C.11 - PRETO

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Segundo enterro que vou em tão pouco tempo.
Há um mês atrás tive que enterrar minha mãe,
Hoje estou vendo meu amigo sendo enterrado.
Talvez eu tenha tido uma parcela de culpa no que aconteceu com Juan aquela noite, se eu não tivesse gritado com ele, dito que ninguém gostava dele por que ele era dramático — o que de fato era — não teria acontecido isso. Mas o que eu podia fazer ? Tinha acabado de perder minha mãe, estava e estou destruído por dentro. Não sei lidar com perdas, acabei descontando parte do que sentia no momento em cima dele. Desculpe por isso, Juan.

Uma chuva fina começa a cair de forma tímida porém igualmente gelada. Todos que o conheciam estavam em volta daquele caixão enquanto aquele homem vestido de uma batina branca pronunciava algumas palavras. Alguns dos presentes com certeza estão por que foram obrigados por seus pais, tenho certeza de que metade nem se quer sabem o nome do que estão enterrando. Hipócritas. Não consigo entender o que se passa na cabeça de gente como essa capaz de matar um garoto inocente, que mal ele oferecia ? Não matava nem uma formiga.

Enquanto o caixão descia naquele enorme buraco que se formava poças de lama graças a chuva que agora caia forte, vejo nos olhos de Janete, mãe de Juan, lágrimas rolarem junta aos pingos de água que molhavam sua pele branca. Via também o sofrimento no olhar de Ryan, como se pudesse ver seu coração apertado querendo saltar naquele caixão junto ao corpo morto de seu irmão.

Os médicos entregaram para a família o resultado da autópsia revelando uma enorme crueldade que mais tarde nos seria mostrada em um vídeo gravado no próprio celular de Juan. Além de ter sido brutalmente estrangulado, Juan foi covardemente estuprado sem dó nem piedade. A covardia não foi só por aí, foi além, pois aqueles animais que se mascaravam tiveram a coragem de gravar tudo, desde o estupro ao enforcamento.

É, de fato, algo revoltante.
Juan sofria, gritava para que parassem de machuca-lo, chorava como se pedisse por sua mãe, mas aqueles homens não foram capazes de parar, apenas continuaram a maltrata-lo e não sastifeitos por aquele ato obsceno penduraram seu corpo apoiado a um banco que dividia sua vida da morte.

— Quais suas últimas palavras, viadinho ? — uma voz distorcida e abafada dizia ao fundo do vídeo. Com os olhos enxarcados por lágrimas Juan olha para a câmera e com dificuldade diz.

— Me desculpa mãe... Desculpa por tudo… — E foi aí nesse momento que algum infeliz chutou a cadeira em baixo dos pés de Juan o fazendo lutar por sua vida, mas já não havia forças em seus braços, já não havia vida em seu corpo e quando Juan parou de se debater largaram a camera no chão atrapalhando a visão nos permitindo apenas ouvir sons distorcidos.

Juan morreu,
Morreu por que ? Duvido vocês acertarem.
Se você disse que ele morreu por ser gay, sinto dizer, você está certo. E o mais irônico disso é que estupraram um garoto, sendo ele gay e o mataram por isso.

Os corredores da escola agora tem cartazes pendurados em memória de Juan, agora que ele morreu sabem quem ele é ? Interessante.
Não creio, fizeram até um memorial enfrente ao armário dele. Muito conveniente agora, não acham ? É o que eu disse, quando estamos vivos ninguém se importa, mas quando morremos todos nos conhecem. Hipocrisia.

Adentro a sala e todos parecem ter combinado irem de preto naquele dia, mas pelo o que ele estavam de luto ? Pela falsidade deles ? No meio da aula de português, quando o professor falava qualquer baboseira em relação ao Juan, eu paro e encaro todos ali como se prestassem atenção no que o professor falava, duvido até mesmo que ele prestava atenção no que falava.

— Eu sinto muito pela morte de seu amigo, Thomas. Meus mais sinceros pêsames. — O professor diz dando tapinhas nas minhas costas. — Tenho certeza de que o… de que ele era um ótimo aluno.

Meninos Também Usam Rosa Onde histórias criam vida. Descubra agora