A loucura é uma realidade para os normais,mas para os são, é apenas mais um sonho distante.
Estava no confessionário Padre Alexandre, servo de Deus. Eu sei que parece loucura e espero que você também não fique louco, a linha é tênue entre a sanidade e a insanidade.
Não peço que acredite no que irei falar, apenas acompanhe os fatos e julgue sua veracidade por si mesmo.
Irônico uma pessoa de uma raça confessar seus pecados a um sacerdote de Deus.
Você descobrirá como aconteceu esse contato tão absurdo, pois ainda acredito que Deus deseje salvar minha alma, isto é, se ainda há uma dentro de mim.
O temor, a caçada, a dúvida da existência, o medo, a extinção, adrenalina correndo em órgãos sem vida, a luta pela sobrevivência, a sede, a esperança, a fé, a besta está à solta, a reencarnação da morte, a fome, elas precisam ser contidas.
Cada noite é mais uma batalha a ser vencida. Como filho das trevas, ansiosamente aguardo pelo perdão de Deus, o dia de minha redenção.
Enquanto ele prova suas criações, muitos se perdem no caminho. Será eu um pecador que não merece seu perdão? Estarei eternamente condenado?
– Conte-me sua história, meu filho.
– Pergunta ao morto qual é a sua história, Padre. No túmulo jaz o segredo. Abra os ouvidos e ouça o infortúnio de minha vida, pois será necessário desenterrar o passado.
Eram meados do século XVII. Desde a morte de minha mãe tive uma vida triste, melancólica e depressiva.
Naquela época eu era apenas um garoto de oito anos de idade que nunca saía de casa.
Não tenho muitas lembranças de minha mãe, estava sempre ocupada com as mulheres da alta sociedade, mas sempre me recordo das histórias que me contava quando chegava a hora de dormir.
Ouvir sua voz era como deixar o espirito sair do corpo ao som de uma trombeta de um anjo, o meu anjo da guarda.
Sempre fui muito tímido e reservado. Possuía uma imaginação muito fértil e um tanto exótica, foi quando despertei certos talentos um tanto incomum para a época.
Alguns meses após meu aniversário, minha mãe descobriu que estava grávida.
Meu pai sempre viajava a negócios, estando sempre ausente da família. Isto fez com que ela caísse em depressão e passou a viver trancada em seu quarto, e assim permaneceu até o dia de dar a luz à minha irmã.
Eram raras às vezes em que alguém conseguia a ver do lado de fora. Isso me fez sentir muita falta de ouvir suas histórias, mas por ser uma criança inocente eu não consegui perceber sua doença.
A ausência do meu pai sempre foi algo ruim para todos nós.
Sua gravidez foi muito complicada, quase todos os dias o médico aparecia para acompanhá-la.
Entre as fofocas que ocorriam entre os empregados, às vezes, podia-se ouvir alguém dizendo que se ela continuasse naquele estado, traria risco da criança morrer antes de seu nascimento.
Aquelas palavras geminaram em minha mente e dia após dia, cresceu em minha alma como uma erva daninha.
Foi no meu aniversário de oito anos que minha mãe saiu do quarto apenas para me dar um abraço, deu-me os parabéns dizendo que me amava e que eu merecia ser uma pessoa feliz que nunca tinha que desistir da vida.

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O Último Beijo
General FictionEstando no confessionário com Padre Alexandre para lhe revelar sobre as experiências de seu passado, Marcílio Mosset relata o quanto as pessoas são ignorantes para os fatos que cercam o mundo com situações que os livros históricos e a religião se co...