Começando o dia

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O dia começou como qualquer outro dia comum da semana, com o som irritante do despertador ecoando pelo quarto. Após alguns bocejos sonolentos e relutantes, dei início à minha rotina matinal, uma série de ações mecânicas que já estavam tão enraizadas na minha vida que pareciam acontecer no piloto automático. O banho revigorante era como uma tentativa de despertar não apenas o corpo, mas também a mente, que teimava em permanecer em um estado de letargia. A água quente relaxava os músculos, mas eu sabia que o maior desafio ainda estava por vir: enfrentar mais um dia de aulas entediantes.

Depois de secar o corpo com uma toalha felpuda e confortável, escovei os dentes com pressa, observando meu reflexo no espelho embaçado pelo vapor. O rosto mostrava um misto de resignação e desinteresse, como se o espelho fosse capaz de refletir a profunda monotonia que sentia em relação à minha rotina diária. Vestir meu pijama novamente, após o banho, era como voltar a me esconder debaixo das cobertas, resistindo à ideia de enfrentar o mundo lá fora.

Caminhei até a cozinha e preparei uma xícara de café, precisando da dose de cafeína para ajudar a despertar de verdade. O aroma familiar e reconfortante do café preenchia o ambiente, criando uma ilusão temporária de aconchego e tranquilidade. Enquanto esperava o café ficar pronto, olhei pela janela e observei o dia começando lá fora. O céu estava pintado com tons de azul e laranja, uma promessa de um novo amanhecer, mas a empolgação que normalmente acompanhava essa visão estava ausente. Os minutos se estendiam à minha frente, e eu seguia pensando em minhas obrigações e na monotonia da minha vida, eu me perguntava se algo emocionante poderia acontecer para romper com a mesmice da minha vida.

No entanto, antes que eu pudesse sequer pensar em pegar uma xícara de café para me acordar de verdade, uma voz familiar e, para ser honesta, um tanto irritante, penetrou no ar e invadiu meus ouvidos. Era a voz de Camila, minha amiga que eu havia conhecido de forma um tanto inusitada. Camila era daquelas pessoas que nunca pareciam precisar de café para despertar. Ela irradiava energia desde o momento em que acordava, como se fosse impulsionada por uma bateria que nunca se esgotava.

Camila sempre foi uma das alunas que mais se destacavam por suas notas baixas na minha sala de aula. Ela parecia ser alheia às preocupações com as notas, não se importava nem um pouco com a competição acadêmica que dominava a escola. Seus pais também não demonstravam grande interesse por seu desempenho escolar, até que um dia o professor decidiu intervir. Ele a aconselhou a buscar ajuda extra, caso contrário, ela enfrentaria a repetição do ano letivo e poderia até mesmo perder a bolsa de estudos que havia conquistado. No entanto, os rumores corriam soltos sobre como essa bolsa havia sido conquistada por meio de um "acordo" entre o pai de Camila e o diretor da escola. Mas, independente disso, ela veio até mim em busca de ajuda acadêmica, e, como uma espécie de "boa samaritana," comecei a dar aulas particulares para ela. Claro que cobrava por isso, mas mesmo assim, o pai dela sempre tentava negociar um desconto de valor quase irrisório. Eu me perguntava quem, em sã consciência, pedia um desconto de 20 reais para aulas particulares.

Com o tempo, no entanto, eu percebi que Camila não era tão desinformada quanto sua aparência sugeria, e começamos a construir uma amizade peculiar. Era uma amizade que não fazia muito sentido para os outros, mas havia algo nela que me fazia gostar da companhia dela, apesar de suas peculiaridades. Camila era como um furacão de energia, sempre em busca de aventuras e novas experiências, enquanto eu tendia a ser mais reservada e cautelosa.

Nossa amizade floresceu de maneira inesperada, talvez porque, apesar de nossas personalidades opostas, havia um equilíbrio estranho entre nós. Eu a admirava por sua ousadia e disposição para viver a vida ao máximo, algo que eu muitas vezes temia fazer. Por outro lado, Camila apreciava minha sensatez e a maneira como eu a ajudava a pensar com mais calma em suas decisões impulsivas.

Nossas conversas muitas vezes eram uma mistura caótica de seus planos mirabolantes e minhas análises cuidadosas. Ela me arrastava para suas aventuras malucas, e eu a mantinha fora de problemas quando podia. Era uma amizade que desafiava as convenções, mas funcionava de alguma forma.

"Diana, sua vaca, desce aqui agora!" A voz estridente de Camila ecoou do lado de fora da minha casa, e eu não pude deixar de suspirar, imaginando que tipo de problema ela estava prestes a me envolver.

Rolei os olhos e fui até a janela. "O que é isso, garota? Você quer acordar o bairro inteiro? Por Deus, são 6:30 da manhã," falei, lançando um olhar irritado para o relógio de parede.

Camila, como sempre, parecia imune às preocupações com horários e sono alheio. "Aff, Di, para de fazer escândalo. Olha, desce aqui logo que eu tenho um segredo para te contar."

Suspirei mais uma vez, meio impaciente com a falta de consideração dela com o meu sono, mas concordei em descer. "Tá, tá, estou indo."

Desço as escadas, e quando chego lá embaixo, Camila já está na porta, me puxando pelo braço com um sorriso animado. Às vezes, eu realmente não entendia o jeito efusivo dela de agir. Era como se ela não tivesse um botão de volume, estava sempre no máximo.

"Puxa, garota, o que foi dessa vez? Você me arrastou de casa de pijama."

Ela rolou os olhos mais uma vez, parecendo imperturbável. "Você sempre foi tão dramática, Di. Mas relaxa, vai valer a pena. Tenho um segredo incrível para te contar."

Suspirei, resignada, e segui Camila até a calçada. À medida que nos afastávamos da minha casa, ela começou a falar sobre o tal segredo, e eu só podia imaginar que tipo de fofoca ela estava prestes a compartilhar. Era sempre assim com Camila. Mais uma vez, eu estava prestes a ser arrastada para algum drama que, provavelmente, não tinha nada a ver comigo.

"Ai, o que foi dessa vez? Para você me tirar de casa de pijama." Eu a encarei, fazendo uma careta. Pular da cama ainda de pijama não era exatamente a minha ideia de uma manhã perfeita.

Camila revirou os olhos, aparentemente não se importando com a minha desarrumação. "Você não vai acreditar quem entrou para a nossa escola!"

Arqueei uma sobrancelha, curiosa, mas ainda mantendo uma certa dose de ceticismo. "Quem? O Batman?"

Camila bufou, evidentemente irritada com o meu desdém. "Não, né. Você acha que ele estudaria se já tem dinheiro para contratar uma equipe de tutores particulares?"

Revirei os olhos, me divertindo com a empolgação dela. "Então, quem é, Camila?"

Ela sorriu de orelha a orelha, como se estivesse prestes a revelar o maior segredo do universo. "Lucas Deverro!"

Levei um momento para processar o nome. "Quem?"

Camila ficou surpresa com a minha falta de entusiasmo. "Nossa, não acredito que você não conhece ele, Di!"

Dei de ombros, indiferente. "Não conheço, e mesmo que conhecesse, não acho que ficaria tão animada quanto você."

Ela franziu a testa, perplexa. "Ué, pouco me importa. E outra coisa, tenho que me vestir para ir à escola, senão a gente vai se atrasar."

"É, você tem razão. Se não nos apressarmos, chegaremos atrasadas à escola. E não quero perder o espetáculo de ver você suspirando pelo tal Lucas Deverro."

Camila soltou uma gargalhada, e eu subia as escadas para me vestir. Quando terminei de me arrumar, peguei minha mochila e fui direto para o carro junto com a Camila. Fomos juntas hoje, já que parece que ela acampou na porta da minha casa só para me falar de um garoto. Mesmo assim, estou um pouco curiosa. Quem é esse garoto, afinal? Pode ser apenas mais um metido querendo chamar a atenção, mas minha curiosidade está me fazendo querer descobrir.

Caminhos Cruzados do Destino [INCOMPLETO-EDITANDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora