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Fiquei à espera no bosque, a meio do percurso que percorria todos os dias, sentada numa rocha que servia de banco natural. O chão estava coberto de folhas mortas, casca apodrecida, agulhas de pinheiro e pinhas espalhadas ao acaso. O vento gélido mas gentil fustigava-me o cabelo negro e rebelde para o meu rosto, pondo-se à frente dos olhos e da boca. Furiosa, atei-o firmemente num rabo de cavalo e puxei o cachecol de lã até às orelhas, de modo a que tudo o que estivesse debaixo do meu nariz tivesse tapado para eu não congelar. Oxalá tivesse trazido o gorro! O inverno estava a dois meros meses de distância. Tirei o telemóvel do bolso do casaco e verifiquei as horas. 17h30, a detenção devia estar a acabar. Quando o ecrã ficou escuro, consegui ver o meu reflexo nele. Quer dizer, a única coisa que consegui ver foram os meus olhos a espreitarem por entre a camada de roupa escura e o cabelo também escuro. Eram cor de mel, aproximando-se do tom dourado que adquiriam quando mudavam. Perdida nos meus pensamentos, nem me apercebi que Richard estava ali, até ele falar e me fazer saltar de susto:

- Traidora! - silibou ele, referindo-se ao facto de o ter deixado na detenção.

- Se o sou, porque vieste?

- Porque tens respostas.

Anuí com a cabeça. Eu era a única em Beaconsfield que ele conhecia e sabia que tinha respostas às sua questões. Convidei-o a andar comigo, visto que tinha de me livrar do frio de alguma maneira, e ele aceitou. Caminhámos durante algum tempo em silêncio. Ele para organizar as perguntas e eu as respetivas respostas. Quando me senti preparada, propus:

- Eu vou responder a todas as perguntas que tiveres, mas eu também tenho dúvidas e quero que me respondas com toda a sinceridade ao que te perguntar. Sem segredos, combinado?

Ele fitou-me com desconfiança. Ainda estava ressentido pela minha "traição", mas vi que estava disposto a dar-me uma oportunidade.

- Muito bem - disse eu, com um pouco de entusiasmo na minha voz - Quem começa? - o seu silêncio foi a deixa para eu continuar - Como vieste parar aqui?

Pela expressão no rosto dele, eu acabara de tocar numa ferida ainda aberta. Conseguia ver memórias desagradáveis a passarem-lhe pela vista, mas isso apenas me deixou mais curiosa. Tenho uma curiosidade e fascínio imensos no que toca ao sofrimento. Quero sempre saber a história por detrás da pessoa (e não só), saber aquilo que o causou. Esperei pacientemente, afinal ele tinha prometido contar o que eu queria saber, assim como eu.

- Digamos que envolveu um longo historial de sarilhos e de troca de orfanatos e casas de acolhimento, um quarto da última em que estive destruído e a minha primeira transformação. Tudo isto aconteceu à cerca de um mês.

Percebi o que quis dizer. Tirando a Lua Cheia de há três dias, a última tinha sido há cerca de um mês atrás.

- Mas espera... Se és órfão, isso quer dizer... Que tu és um Ómega? - perguntei, parando a caminhada e a conversa - Nunca conheci um solitário em toda a minha vida.

- Um Ómega?

- Ómega, solitário, chama-lhe o que quizeres. Quer dizer que não fazes parte de uma alcateia. Que estás sozinho.

Assim que as minhas palavras saíram da minha boca, eu senti pena de Richard. Tudo agora fazia sentido. A confusão dele, o medo de uma vida nova e desconhecida, a surpresa e a felicidade ao saber que éramos iguais. Até agora, ele estivera sozinho contra o mundo, pensando que era o único. Mas também senti admiração, afinal de contas, ele era um sobrevivente. Richard era um solitário, não porque queria, mas porque não tivera outra opção.

- Minha vez. Como é que eu sou um lobisomem, se eu não fui mordido?

Ri-me, as minhas gargalhas ecoando por entre as árvores. Ele esperou que eu acabasse, impaciente. Era óbvio que eu o tinha ofendido de alguma maneira, mas a sua ignorância tinha-me deixado sem palavras. Assim que acabei, inspirei fundo para recuperar o fôlego.

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⏰ Última atualização: Oct 14, 2017 ⏰

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Victorious WolfOnde histórias criam vida. Descubra agora