Capítulo Único

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Na primeira vez que terminei um relacionamento – bem, ele terminou e pela segunda vez, mas isso não importa – ouvi uma interessante teoria sobre garotos. A tal teoria partia do princípio que caras são como uma sobremesa: bons, mas não estritamente necessários. Bem, no momento estou folheando um grande cardápio das mais diversas sobremesas: Tinder. Eu nunca entendi realmente em que ponto da evolução humana começamos a nos disponibilizar, como produtos em catálogos, em aplicativos de paquera, porém aqui estou eu: arrastando para a esquerda um número de rapazes que só cresce. Numa sexta à noite. Minha vida só melhora.

Lucas foi o primeiro cara que me apaixonei a ponto de topar um relacionamento sério, porém, o maior dos problemas era que ambos não fomos feitos para relacionamentos sérios. Ele é guitarrista numa banda que toca em espeluncas hipsters e tem um sorriso desgraçado, que me conquistou na primeira vez que vi. Devo admitir que criei uma pequena obsessão por aquele cara com cabelo à la Alex Turner em começo de carreira e uma infinita coleção de jaquetas de couro e camisetas de bandas de rock (a minha favorita era a do Joy Division). Como boa parte dos casais da nossa geração, começamos nosso relacionamento despretensiosamente, ficando uma vez ou outra depois da aula. Rapidamente isso se tornou algo meio que sério, o que assustou Lucas. Creio que ele estava acostumado com o fato de que sempre haveriam garotas disponíveis para o guitarrista da banda. Eu continuei a frequentar os shows da Sans-Culottes na faixa e por muito tempo presenciei o cara por quem eu estava apaixonada aos beijos com outra. Devido a isso, tomei a estúpida decisão de começar um rolo com Nando, um cara da nossa antiga escola, colega de Lucas – coisa que não durou, mas pelo menos fez com que o guitarrista por fim decidisse que sentia algo por mim. E é aí que as coisas se complicaram.

São Paulo, 17 de março de 2016

Há coisas ruins em São Paulo e com certeza, a pior delas é o acesso entre as linhas verde e amarela do Metrô. Apesar de as esteiras sentido Consolação estarem vazias, todo aquele trajeto me cansava, porém segui firme até a plataforma onde eu pegaria o trem sentido Vila Madalena. Naquela noite, a Sans-Culottes tocaria numa espécie de pub, coisa que estava deixando toda a banda muito animada. Pedro, o vocalista, tinha certeza que após esse show as portas se abririam para os caras. Eu não tinha certeza sobre o que sentia com relação às tais portas, já que meu namorado se tornando um astro do rock não era algo que me deixava confiante, entretanto, eu torcia de verdade pelos meninos. Me sentia orgulhosa toda vez que os ouvia tocando suas músicas autorais e não apenas covers de bandas alternativas ou até mesmo das mainstream. Após a gravação de algumas demos, os caras estavam confiantes que conseguiriam gravar e lançar, independentemente o EP Constituição Outorgada. Quando finalmente cheguei ao local do show, me dirigi instantaneamente para o palco, onde os meninos organizavam os instrumentos. Lucas checava se estava tudo certo com a guitarra junto de Nicolas (o baixista) e Pedro postava uma foto no Instagram. Surrupiei um gole da cerveja do vocalista antes mesmo de ele escolher qual filtro analógico ele usaria na foto.

— Fala, Isa — disse Pedro, retirando a garrafa de Heineken da minha mão. — Tudo bom?

— Epa, calma aí, Pedro. Não é como se eu fosse roubar sua cerveja. — Eu falei, rindo. Fui em direção a Lucas, que me beijou. Eu simplesmente adorava estar presente nos shows, já que além de amar música ao vivo, eu adorava saber que aquele cara ali era meu namorado e que eu estava presente em todos os momentos da Sans-Culottes, desde os perrengues até as vitórias.

— Você tá linda hoje — Elogiou Lucas, reconhecendo a camisa xadrez que peguei emprestada. — Tenho uma surpresa pra você, Isabela.

— No show? — Perguntei, abraçando-o. — Escreveram uma música para mim?

TwiceWhere stories live. Discover now