Selene nasceu num dia de eclipse. No instante em que a lua encobriu os raios do sol e a escuridão caiu sobre a terra, seus primeiros choros foram ouvidos no templo onde sua mãe era sacerdotisa. Um bebê forte e saudável, uma elfa pura, com uma penugem de cabelos prateados e brilhantes olhos azuis. Isso foi considerado um bom presságio à época.
Você está destinada a grandes coisas, Selene. Durante toda sua infância foi o discurso que mais ouviu da mãe e de todos os seus tutores. Nunca chegou a conhecer o pai, mas isso nunca a incomodou muito; era uma filha da lua, acima de tudo, batizada em homenagem ao grande astro celeste que iluminava os caminhos dos homens durante a escuridão. Ela cresceu entre livros, pergaminhos e penas de escrever, aprendeu a se orientar pelos céus e sabia o nome de cada constelação antes de completar doze anos de idade. A pequena elfa sempre levou muito a sério o peso que seu nascimento carregava.
Talvez por isso tenha sido uma criança diferente das demais. Enquanto as meninas de sua idade procuravam belas flores e conchas para enfeitar os cabelos durante o tempo livre que dispunham, Selene priorizava observar as plantas da floresta, catalogando-as e explorando suas habilidades, sejam curativas ou mortais, e só então, quando exausta, iria à beira do mar se distrair.
— Não importa o que aconteça, sempre vou encontrá-la entre as flores e ervas, não é mesmo?
A elfa levantou a bela cabeça para fitar sua interlocutora. Sua tutora, uma das mais sábias e respeitáveis elfas do templo, estava sentada em uma pedra a poucos metros de onde trabalhava na terra, com seus bondosos olhos azuis fitando-a. Dizia-se que além de extremamente poderosa, a velha sacerdotisa tinha o dom da clarividência, por isso não eram raras às vezes em que jovens noviças a importunavam pedindo por previsões de seus futuros. Claramente Selene não estava entre elas; apesar da pouca idade tinha bom senso o suficiente, e se orgulhava disso.
— Lady Maella – ela se ergueu, limpando a poeira de seu vestido de linho branco. Fez uma breve reverência e a elfa mais velha aproveitou o momento para contemplar sua pupila. Os longos cabelos argênteos que lhe chegavam até a cintura estavam presos em uma simples trança e enfeitados com as pequenas margaridas que cresciam por ali. Suas feições eram delicadas e um leve rubor coloria suas bochechas, resultado da exposição de sua pele alva ao sol da manhã. Selene era bela aos seus quinze anos, tão bela quanto Maella o fora em sua juventude. E seria ainda mais quando sua beleza amadurecesse. Maella suspirou. Isso era uma benção e uma maldição ao mesmo tempo.
— Sabe que não precisa se curvar perante mim, querida. Venha, sente-se ao meu lado. – a jovem obedeceu prontamente e ambas ficaram a observar a paisagem diante delas por um tempo.
Apesar de ter vivido toda a sua vida em Tegitsos, ainda considerava o local de uma imponência capaz de lhe tirar o fôlego. Localizado no alto de um grande rochedo que lhes permitia ver todo o vale florido embaixo, sua mestra se orgulhava de dizer que nem mesmo os dragões poderiam ter sucesso em atacá-los no ponto de onde estavam. Por vezes, Selene se pegava pensando o quanto disso era verdade e o quanto era exagero.
— A vista de Tegitsos é uma dádiva a qual poucos podem possuir. Fique feliz por ser uma das privilegiadas, filha. – a voz da mestra era distante, como se relembrasse eventos do passado. A discípula pousou seus olhos nela, mas logo em seguida voltou-os para o céu limpo do meio dia. De fato, ela tinha razão.
— Eu sou, mestra. – Selene sorriu, voltando-se para ela – Aconteceu alguma coisa para que viesse me procurar no vale?
— Não, nada demais minha cara. Apenas decidi que seria melhor fazer com que meus velhos ossos respirassem os ares do campo ao menos uma vez ao dia, tenho estado reclusa demais no castelo. Mas de fato, há algo que acontecerá em breve e você ainda não sabe. Como estou de bom humor, a contarei em primeira mão. – ela se ajeitou melhor na pedra – Teremos visitas em breve!
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A Sacerdotisa
FantasyNa distante terra de Tegitsos, coisas inesperadas podem acontecer quando um desconhecido naufraga e o rei é o convidado de honra. A nascida no eclipse precisa decidir se seguirá os deuses, a ciência, ou seu coração.