"Era uma vez..."

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"... um Rei e uma Rainha, os mais tristes que já viveram, pois não podiam ter filhos. Eles rezavam, peregrinavam, faziam tudo o que estava a seu alcance, mas nada adiantava. Até que, depois de muito tempo, Deus sentiu misericórdia dos pobres regentes, presenteando-os com uma linda menina."

Allistair Rose era um jovem impetuoso, mais um na longa linhagem de homens de armas de sua nobre família. Haviam se mudado a menos de um mês para aquele palácio, presente do próprio Rei Charles II pela lealdade demonstrada à Coroa, mas Allistair já conhecia bem seus corredores.

"A jovem Princesa era linda como um anjo! Sua pele era branca como o mármore mais nobre; o rosto, delicadamente róseo, e os lábios, corados como morangos frescos. Olhos de esmeralda, cabelos negros como a noite e lisos como fios de ceda. Um presente do mundo além deste! Era tão bela que não demorou a despertar a cobiça dos homens e a inveja das mulheres, deste e de outros mundos."

Allistair recordava-se de cada palavra dita pelo velho mercador. Desde aquele dia, sentia-se compelido a desvendar o segredo que se escondia no velho Palácio Wilkinson. Ouvira muitas lendas, fossem dos nobres na agora distante Londres, fossem dos aldeões do condado; todas tratavam de fantasmas assombrando o palácio, bruxas fazendo-o local de congregação, e mesmo um ogro, que para ali arrastava as crianças que capturava.

Nada, porém, como a lenda da Princesa Adormecida.

"Então, um dia, o Rei e a Rainha receberam a visita de uma maldosa Fada, que como todos em que nessas terras viviam ouvira falar na beleza exuberante da jovem Princesa. Tão logo avistou-a, a Fada foi tomada por tamanho ódio que lançou sobre ela uma maldição. A Princesa cairia em um sono profundo, sem jamais envelhecer, mas também sem jamais acordar, até que recebesse o beijo de um valoroso Príncipe."

– Tolice. – dissera sua madrasta, tão logo ouviu de Allistair a história contada pelo mercador. Madame Rose era uma mulher austera e racional, que sempre julgara contos como aqueles nada além de anedotas elaboradas pela ralé para dar alguma cor às suas vidinhas insignificantes.

"Desesperados, o Rei e a Rainha de tudo fizeram para salvar sua filha. Os melhores médicos, das mais distantes terras, foram convocados, mas a maldição da Fada era poderosa, e todos que tentavam acudir a Princesa eram vitimados pelas piores moléstias e infortúnios. Logo, o Rei e a Rainha se viram sem escolha; ordenaram que todos na corte deixassem o palácio. Assim foi feito; todos partiram, e a Princesa Adormecida jamais foi vista outra vez."

Aquela seção estava deserta. Lá fora, nuvens cinzentas bloqueavam o sol, antecipando uma garoa fina e escurecendo ainda mais o interior do palácio. Allistair acomodou a vela que trazia em um castiçal afixado na parede, e começou a tateá-la. Já havia explorado o palácio de cima a baixo, tinha certeza de que teria que estar ali, em algum lugar.

Não era apenas o fato daquele trecho ser, misteriosamente, o único desprovido de qualquer mobília, mas principalmente pela página de diário que Allistair encontrara, rasgada e enterrada sob uma grossa camada de poeira, naquela mesma passagem,, no dia anterior:

"condado de Wil kin son, Wickedson, will kill son.. 22 de julho (.....)

o quê estou fazendo

(.............) FAZENDO??

?

Preciso colocar meus pensamentos em ordem

fechar uma ala do palácio, é o que PRECISAMOS fazer, é o único jeito de ninguém (.............) E(..)z(..)bet, eles a amam demais

Os (.......)garos mentiram. Será que alguém vai acreditar em mim??

Csipkerószika - Bela & AdormecidaOnde histórias criam vida. Descubra agora