Tex-Mex

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Dirigindo pela avenida Azcuénaga, olha o relógio e são quase onze

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Dirigindo pela avenida Azcuénaga, olha o relógio e são quase onze. Acende um cigarro e liga o rádio ouvindo o mesmo idiota da noite passada. À frente, uma senhora faz sinais, ele para, ela entra no táxi falando sem parar. De início, parece estar ao telefone, ele não entende, nem se esforça para entender. "Parque Rivadavia!" ela grita como se ele fosse surdo. Ela, falando e gesticulando como esses carcamanos sempre fazem, jogou uma nota de cem no banco da frente e desceu no parque.

Esse era um bom ponto na cidade, o restaurante novo estava fazendo sucesso, ouviu dizer. Resolveu parar e esperar um pouco. No primeiro banco do parque dois adolescentes fumam crack e conversam com um policial. Pareciam contar uma história divertida, já que vez ou outra os três riam.

Sem que ele visse sua aproximação, uma mulher abre a porta e senta no banco de trás assustando-o. "Pra onde, moça?" A mulher não responde. Parece drogada ou em choque. Está pálida e muito magra, os ossos da face salientes como lâminas. "Moça?" Ele vira-se e toca sua mão fazendo com que ela estremeça. "Me leve a esse endereço" ela finalmente diz estendendo um pedaço de papel amassado.

"Você tem dinheiro? Vai dar uns 250..." Sem dizer nada ela mostra um bolo de notas. Após um longo período de silêncio, ela começa a chorar e soluçar. "Há algo em que eu possa lhe ajudar?" Ele faz a pergunta tentando ser o mais gentil possível. "Não. Meus dois filhos morreram. Ninguém pode me ajudar agora."

— Sinto muito. Acidente?

— Não, a Corpse.

— Esses criminosos! Até quando ficaremos nas mãos deles? Já vi muita gente morrer assim, moça. Na hora de vender eles são uns amores, na hora de cobrar é isso...

Ela movimenta a cabeça concordando enquanto aperta o nariz em um lenço.

— Olha, eu dirijo há 5 anos, sempre armado até os dentes, até pra dormir. Dessa carne eles não comerão!

Continuaram a viagem em silêncio até o destino.

Ela entra em casa e por um instante, como se tivesse esquecido, entra no quarto dos meninos e se dá conta de que eles não estão, nem jamais estarão lá novamente, caindo no choro em seguida.

Sentia-se culpada e impotente: tanto tempo fora de casa, trancada num emprego horrível. Não se admirava de que os filhos não tivessem aguentado a pressão. Com certeza eles ouviam rumores de seu trabalho. As pessoas são sádicas e quanto pior a história, mais vontade elas têm de contá-la.

Ela fecha os olhos e imagina os meninos drogando-se. Culpa-se por não ter conseguido atingir o peso necessário para garantir o futuro deles. Eram pelo menos mais 30kg, inalcançáveis para alguém que não conseguia fazer mais de duas refeições ao dia.

Revê todos os passos que a levaram até ali e tenta encontrar o momento exato em que tudo ruiu. Revive o contrato com a Tex-Mex Burgers, recitando mentalmente cada palavra dita; deveria atingir o peso solicitado e receberia todo o dinheiro acordado. Durante o período de aumento de peso trabalharia na produção dos hambúrgueres e receberia um salário médio. Sem expressão alguma no rosto continua revisando seus passos. Começou a trabalhar moldando os hambúrgueres e aumentou quase 1kg nas primeiras duas semanas. O peso continuou subindo semana após semana e o apetite aumentando. Após ser transferida para a moenda começaram os enjoos, a dor de cabeça, os pesadelos. Foi ali que perdeu o controle e o peso recém-adquirido. Emagrecia proporcionalmente à cada parte de carne que moía. Parecia seu próprio corpo. Durante os treinamentos psicológicos foi advertida de que isso poderia acontecer e lutava contra seu cérebro, entoando mantras e jogos mentais que a fizessem esquecer que triturava carne humana. Foi ali, ela pensava. Se eu tivesse sido mais forte, eu teria virado comida e não os meninos. Eu tinha que ter cumprido o acordo, não poderia ter falhado assim. Seus pensamentos passavam velozmente tentando dar sentido ao que sentia. Mesmo após as reuniões de apoio psicológico da Tex-Mex, pensava que a falta de apetite era algum castigo de um deus criador antigo. Ele não se agradaria de que os corpos fossem oferecidos em sacrifício em troca de dinheiro ou drogas, como aconteceu com seus filhos. Agora chorava desesperadamente tentando encontrar algo que a mantivesse viva. 

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