Quanta dor uma pessoa pode suportar?
Qual o máximo que se suporta até perder o controle?
Perde-se o controle por ser fraco e os fortes sempre suportam tudo?
Quantas perguntas sem resposta. Mas hoje realmente estão mais frequentes. Talvez seja por que meus pais mentiram para mim mais uma vez para conseguirem que eu vá ao médico. Eu tenho 12 anos e eles ainda não sabem lhe dar comigo. Ainda inventam monstros e outras mentiras para que eu faça o que eles querem. Para eles é um atalho, mas atalhos sempre geram mais consequências do que pelos caminhos longos.
- Espero que nos desculpe, querido. – Ela falou novamente com aquela cara de cachorra molhada. Como ela é patética fingindo me amar.
- É pro seu próprio bem. – Se ela é uma cachorra molhada ele é um galo desnorteado. Com seus olhos arregalados e fundos olhando para um lado e para o outro aleatoriamente. Como são ridículos juntos. Eles se merecem.
- Eles não passam de uma cachorra molhada e um galo desnorteado –
Os olhos do pai alternam entre a mulher, a estrada e o painel do carro que exibe um sinal vermelho que ele nunca soube o que significa, mas sempre lhe incomodou. Seu pescoço largo parecia o de um bombo, mas de acordo com garoto, o velho era um galo e não um bombo. Outro sinal acende no painel: Porta aberta. E algo cai do carro rolando na estrada e depois para o mato.
- Jorge!
Aqui está melhor. A grama está molhada e fresca. Cheira bem. O sol não está quente e parece que vai chover. Lá vêm eles. O galo deve ter demorado uns 3 minutos para conseguir colocar a marcha ré enquanto a cachorra molhada ficava desesperada e ofegante pensando se saía do carro ou esperava o marido dar a ré.
- Jorge! Você está bem?
- Claro que não. Fraturei o braço. Vamos a um ortopedista e não a um psiquiatra.
- Está doendo?
- Não. Nunca dói.
- Nunca o suficiente –
- Meu Deus!
Ela vai começar de novo a chorar. Como é patética.
- Devia saber. Ela sempre chora. –
Por que não pode ser mais prática? Apenas volta para o carro e vamos embora. Mais ela prefere ficar alí inutilmente derramando esta solução salina na esperança de que isso traga alguma solução ou mesmo alento. Mas é inútil. Ela sabe que é.
- Chorar sempre é inútil –
E mesmo assim o faz.
Ele estava certo. Havia uma fratura na ulna e o braço teve que ser engessada. Ele é tão frio que até as vezes me assusta. O pai com seu aspecto esquelético e alongado o colocou na cadeira de rodas a parecia segurar fortemente um choro.
- Ele fica mais patético tentando fingir ser forte. –
Só isso que ele pode suportar? Creio que já passou do ele possa suportar. Já que dois anos atrás ele tentou me matar. Era uma manhã de domingo. Havia enfiado um lápis na perna de um colega porque ele pisou nas formigas que eu observada e a diretora me expulsou da escola. "Ele não é normal! Procure um médico."
- Todos médicos são "normais"? –
Meu pai foi me buscar e não parava de falar sobre amor, compaixão e essas porcarias. Até que ele começou a falar sobre inferno. Ele parecia gostar de falar sobre sofrimento mais do que quando falava sobre amor. Seus olhos brilhavam e ele enfatizava tons mais graves e agudos como se encenasse um monólogo explicativo.
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Agliofobia
Short StoryQuanta dor uma pessoa pode suportar? Qual o máximo que se suporta até perder o controle? Perde-se o controle por ser fraco e os fortes sempre suportam tudo? Reflexões sobre a dor e o medo em um conto surpreendente.