Capítulo 1

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A noite rugia. Nenhuma alma sábia parecia disposta a se aventurar sob aquela tempestade. Os ventos sopravam forte, uivando, gelando o ar e a terra. Os raios pareciam ser os únicos capazes de iluminar o céu negro, mesmo que por pouco tempo. Os trovões, impiedosos, pareciam fazer com que o próprio chão tremesse de medo. A chuva caia pesada, torrencial, silenciando até mesmo o som dos roncos dos motores que deixavam a cidade.

Por uma estrada rochosa agora coberta de lama, quatro veículos avançavam pelo temporal. Três carros blindados e um caminhão. Todos tão negros quanto a escuridão que os cercavam. Os ofuscantes faróis amarelos pareciam ser os únicos indicadores de suas presenças.

Meia hora se passou. Os veículos pararam. Seu destino era óbvio. Fora um velho armazém, nada havia naquele pedaço de rocha sem vida.

Prontamente, os homens saíram dos carros. Apenas dos carros. O motorista do caminhão permaneceu quieto, atento ao que ocorria.

Eram quinze no total.

Treze eram os típicos capangas. Brutos, com a cara fechada, armados com rifles e escopetas. As roupas escuras eram esfarrapadas, surradas. Certamente não os protegeriam da chuva. Seriam ainda menos úteis contra balas. Nenhum deles parecia ter algum tipo de treinamento formal. Eram do tipo de mercenários que poderiam ser facilmente descartados após o uso.

Os outros dois eram os chefes. Parceiros de longa data, apesar de haver certa rivalidade entre a dupla. Os cabelos eram bem arrumados. As barbas, bem feitas. Os sorrisos esbanjavam autoconfiança. Os ternos, um cinza e outro branco, estavam impecáveis. É claro que dois capangas viriam com guarda-chuvas para manter os chefes a salvo das perigosas gotas de chuva. Não me surpreenderia se aquilo fizesse parte do contrato.

Com passos rápidos, os homens se dirigiram até a porta. Dois deles vinham um pouco atrás, carregando pesadas maletas prateadas. As batidas fortes e impacientes no portão de aço vieram seguidas de sua identificação. Os compradores se surpreenderam ao perceber que as portas estavam destrancadas.

Com certa hesitação, eles entraram.

Dentro do armazém, pouco era visível. As luzes brancas eram fracas, incapazes de dissipar as sombras. Alguns caixotes de madeira estavam espalhados pelos cantos, muitos cobertos por lonas brancas. Porém, os olhos de nenhum dos homens se focavam naquilo. Algo no centro da sala era bem mais tentador.

Longos cabelos ruivos. Pele alva como marfim. Olhos cor de mel. Lábios doces e delicados. Um sorriso perfeito. Aquela mulher poderia seduzir qualquer um daqueles homens grosseiros, fazê-los se ajoelhar diante de seus pés e obedecer cada um de seus comandos. Poderia fazer um atacar outro, fazê-los de fantoches para seu divertimento. Quando se entediasse, ela os descartaria como bem entendesse.

Porém, não o faria.

Não era assim que a Rainha Vermelha trabalhava. De fato, certos dias ela parecia detestar sua aparência.

Terno preto para esconder as curvas do corpo. Rabo de cavalo para prender o cabelo. Uma expressão séria que fazia seu sorriso angelical desaparecer por completo. E, mesmo assim, seu profissionalismo era questionado. Não ser levada a sério a tirava do sério.

A Rainha tirou um isqueiro prateado do bolso esquerdo. Do direito, veio um maço. Ela retirou um e guardou os demais. Com calma, levou o cigarro à boca e o acendeu.

— Então... — Ela começou a falar enquanto tragava a fumaça. Sua voz era monótona, sem emoção. — Trouxeram o dinheiro?

— Ora... — O homem de terno branco sorriu. — Não é uma recepção muito calorosa essa sua, não acha, Rainha Vermelha? — Seu tom de voz era acolhedor, um tanto quanto sedutor. — Por que não se aproxima, minha cara...? — Ele deu um passo a frente. — Ou prefere que eu me aproxime...?

Rainha VermelhaOnde histórias criam vida. Descubra agora