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Voar em um skate não era nada como imaginara ao assistir De Volta Para o Futuro 3, principalmente porque o skate em questão estava a mais de cinquenta metros do chão e o único lugar que tinha para se segurar na tentativa de manter o equilíbrio e não cair era a mochila nas costas de Byron.
O fato de estarem fugindo de robôs negros com olhos vermelhos e armamento pesado, programados para rastrear e matar também não ajudava muito. Havia adrenalina e pavor correndo por cada célula de seu corpo.
Finalmente Daniel começava acreditar que aquele garoto não era seu melhor amigo tirando uma com a sua cara. Ou estava tendo um sonho muito maluco, ou estava vivendo um filme de scify. Não sabia qual das alternativas era pior, porque nas duas acabaria precisando de um psiquiatra. Era mais que estranho e assustador pensar que seu mundo havia sido criado por outras pessoas como um experimento e que agora algumas dessas pessoas achavam que tudo não passava de uma falha, um fracasso, e que o melhor era destruir. 2012 já havia passado, mas ao que parecia O Fim do Mundo ainda estava para chegar. Até o Apocalipse se atrasava, precisava lembrar disso para dizer a sua mãe.

Byron já lhe explicara o que precisavam fazer. Daniel não entendia como o outro conseguia parecer tão calmo e ainda falar enquanto guiava o transporte voador em que estavam tentando despistar dois corpos de metal gigantes que, não voavam, mas eram rápidos, atiravam incansavelmente e queriam muito matá-los. De qualquer forma, o primeiro passo era se livrar dos rastreadores e chegar a um lugar que, segundo Byron, era uma espécie de portal que permitia a passagem entre os dois mundos. Será como atravessar um espelho, lhe explicou. Haviam sete desses portais em diversas partes do mundo, eram como falhas no Lucem. Mas poucos sabiam disso.

— E quando chegarmos lá o que faremos?
— Atravessaremos o espelho e o quebraremos de dentro para fora.— Byron respondeu, mas tais palavras soaram aos ouvidos de Daniel como uma charada que  não conseguia decifrar. Talvez o pavor fosse o culpado por sua perda de capacidade raciocinativa recente.

O portal que usariam não ficava entre o letreiro de Hollywood ou uma cabine telefônica londrina como em livros de fantasia infanto juvenil. Era nada mais que uma poça de água, perto demais de um bueiro para não estar contaminada, bem no meio da rua Dr. Joaquim Pinheiro no Centro.
— E agora? A gente pula na poça e vai estar do outro lado? — havia algumas gotas de sarcasmo em seu tom, mas Byr ignorou. — Porque se for assim, muitos cães e crianças já podem ter sido sugados para Terra 1.0.
— Não é assim que funciona. A falha só fica, digamos que, aberta durante o equinócio e também é preciso um dispositivo — o garoto sacou do bolso um objeto circular, de aparência metálica, com círculos menores — que pareciam cristais, em volta. — para ativar a passagem. — Byron jogou o objeto na poça e em menos de dois segundos depois os cristais brilhavam em vermelho.
— Pronto? — Byron perguntou, mas não esperou pela resposta de Daniel que pareceu demorar demais. Apenas o puxou consigo para poça.
Daniel esperou, primeiro, que nada acontecesse e depois, esperou se molhar. Ou sentir algum tipo de dor, tontura, enjôo, qualquer coisa enquanto caía em um buraco escuro e sem fim a vista. Mas não. A sensação foi mais semelhante a descer de elevador dois andares. Rápido e tranquilo. Porém, se sentir como se estivesse de cabeça para baixo ou tudo a sua volta estivesse invertido, até perceber que na verdade, antes é que devia estar.
Foi como imaginava que seria atravessar um espelho ou a tela da TV quando era criança.
Bizarro mesmo foi ver que estavam em uma rua terrivelmente semelhante a Rua Dr. Joaquim.

— E agora?
— Quebrar o espelho de dentro para fora, lembra?
— Porque não fez essa parte antes de sair? — parecia bem mais lógico para Daniel.
— Porque não daria tempo de achar você, quebrar a conexão do lado de lá e voltar para casa antes do fio que liga nossos mundos arrebentar definitivamente. Eu ficaria preso.
— Ah.
— Pois é. E precisamos correr se você não quiser ficar preso aqui.
— O que?!
— Corre! — Byron chamou, correndo. Corria com esperança e coragem, por sua vida, pela de todos em Lucem que eram mais que cópias orgânicas de seu povo, e também pela memória de seu pai. A pessoa que o fez acreditar que sempre haveria uma luz para o guiar na luta enquanto lutar valesse a pena.

INVERSO [ #MundosParalelos ]Onde histórias criam vida. Descubra agora