Esperando-a

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Miguel sentia que seu coração estava fisgado pela  criatura que emitia tal beleza hipnotizante. 

Estava na Grande Floresta há alguns anos já, era verdade, mas só naquele momento, tocando seus cabelos exóticos, ele se sentira vivo, como se a vida fosse algo a mais. Com tais pensamentos em sua mente, voltou para casa, quase sem nem perceber direito o trajeto que seguia, pois sua atenção estava toda concentrada em sua mente. Tinha sido um sonho, ele pensava consigo mesmo. 

Quando se deu conta, já havia chegado em casa, sem caça, porém com um sorriso em seu rosto. Seus colegas, também caçadores, ficaram preocupados com a demora de Miguel, um deles, com cara carrancuda e pelos ásperos e longos foi ao seu encontro e disse que o líder queria falar com ele. Miguel, já acostumado a relatar as ultimas situações sobre a caça para o líder da tribo, não se surpreendeu, apenas se agasalhou mais, sentindo que o frio aumentava com o crepúsculo e foi de encontro com o Alfa de sua tribo.

Ele entrou na sala onde ele se estabelecera. Grande, feita de madeira, com vários troféus que havia caçado pendurados nas paredes. De Ursos, animais comuns para Miguel, até animais com aparência mais agressiva, tais esses nunca havia visto em sua vida e realmente esperava nunca ver.

Ele tinha chifres enormes, rústicos. Sua aparência transmitia severidade e responsabilidade. Seus cabelos, ruivos, já desbotavam, com alguns fios brancos aparecendo em sua barba e cabelos. Gahnorian, como alguns o chamavam, era o chefe que conduzia aquela tribo. Ele, como qualquer bom líder, preocupava-se com todas aquelas pessoas que dependiam de sua mão firme, suas ordens e sabedoria. Era fácil enganar-se, achando que com seu rosto rústico, não era alguém que se importava, quiçá amava todos que depositavam responsabilidades em seus ombros. Gahnorian escolhera Khartzo para lhe entregar relatórios sobre suas caças, as florestas e tudo que se relacionasse ao que a mudança climática poderia afetar. Mesmo Miguel não sendo um dos seus, Gahnorian supria simpatia por aquele estranho caçador que acolhera alguns anos atrás. E por isso lhe dedicara tal trabalho.

- Devo falar, Senhor, as coisas não estão fáceis. Não encontro nenhuma caça há dias, como sabe. Os rios, congelados. Peixes nem pensar. Alguns animais migraram para algum lugar onde o frio não os mate, já outros, infelizmente, acho eu, morreram. Não sou daqui, devo dizer, mas, pelo que me parece, não faz frio assim há anos. Certo? - Miguel o olhou curioso, esperando uma resposta diferente da que ele achava que era a certa.

- Infelizmente, sim, Khartzo. O inverno passado foi vigoroso, admito, mas ainda conseguimos sobreviver. Porém, o inverno deste ano ainda nem chegou e já está mais frio do que nunca. Se não encontrarmos nada, espero eu que as nossas reservar de inverno nos mantenham vivo. Você sabe, toda a caça foi fraca até aqui, mas dificilmente o suprimento de comida acabará. Bem, pelo menos assim espero, afinal, quem cuida dos números não sou eu. - Finalizou ele, demonstrando certa preocupação em sua face, mas logo mudando o semblante e olhando para Miguel. - Ora, o que há de diferente em você, Khartzo? 

Surpreendido, o caçador levantou os olhos e percebeu que não estava prestando atenção em Gahnorian.

- Oh desculpe-me, Senhor. Bem, claro, claro, imagino que os suprimentos darão conta até o findar do inverno - respondeu, evasivo.

- Parece-me sonhar com algo. Diga-me o que o incomoda? Talvez eu o possa ajudar - sugeriu.

- Não, não, acaba por não ser nada, Senhor... - ele hesitou - Bem, talvez o senhor possa, sim, me ajudar.

- Claramente

- O Senhor já ouviu falar em uma floresta ao sudeste daqui? Perto da pedra calhada, digo - continuou. - Parece ser uma pergunta besta, mas... Sabe algo sobre?

- Ora, mas como assim? Nós dois sabemos que lá não há floresta nenhuma. Por quê? Viu algo de estranho lá? - Estava curioso. 

- Bem, não é nada. É, realmente, não há nada. Acho que estou viajando demais na minha imaginação perante toda essa preocupação com o frio. Queira perdoar-me, falo bobagens.

- Ora, bem - disse ele, confuso com a situação. - Não há problemas. Pode retirar-se. O inverno começará daqui uma semana, creio eu. Até lá você caçará. De acordo? Ótimo.

Miguel retirou-se da sala, indo direto para sua casa.

Lá, em sua cama, começou a pensar em tal criatura. Em meio a tanto frio, aquela visão o aquecera. Era ela, ele sabia. Havia algo ali, algo quente e precioso. Mas e se fora apenas um sonho? Como lidaria com algo tão doce que afinal das contas revelaria-se apenas um sonho? Era melhor não pensar nisso. Mas sua mente voltava para sua visão.

Por que só ele via a floresta? Como iria encontra-la de novo? Foi assim que adormeceu, pensando nela. 

No dia seguente, após a caça, fracassada, por sinal, ele se instalou onde deveria encontrar a floresta do outro dia. Não estava tão frio quanto o dia anterior. Então ali ele esperou, desejando que algo acontecesse, que ela aparecesse. Mas ela não veio. Não naquele dia.

No dia seguente ele fez o mesmo, e no outro também. Esperando que ela viesse. Mas Arilham demorava, e ele se sentia deprimido. 

Em seu subconsciente realmente começava achar que o frio lhe afetara a mente, fazendo-o achar que vira algo, sentira algo, mas no final das contas, poderia não ter sido nada. Uma alucinação, talvez, causada pela preocupação, pelo frio, ou qualquer outra coisa. Mas isso, claro, ele não queria levar em conta.

No ultimo dia de caçada. Ele, ansioso, decidiu esperar pouco ali. O frio era insuportável, e anoite caía rápido. 

Sentou-se em uma pedra, mexendo os dedos em uma sacola de pele, a qual carregava um animal que Miguel caçara. Finalmente conseguira caçar, e logo no dia mais frio. Não era grande coisa. Uma animal parecido com um esquilo, pequeno, mas, de qualquer forma, era alguma coisa. Então ali, observando a caça enquanto tremia de frio, ouviu um barulho a sua frente. O vento, forte, bateu em seus cabelos, e ele olhou para frente.




A Grande Floresta: O Crepúsculo da VidaOnde histórias criam vida. Descubra agora