Cidade Dos Anjos

prólogo

Desde sempre Lira aprendeu que a sua família se resumia apenas a sua mãe Maria e a sua avó Carmen , ela não tinha um pai como as outras crianças.

Aos quatro anos de idade Lira aprendeu que deveria ficar longe da mãe quando a mesma estava com uma garrafa de bebida na mão.  Aos seis ela aprendeu que não deveria perguntar a Maria quem era o seu pai , ou levaria uma surra acompanhada de várias horas de gritos e xingamentos.

Aos dez anos ela escutou sua mãe mencionado o pai dela pela primeira vez .

Maria estava sentada no sofá com uma garrafa de tequila quase vazia e a sua avó estava dormindo no quarto , quando na velha TV de tubo , a Lady Heart  pareceu recebendo um prêmio de música muito importante.

- Está vendo aquele homem? Ele é o canalha do seu pai .

Lira olhou para a TV com os olhos brilhando de emoção e um pouco marejados . Agora  ela sabia quem era o pai dela, e ele era famoso , era vocalista de uma banda de rock. 
Maria riu amargurada.

- Nem tenha esperanças ele não liga pra você! Ele nem se importa se você morrer de fome, por isso nunca me deu nem um centavo para ajuadar a criar você!

Lira deixou as lágrimas que se acumulavam em seus olhos caírem por seu rosto , e em um momento de insensatez gritou com a mãe.

- Isso não é verdade , o meu pai me ama eu sei ! Ele só não sabe onde eu estou . Se ele me conhecer vai me levar com ele !

Foi quando aprendeu que uma garrafa quebrada dói mais que um tapa e que a única com quem podia contar , sua unica familia , era sua avó.

E finalmente quando fez quatorze anos aprendeu que o câncer não se preocupa se vai levar a única família de uma pessoa  . Aos quatorze anos ela percebeu que só poderia contar consigo mesma .

Nunca esqueceria as últimas palavras da avó, até por que ela nunca entendeu o que Carmen quis dizer .

- Ele te ama- ela disse com a voz fraca ,  segurando a mão de Lira segundos antes de partir .

As vezes ela queria nunca ter sabido quem era o seu pai , porque por mais sozinha que ela pudesse estar se sentindo ainda tinha uma chama de esperança teimosa que se recusava a se apagar.  E as vezes essa chama a queimava e machucava. A esperança de o pai poderia se lembrar que ela existia era dolorosa uma vez que os anos passavam e ele nunca veio .