Furta-cor

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  Como um caleidoscópio as emoções de Hobi tinham várias cores. Eram amarelas quando acordava e sentia o aroma de café da cozinha, se levantava e depositava carinhosamente um beijo na testa de sua omma.

  Verde abacate indo para o trabalho a pé, sentindo minúsculas gotas de chuva descendo por sua bochecha, ou seriam lágrimas? Sinceramente, não sentia diferença, ambos os líquidos corroíam.Porém a chuva, ácida, acabava com plantações e as lágrimas, impiedosas, desmantelavam suas emoções.

  A figura melancolica que pintava Hoseok de um azul profundo era seu chefe, Min Yoongi, com toda sua misantropia, a qual fazia questão de demonstrar em respostas tortas e olhares enfezados aos funcionários do escritório.

  Mas em meio a esse festival de cores, a que fazia Hobi ter consciência de cada célula presente em seu corpo era o laranja mecânico.

  Kim Taehyung agitava os átomos em tal frequência que toda a sua aura exalava laranja, o mesmo laranja das vitrines estonteantes do centro que deixavam Hoseok ludibriado.

  Taehyung era fruto da união pouco estável de um sorriso torto com fios dourados que teimavam cair sobre seus olhos bem marcados, olhos os quais Jung desejava se lambuzar luxuriosamente, desfrutando daquela íris avelã.

  Duas colheres de açúcar no café matinal. Pequenos cristais dissolvendo no negrume como velhos astros fadados ao esquecimento do vasto universo.

   -Quando eu ainda morava em Daegu só tomava Starbucks, bons tempos!

  Hoseok sentiu seu corpo todo se reanimar ao ouvir aquela voz grave, levantando o olhar de seu café para encontrar um Taehyung sonolento pendurado à cafeteira da empresa em que eles trabalhavam. Não conteve o sorriso.

   -Mal começou o dia e nosso precioso Taehyung já está resmungando pelos cantos...- o mais velho disse em um tom provocativo e amável, enquanto observava o amigo colocar açúcar suficiente para deixar formigas diabéticas.

   -Hobi.- Hoseok estremeceu ao tom de voz sério e baixo que o loiro usou.- Você está livre depois do expediente?

  A pergunta foi tão ambígua quanto seu interlocutor, deixando as palavras entaladas na garganta de Jung. Taehyung o torturava com aqueles olhos oblíquos revirando sua alma, lendo sua mente e retalhando seu coração na espera de uma resposta.

   -Claro, eu sou um desocupado mesmo...-riu desconcertado batendo a mão na xícara e derrubando todo seu conteúdo.

  Foram essas palavras poéticas que encerraram o rápido diálogo, conseguindo tirar um sorriso ladino e indecifrável de Kim Taehyung.

  A vida é feita de imensidões, algumas estão preenchidas por vácuo outras são feitas de pequenos momentos que constroem a vastidão.

  Sempre que deixava o laranja colorir seu cinza inerente Hoseok sentia sua imensidão cheia de pequenos vagalumes fazendo cócegas em sua Via Láctea.

  Assim transcorreu o restante do dia: um Jung Hoseok  a cada dois minutos encarando o relógio, não sabendo se desejava retardar os ponteiros ou viajar pelo espaço tempo.

  Quando o sol já produzia um hematoma no céu, os pequenos raios alaranjados que escorriam através da persiana anunciavam o fim de um dia cansativo que normalmente deixaria Hobi sedento por um banho e uma maratona de séries na Netflix enquanto engolia um pote de sorvete.

  Mas hoje a brisa soprava a favor da tripulação, olhando a incrível paisagem que tinha do quarto andar,no seu cubículo, tão apertado mas ao mesmo tempo tão amplo, o moreno recordou pequenos versos a muito tempo decorados que casavam perfeitamente com o que sentia.

   - "Deverei comparar-te a um dia de verão?" - começou, imaginando Taehyung iluminado, os fios reluzentes e acobreados refletindo feixes de luz, a personificação de um sol.

   Mas logo percebeu que Taehyung era seu próprio sol, aquecendo sua vida e fazendo brotar de seus lábios sorrisos que antes eram escassos e inférteis.Fazendo sua rotina se afogar em tons de laranja, em tons de vida.

Orange-colored boyOnde histórias criam vida. Descubra agora