Estava decidido. Não aguentava nem mais um minuto. Após as aulas iria começar tudo de novo: novo lar, novas amizades, nova família..
Não vou negar que ao princípio a ideia me assustava. A ideia de partir sem deixar rasto e não voltar a ver os meus conhecidos, aqueles poucos que estão sempre lá para mim porque querem. Os que me tinham feito tomar esta decisão tinham sido sem dúvida os que demonstraram um amor forçado para não terem de aguentar os meus "dramas" dos quais poucos querem saber.
Tocou. Era agora. De manhã tinha preparado o necessário: duas camisolas, dois pares de calças, a minha carteira com uns trocos e um necesser com desodorizante e escova e pasta de dentes. Não podia levar mais coisas se queria que ninguém notasse além de que não ia caber naquela mochila que me tinha sido oferecida pela minha falecida madrinha anos atrás.
Saí da escola e percorri os corredores cheios de adolescentes que andavam acelerados, desesperados por sair daquele sítio ao que se referiam como um inferno. Eu não tinha a mesma opinião. Para mim, a escola era um sítio onde podia descansar dos problemas que tinha em casa com a minha mãe. A minha mãe era outra das razões pela qual me queria ir embora. Numa relação de mãe e filho normal é a mãe que cuida do filho, não ao contrário, que era o meu caso.
Apanhei o primeiro autocarro que apareceu na paragem. Comigo, subiram mais três ou quatro alunos da escola que frequentava, mas foram saindo todos. Eu fiquei até à última. Fui acordado pelo condutor, a quem perguntei onde estávamos. O senhor limitou se a olhar para mim e depois saiu do autocarro para apanhar ar. Eu não tive remédio se não esconder me atrás de uns bancos traseiros. Não podia sair de ali assim, devia estar no máximo a dez quilómetros do meu ponto de partida e se ia aos poucos no fim ia me cansar demais em muito pouco tempo. O condutor subiu e por sorte não revisou os assentos. Eu era o único que continuava ali, a tentar fazer o menor barulho possível.
Passaram três, talvez quatro horas e a minha barriga começou a reclamar. Estava com fome. Não tinha levado muito dinheiro e também era escusado se não íamos parar para eu poder comprar alguma coisa.