PRÓLOGO

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Hampshire, outubro de 1806.

Em um domingo de manhã, Lady Victoria se encontrava parada em frente às janelas de vidros do escritório de seu esposo, vendo os jovens se afastarem. Ela não se conformava em ver seu único herdeiro perdidamente encantado pela escrava pertencente à família. Achava que Maria havia traído sua confiança ao apaixonar-se por seu único filho, uma verdadeira afronta e ousadia da negra que lhe servia.

— Não consigo me conformar com essa união, senhor meu marido. Havia me garantido que o nosso único filho não perderia mais tempo com essa negrinha, e, veja só, esse caso já dura quase um ano. — A mãe de George quase não se continha de tamanha raiva e decepção, afinal, já escutava um comentário aqui, outro ali dos criados e da sociedade aristocrática, o que decerto criaria uma mácula à impecável imagem de toda sua linhagem.

— Meu bem, acalme-se. — Senhor Jacob tentou acalmar a esposa, enquanto fazia a leitura de alguns documentos que acabara de receber. — Garanto-lhe que esse enamorar do nosso filho pela escrava não passará de hoje. Acabei de receber a confirmação da qual precisava. — A esposa olhou-o intrigada com tal revelação.

— Que confirmação? Do que se trata? — A mulher estava aflita, queria o fim daquilo imediatamente. Já não aguentava os olhares tortos das outras senhoras, suas amigas. — Diga, senhor meu esposo, estou ficando nervosa!

— Um desses papéis é de Oxford. Eu resolvi antecipar a partida de nosso filho. E, para garantir o fim desse romance de vez, este outro aqui é a alforria da Maria — falou, enquanto entregava os documentos para que sua esposa pudesse conferir. — Assim, podemos mandar Maria embora, sob ameaça de que ela não irá receber nenhuma carta de recomendação se continuar mantendo contato com George. Ou podemos fazê-la trabalhar para nós, recebendo o mínimo possível, mas nos assegurando de que ela nunca mais o procure. E quando ele se tornar bacharel, já terei lhe arranjado um belo casamento com aquela bela jovem dos King... Qual é o nome dela mesmo, minha querida?

— Augusta King! Sim! Essa, sim, seria uma bela esposa para o meu menino! Sem falar no ótimo dote que a acompanha. Se bem que não é nada se comparado à nossa fortuna — disse, observando o casal que julgava estar se escondendo dos olhares de todos.

Enquanto isso, sob a sombra de um carvalho, próximo ao riacho que cortava a propriedade, o esconderijo daquele jovem casal, George envolveu as mãos pequenas entre as suas, trouxe a mulher diante dele para mais perto e observou a forma como a luz do sol refletia nos belos olhos cor de ébano.

— Acredite em mim, meu amor! Casaremos e teremos lindos filhos, você verá! — Acariciou o rosto dela com gentileza. Ele acreditava que poderia existir um futuro para os dois, pois não conseguia imaginar a vida sem Maria.

— Sua família nunca permitirá que isso aconteça, por mais que sua mãe tenha afeição por mim. Eu não sou branca, não possuo um bom dote e nem provenho de uma família rica, George. A sociedade jamais aceitará uma mulher que não é uma lady. — Maria soltou as mãos dele e afastou-se alguns passos. Sentia seu coração apertado, a separação entre os dois amantes era inevitável. Olhando para o chão, não conseguia encarar os profundos olhos que a fitavam, verdes como o campo ao redor deles.

— Podemos fugir para Londres, ou talvez Escócia, quem sabe? O que você quiser, meu amor. Ir para bem longe de tudo e de todos, para um lugar onde possamos ter uma boa vida. Ou mesmo um país dos trópicos, algum que esteja progredindo. — George tentava manter o otimismo perante tamanha adversidade que ambos enfrentavam. Precisava de Maria firme com ele, para que pudessem enfrentar a sua família juntos.

— E, então, toda a sua família irá procurar pela negra fugitiva que enfeitiçou o filho branco deles. Porque será assim que irão nos procurar. Não quero passar a vida fugindo — falou, sem qualquer sinal de felicidade na voz. Ela no fundo sabia que a união de uma negra forra e um branco da burguesia não era bem quista perante a sociedade, aonde quer que eles fossem. — Daqui uns meses, você irá para a faculdade e nem se lembrará mais de mim. — Ela tentava evitar que as lágrimas em seu coração chegassem aos olhos, mas sabia que eles não ficariam juntos, apesar do seu amado manter acesa a esperança de que seriam felizes um dia.

O segredo de Joanna (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora