O Dragão na Garagem

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Nem tudo na nossa vida é o que parece ser. E às vezes as coisas são o que parecem não ser. Uma vez, uma menina de uns quatro anos de idade disse ao pai que ela tinha visto um dragão na garagem. O pai ficou assustado, é óbvio, não com a fantasia da criança, mas com a possibilidade de que algo grande e assustador pudesse de fato estar na garagem de casa, como um lagarto, morcego ou mariposa, e a menina estar chamando de "dragão". O pai, então, resolve investigar e vai com a filha até a garagem. Ele pede para que ela aponte onde havia visto a criatura e pede também para esperar na porta, que fique em segurança. O pai vai, com calma, procurando e esperando qualquer mínimo movimento.

Nesse momento passa de tudo pela cabeça de pai. Pode ser uma aranha grande, talvez até venenosa que, por sorte, não picou a filha. Ou talvez até mesmo uma cobra - um réptil mais próximo do que seria um dragão. Naquela região não era raro encontrarem cobras perdidas por aí e alguma pode ser peçonhenta também. Possivelmente pode ter sido um passarinho que entrou e ficou preso na garagem e acabou se perdendo por entre as caixas e entulhos. Sim, a garagem da família era grande o suficiente para ter um carro e muito entulho. E qualquer coisa poderia se esconder lá, até mesmo um dragão.

"Foi aqui que você viu o dragão, filha?" perguntou o pai.

"Sim," respondeu a criança. "Mas não sei se você vai conseguir encontrar ele."

"Por que diz isso?"

"Porque ele é invisível," respondeu a menina.

O pai, que estava tenso e preocupado, curvado e atento, ergue-se e solta o ar. Ele solta a cabeça para frente, coloca as mãos na cintura, e curva-se para trás, tentando se esticar ou se reencaixar depois de ter sido desmontado pela resposta da filha.

"Um dragão invisível mora na nossa garagem?" pergunta descrente o pai.

"Sim. E ele é vermelho," diz a filha.

"Vermelho? Como você sabe que ele é vermelho se ele é invisível?" pergunta o pai.

"É que você só consegue ver ele com o canto do olho e quando você não tá procurando por ele. E como você tava procurando por ele, ele fica invisível."

"Quer saber? Não me importa muito isso agora. Agora nós vamos dormir e esquecer essa história de dragão, tá bom?"

O pai pega a filha no colo e a leva para a cama. E essa foi a última vez que os dois falaram sobre isso por um bom tempo.

Mas mesmo assim, essa história chamou a atenção do pai, mesmo contra sua vontade. Vez ou outra ele estava na garagem, procurando algo perdido nos entulhos ou então usava o espaço como ateliê para suas mini reformas de casa e, não raro, ele via uma mancha vermelha passar pelo canto do olho e se assustava, sempre pensando poder ser o tal do dragão. É claro que, quando ele se virava, não via nada e conseguia no instante seguinte racionalizar essa mancha, que poderia ser desde um feixe de luz que reflete de um jeito diferente no olho ou até mesmo - e isso ele havia lido na internet sobre um caso de aparição de fantasmas em hospitais e necrotérios - uma vibração de alguma máquina que ele estava usando, ou até mesmo do ventilador ligado, que criava ressonância com o líquido dos olhos e fazia parecer que estava vendo coisas. Mesmo assim, preocupado, o pai procurou um psiquiatra que receitou alguns ansiolíticos. E eles o ajudaram a fugir do olhar do dragão.

Mas a menina não falou mais com o pai sobre isso, apesar de ainda ver frequentemente o dragão vermelho invisível na garagem. Alguns meses depois, ela ganha um irmãozinho e quando o irmão estava velho o suficiente para andar e falar, ele disse para a irmã que também conseguia ver o dragão. A menina, agora com quase 10 anos de idade, ficou extasiada! Ninguém havia acreditado nela mas agora ela tinha alguém com quem compartilhar sua visão. Os dois então passavam bastante tempo brincando na garagem, junto com o dragão.

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