Capítulo 5 - Estaca Zero

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Minha cabeça gira, lentamente os sons que ouço ficam mais claros, mas ainda abafados, identifico o som de batidas metálicas e de água corrente. Meu corpo inteiro dói, mas não é nada parecido com a dor que eu senti quando estava fervendo por dentro, agora eu estou com frio e minha pele parece molhada. Ergo a cabeça devagar, meu pescoço estala a cada centímetro que movo, me pergunto por quanto tempo eu devo ter ficado desacordado. Abro os olhos.

Minha visão, mesmo que borrada, não me impediu de sacar bem rápido o que ia acontecer comigo. De costas para mim, um homem de camisa branca fazia alguma coisa em uma bancada, ele pegava uma ferramenta à sua esquerda, mexe nela de alguma forma que não consigo ver e a coloca à sua direita junto a uma pilha de outras ferramentas. Alicates e varas de choque geralmente significam más notícias. Aprendi em meus treinamentos tanto pela H.I.D.R.A. quanto pelo exército americano a, antes de tudo, me acalmar e reconhecer minha situação e o faço quase que instantaneamente. Primeiro me mexo para tentar ver se estou machucado mas não sinto nada além de calafrios, percebo que as minhas mãos e pés estão atados, passo os olhos pelo meu corpo. Estou somente com a minha camiseta preta e calça, meus pés estão nus e uma crosta de sangue seco cobre parte deles. Meu pulso direito, assim como meus pés, estão amarrados à cadeira de metal com tiras de couro e meu braço esquerdo está preso com pedaços de metal que aparentam estar soldados à cadeira. Contraio meu braço mecânico o mais forte que consigo, fazendo a pouco força que me resta ser direcionada para tentar arrancar aqueles pedaços de metal, depois eu conseguiria me livrar do resto. Mas foi em vão. Era naquilo que residia minha melhor chance de sair dali, e aquela merda de metal não saía do lugar. Forço mais uma vez. O aumento da minha frequência cardíaca me reafirma o óbvio, eu estou ficando apavorado.

O homem se vira pra mim, ainda não consigo ver seu rosto no ambiente pouco iluminado, mas consigo ouvir sua respiração no silêncio que se segue. Eu geralmente não teria medo, quantas vezes eu me encontrei naquela mesma situação, sendo preparado para algum procedimento doloroso que me deixaria uma máquina de matar mais eficiente? Mas agora, de alguma forma, era diferente. Minha respiração parou por alguns segundos e eu não sei se foi o medo em si ou a vaga lembrança da dor agonizante.

“Pode tentar se soltar, mas essa cadeira é feita de um material quase tão resistente quanto o escudo do Capitão Rogers” o homem se pronunciou no escuro. Juntei minha forças novamente para tentar a sorte, talvez eu quebre o metal, eu não vou simplesmente me dar por vencido “Ou pode continuar... Eu sei que, cá entre nós James...” o homem desencostou da bancada e começou a andar na minha direção, ele acendeu a lâmpada do teto e parou a uns dois metros de mim, abaixando a camiseta e revelando três marcas de perfuração de bala “...Você não é um cara que desiste facilmente”.

Eu olhei pelo visor da sniper, focando o homem sentado no sofá. Por quê já não me deram a missão de acertar o Capitão América? Os dois estavam frente a frente e era claro quem iria nos dar mais problemas. Mas não é da minha conta questionar ordens. Miro do lado esquerdo de seu peito assim que o homem levanta e levo o dedo ao gatilho. Eu as obedeço. Desfiro três tiros e ele cai. Desarmo a sniper e a jogo num canto do telhado do prédio. Então vejo pelas janelas do prédio da frente o Capitão Rogers correndo em minha direção com seu escudo. Inicia-se uma perseguição.

Seus olhos me observam friamente.

“Você...” eu o fito, atônito, ele não pode ter sobrevivido “Eu não sei o seu nome, mas eu conheço você”.

“Nos conhecemos até bem demais, infelizmente” ele sobre a camisa e volta à bancada “Steve não parou de falar sobre você nesses últimos dias” ele segue mexendo nas ferramentas e me pergunto o que ele quer dizer com isso.

“Você é um amigo de Steve, certo?” continuo diante da falta de resposta, me lembro do discurso que fiz na minha cabeça para quanto eu tivesse que explicar tudo para o Steve “Então você pode me ajudar. Eu não sabia o que estava fazendo, você tem que acreditar em mim, eu não queria machucar ninguém... Eu preciso encontra-lo, Nicholas, ele precisa saber que eu me lembro, que eu quero consertar tudo e...” não chego a terminar a frase quando recebo um choque extremamente forte. Ao recobrar a consciência, o primeiro cheiro que sinto é o de queimado, cada movimento parece vir acompanhado de uma facada de dor. Outro choque vem em seguida. Tento pedir para parar mas nenhum som além de gemidos sai da minha boca.

“Sabe o que ele me falou sobre você, Barnes?” agora ele berrada no meu ouvido, ele pegou a vara de choque e a espetou no meu abdômen, dessa vez eu gritei tão alto que achei que meus pulmões fossem explodir “Sobre como ele te odeia”.

Essa última frase me machucou mais do que qualquer experimento que tenham feito comigo, mais do que a queda daquele trem.

“Não...” eu consegui sussurrar, Nicholas tinha puxado uma cadeira e se sentado na minha frente, com a vara estalando em suas mãos “É MENTIRA” eu falei tão alto quanto podia, como se o volume da minha voz pudesse espantar os pensamentos horríveis que vinham à minha cabeça.

“Sobre como você deveria ter morrido quando ele te deixou cair daquele trem” ele continuou, meu rosto começou a esquentar e senti lágrimas subindo aos meus olhos “Porque a partir do momento no qual ele pôde se virar sozinho, ser o herói de sua própria história, coisa que você nunca o deixou fazer, você passou a ser tudo o que ele sempre sentiu que foi pra você” ele chegou mais perto, não sei se seu sorriso foi ou não fruto da minha imaginação “Um fardo”. Eu parei de tentar lutar contra as amarras.

“Eu não... ele nunca foi um...” foram as únicas coisas que consegui falar antes que ele me desse um soco. Depois ele agarrou meus cabelos e puxou minha cabeça para trás.

“Você achava mesmo que depois de tudo o que você fez vocês continuariam grandes amigos?” ele então se reclinou para o encosto da cadeira “Ah, é verdade. Nem isso vocês um dia foram” eu... era um fardo? Ele queria que eu caísse?? E novamente me pego dirigindo os olhos pela sala escura sem rumo, num frenesi desesperado. Novamente eu não consigo distinguir mais o que foi real, quem eu sou de quem me fizeram ser. Steve, a minha única certeza, começa a ser destruído pouco a pouco na minha cabeça, perfurado e rasgado por dúvidas. Ergo os olhos, aquele demônio ainda está lá sentado na cadeira, rindo de mim escondido nas sombras.

“Você...” ele continuou “Vai me dizer de boa vontade tudo o que sabe sobre o que restou da H.Y.D.R.A. ou eu vou te fazer falar” a corrente elétrica percorreu a vara mais uma vez.

Winter Soldier - Retomando o PassadoOnde histórias criam vida. Descubra agora