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O resto da madrugada passou lentamente. Pierre pensou em conversar com a suposta amiga de Eliza, mas com certeza ela estaria embolada nos lençóis com alguém. Andou pelas ruas e parou no bar que fazia frente ao prostíbulo, onde nada bebeu, apenas se sentou e pensou estarrecido em tudo que lhe acontecerá na ultima hora do dia anterior. Por fim, nasceu o dia, completamente nublado. Mas pelo menos a chuva dera uma trégua.

- Rua 77, casa verde dois andares. – dizia Pierre para si mesmo enquanto tirava sua roupa suja do dia anterior. Morava em um pequeno apartamento a cinco ruas daquela em que o hotel de Julie se encontrava. A água era fria, mas adequada o suficiente para lavar toda a sujeira impregnada em seu corpo. Ao sair do banho, vestiu sua melhor roupa, e se preparou para ir até a casa de Eliza. Sua barriga doía.

- Rua 77. - Reconheceu ele, após uma longa caminhada de quarenta minutos. - Só há uma casa verde de dois andares aqui, tem de ser aquela.

Enquanto se aproximava, o nervosismo aumentava em si. – Eu deveria ter comprado flores! – pensou arrependido. – Não. É só uma visita descompromissada, e além do mais eu teria de roubar alguém para conseguir dinheiro para flores bonitas. – ela teria de se contentar com apenas a presença dele.

Ao chegar próximo a casa, cumprimentou um homem que estava sentado lendo um jornal na escadaria da casa ao lado. Enfim, parou diante da casa verde. Garotos brincavam em todos os cantos com suas bolas e bicicletas, sujando-se completamente nas poças de água que a chuva da noite anterior produzira. Pierre passou a mão novamente sobre sua camisa de linho, ajeitou a boina sobre sua cabeça, conferiu o hálito e enfim movimentou-se. Tocou a campainha.

O temor de Pierre quase se realizou quando ele viu sair da porta branca da casa um enorme homem de cara carrancuda. Um bigode fino se estendia sobre seu lábio superior. Vestia uma regata branca e uma bermuda marrom. Já deveria ter cerca de trinta e cinco anos, e parecia estar de extremo mau-humor.

Sim? – Ele perguntou, com uma voz que faria tremer até um general do exército.

- Olá! Bom dia. É... Meu nome é Pierre, e desculpe incomodar, mas é nesta casa que mora Eliza?

A expressão na face do brutamonte logo se transformou. A tensão em sua boca aliviou-se, e os olhos estreitados foram abertos. Ele olhou com receio para Pierre, e aproximou-se dele, descendo a escadinha que levava a porta. E então perguntou:

- Que negócios o senhor teria com ela?

- E agora? – pensou Pierre. - Será este homem um irmão ciumento ou algum pretendente? – achou melhor não arriscar. Lembrou-se então do casaco que emprestara a ela na despedida da noite anterior. Era um pretexto perfeito.

- Ontem à noite, um pouco antes de a chuva começar, me encontrei com ela numa casa de shows. Conversamos um pouco, e na hora de ir embora, emprestei meu casaco a ela, para que não se molhasse. Ela me disse que eu poderia vir busca-lo hoje.

Nem mesmo em sua época de ouro como contrabandista, Pierre experimentara uma reação tão explosiva de alguém. Ele já tomara várias surras na vida, inclusive de bandidos perigosos, mas para o seu bem, sempre saíra inteiro. Esta porém fora inesperada, e ele não sabia se reagia ou se saia correndo dali. O homem, com o dobro de seu tamanho, precipitou as enormes mãos contra seu peito e o empurrou sobre a calçada. Indefeso, Pierre nada fez, estatelando-se no chão. Sem reação, apenas ficou parado, sentado, esperando o golpe fatal. Mas ao invés de esmaga-lo, o homem apenas o pegou pelo colarinho com as enormes mãos, dizendo:

- Eu deveria te esmurrar aqui mesmo, palhaço. Mas para sua sorte acordei de bom humor. Agora suma da minha casa antes que eu mude de ideia!

Irritado, o homem largou Pierre, que foi novamente de encontro ao chão. Então entrou em sua casa, e fechou a porta em um grave estrondo. Todos a sua volta olhavam. Humilhado, Pierre levantou-se devagar, limpou sua roupa com as mãos e com o resto de dignidade que lhe restava, e foi se afastando a passos largos dali. Sem olhar para trás, não conseguia parar de pensar no motivo pelo qual aquele homem fizera aquilo. E quanto a Eliza? Porque nada fizera? Era mesmo a casa dela? Sim, claro, o homem a reconheceu, mas... O pior de tudo nem era a frustração daquela cena, e sim a mágoa que ele sentiu ao pensar na garota.

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⏰ Última atualização: May 08, 2017 ⏰

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A mulher da meia noiteOnde histórias criam vida. Descubra agora