocado muitas palavras alem de "Iaê" ... Na real, não sabia porque ela aceitou me conhecer tão fácil, estudávamos na mesma escola há uns 7 anos, e eu nunca havia notado a sua presença, mesmo ela sendo somente um ano mais nova... Me vi de longe,sentando-me num bloco de construção largado embaixo de uma árvore... Como eu estava ansioso... O coração estava a ponto de sair pela boca,porém externamente nada disso se demonstrava, pois eu rasgava descompromissadamente algumas folhas secas achadas pelo chão, tentando milimétricamente separar a folha do talo central... Ouvi passos se aproximando, passos bem baixos, o barulho era mínimo,voltei-me para onde ela vinha até mim. Agora podia ver que ela vinha da casa de seu tio e não da própria casa, embora ambas fossem próximas ao posto... Fácil notar isso com dois pares de olhos,não é mesmo?
Não pude escutar minha conversa com a moça, eu estava muito longe para isso, mas continuei nos seguindo de longe. Sei cada palavra que disse naquele dia, sei cada assunto abordado, até porque foram poucos, ela era de poucas palavras e eu um tagarela nato, chego até mesmo a me achar irritante hoje, vendo de novo tudo,não apenas na memória,mas sim se passando novamente.
Conversamos sobre nossas famílilas,falei sobre minha noite , meu rolê semi-vândalo, eu estava muito empolgado, nunca tinha feito isso até a noite passada... Apesar de não me preocupar com isso no momento, percebo que esse papo poderia tê-la assustado... Cansado de tentar puxar assuntos , por não ter mais ideias decentes, resolvi dar uma investida... "Já que essa boca não fala muito, poderia estar beijando"
Pior cantada que poderia ter pensado... Mas também não havia uma boa...
Incrivelmente, esse ser que me escutava quase que como assistindo um monólogo deu um meio sorriso, era tudo o que eu desejava naquele momento... Foi assim nosso primeiro beijo. Inclusive,ocorrido no dia de seu aniversário... Eu não podia acreditar que uma menina como ela não comemorasse seu aniversário de 16 anos com sua família... Até já sabia de suas relações conturbadas com o pai,porém não via causa pra dispensar uma festa com a família.
Observando-me naquele momento tão amado por mim desde sempre, senti um aperto no peito,alegria preenchia meu coração, mas saudade também sufocava minha garganta.
A mãe dela ligou pra saber onde se encontrava, mas minha sede por seus lábios já era desde o primeiro dia infinita, entre uma palavra e outra, avançava na sua boca, amando cada segundo, cada respiração precipitada que sentia em meu rosto, e seu riso frouxo, de nervosismo por tentar ao mesmo tempo beijar e conversar ao telefone sem deixar transparecer o que ocorria ao outro lado da linha...
Uma névoa se formou em volta de mim, não no meu eu feliz, mas no meu eu atual, o observador saudosista, que estava a ser trazido de volta ao presente... Lágrimas escorriam de meus olhos,meu lábio trêmulo balbuciava palavras inaudíveis, cujas quais eu tentava moldar como "Por favor, não agora, me deixe ter mais um pouco"
A névoa se dissipou, percebi que não estava de volta ao presente... Esse me aguardava em pouco tempo,olhei para cima, os marcadores acima de mim marcavam aproximadamente 4 horas.
Era noite, e eu me encontrava numa fazenda, carros chegavam a ela, com vários rostos familiares, rostos de formandos de ensino médio... Era minha festa de formatura... Deus, como meus olhos vazavam, sentia um Nilo passar por eles... Senti que estava tendo tudo o que queria, porém era muito mais do que eu achava merecer, enxugando meus olhos me vi atravessar o portão de entrada, segurando pelo braço a mesma moça,me parecia uma visão divina, ver-me de smoking preto, camisa de Cetim preta e gravata Grafite... Ela usando uma roupa belíssima, me acompanhando e próximos a nós, minha mãe e o meu amigo que havia servido de ponte para nos,conhecermos... Como sou grato até hoje a esse cara... Revivi a melhor noite de toda a minha vida... Tudo era alegria e diversão,eu sentia que a  beijava com a mesma paixão de sempre, com quase 4 meses de namoro... E essa paixão até hoje nunca se extinguiu, mesmo depois de tudo o que ocorreu.
Deitados na rede, estávamos abraçados um ao outro, seu rosto aparentemente ligado ao meu coração,minha mão afagava sua cabeça, me sentia seu protetor, seu eterno guardião.
E ela, ela sentia provavelmente que eu estaria sempre lá por ela,pois lembro-me de ter escutado dela própria que eu era seu porto seguro. Olhei para todos os lados, muita gente estava acordada ainda, festejando e nós dormíamos profundamente. Olhando pra cima,tentei me conformar que meu tempo havia acabado. Me entreguei à névoa que me levou de volta pra cá, mostrando-me relances de brigas, discussões que tivemos, todo o desgaste pelo qual passamos... Cada segundo era um milênio que pesava sobre meus ombros, todo o meu peito queimava, ardia em brasa viva por ver tudo aquilo. Vi cenas de relacionamentos posteriores, os quais sinto culpa por ter tido, já que não conseguia mais ser o mesmo e acabava decepcionando-as, mas acima disso: eu me decepcionava comigo mesmo.
Enquanto a névoa se dissipava, era possível discernir entre os vultos que me analizavam olhos arregalados, alguns de admiração, outros de temor, mas ambas as sensações causadas pelo mesmo motivo: a experiência havia sido realizada com sucesso.
Tubos saíam de meus órgãos vitais, sondas extraíam fluídos de cores vívidas e berrantes que eu sabia não pertencerem ao meu organismo.
Emoções existiam, porém eram suprimidas pelo torpor de minha lucidez temporária... A viagem foi um sucesso, mas apenas minha consciência era enviada, num corpo extramaterial, que não pertencia a essa dimensão. Tudo foi assistido por uma equipe de seres que eu desconhecia a origem, que provavelmente assumiam uma forma tridimensional cuja qual eu pudesse compreender ou quase isso. Não sei como você os classificaria, muitos os chamariam "Demônios" , eu os chamava de anjos. Pois no momento em que eu mais necessitava, eles se mostraram a mim e realizaram meu desejo.
Eu pedi que me tirassem quaisquer resquícios de sentimentos,e em troca, me pediram para me tornar um arauto, um mensageiro, que traria à dimensão natal seu recado.
Retornei ao local de onde vim, agora mudado, um outro ser, direcionei-me até à cidade onde meu antigo eu havia nascido. A mensagem era clara, uma dádiva aos seres mortais: "Sua existência é vazia, junte-se ao sublime pó das estrelas"

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⏰ Última atualização: Feb 21, 2017 ⏰

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As aventuras do fracassado interdimensionalOnde histórias criam vida. Descubra agora