Vinte anos antes os dois rapazes não tinham muito com o que se preocupar, além das notícias do iminente fim do mundo. Não fazia muito tempo que se conheciam, Sete já morava naquela região, Lemuel era um visitante que estava passando tempo demais, além do esperado. De qualquer modo, foi por causa da demora de seus pais em permanecer ali que eles puderam se conhecer e fazer uma boa amizade.
Do outro lado do mundo, em algum lugar no Oriente Médio, uma nova guerra era transmitida através de um drone, que aliás, ultimamente, vinha sendo uma das novas tecnologias usadas para levar imagens de uma parte do mundo a outra. Os garotos viam tudo pela TV na sala da casa de Lemuel. Os pais dele estavam trabalhando, como sempre, e a casa ficava livre para as crianças. Embora Sete sempre tivesse a sensação de estar "invadindo" o local, ia por causa do amigo.
- Por que os adultos brigam tanto? – indagou Sete vendo o banho de sangue.
- Eles devem ter os seus motivos – disse Lemuel. – Talvez depois de crescidos consigamos entender. Os meus pais sempre dizem que as armas servem tanto para fazer guerra quanto para evitar.
- Por quê?
- Por que os que não tem armas ficam com medo de entrar na briga e fazem mais acordos. Eles devem saber o que dizem.
Na TV, o repórter falou sobre outras guerras menores travadas em outras fronteiras e novas imagens foram transmitidas. Diante deles apareceu um homem se esforçando para pressionar uma espécie de mecanismo e logo depois explodindo em mil pedaços atingindo todos os que o cercavam. Outros seguiram seu exemplo enquanto muitos se atacavam com armas afiadas e balas voavam por todos os lados.
- Será que o mundo vai mesmo se acabar no meio de uma guerra? – sorriu Lemuel. – Seria patético, não é?
- Não vai não – afirmou Sete com confiança. – Pelo menos não de homens. Meus pais já me explicaram como o mundo vai acabar.
- É mesmo? Como?
A porta da sala se abriu enquanto o casal de cientistas entrava. O Doutor Roger encarou Sete deixando clara sua infelicidade. A mãe de Lemuel, Debora, também não pareceu nada satisfeita. Eles passaram pela sala em silencio de reprovação ao filho.
- O que eu fiz para eles não gostarem de mim? – perguntou Sete baixinho.
- Eles acham a sua religião muito estranha. Na verdade, acho que têm medo de você me influenciar a acreditar na mesma coisa. Eles não acreditam em nada disso, sobre Deus, nem eu.
O olhar de Sete ficou triste. Ele não imaginava que fosse esse o motivo. Sabia que a família do amigo não cria em Deus, mas não imaginava que isso os fizesse não querer por perto quem pensasse diferente.
- Venha, eles têm muito trabalho a fazer aqui também. Vamos fazer alguma coisa – falou Lemuel se levantando e rumando para a porta.
∞
Após uma boa corrida pelos campos verdes, eles pararam para descansar um pouco. Sentaram sobre pedras planas enquanto olhavam a longa paisagem repleta de árvores. Aquela era uma região de fazendas.
- Os seus pais nunca acreditaram em Deus? – perguntou Sete retornando ao assunto.
- Não sei, mas acho que não. Vai saber. E a sua família? Por que lá todos acreditam?
- É uma questão de fé, meu pai sempre diz que Deus acreditou em nós antes.
De fato, a realidade dos dois amigos era muito diferente. Sete e sua família já moravam na fazenda a muito tempo, desde o seu nascimento. Seu pai, um medico bem-sucedido, achava que a família precisava de paz e comprou a propriedade. Lemuel, por outro lado, estava só de passagem. Seus pais trabalhavam para o governo no desenvolvimento de novas tecnologias. Por algum motivo, eles sempre desenvolviam esses projetos em locais isolados. O refugio dessa vez foi uma propriedade no interior do Brasil, onde as fazendas e casa ficavam em até quilômetros de distância. Coincidentemente, a fazenda da família de Sete era a mais próxima da casa e do laboratório dos pais de Lemuel. Com a escassez de pessoas da mesma idade, os rapazinhos fizeram amizade rapidamente, apesar da diferença entre suas visões de mundo.
- Se um dia nós estivermos no meio de uma guerra, vamos lutar do mesmo lado? – perguntou Sete com o olhar distante se lembrando das cenas vistas minutos atrás na TV.
- Se um dia nós dois estivermos em uma guerra – disse Lemuel com o olhar profundo no amigo – eu nunca lutaria contra você. Já faz muito tempo que eu não tenho nenhum amigo. Sei que meus pais logo vão ter que ir, mas ainda assim eu não vou esquecer de você.
Sete o encarou atônito. O amigo não era muito sentimental, ter dito aquilo deve ter dado muito esforço. De qualquer modo, sentia o mesmo. O mundo estava muito diferente e todos temiam que logo os conflitos armados se espalhassem cada vez mais. Todos os continentes estavam em alerta e tudo no que se falava era qual seria o tão almejado caminho para a paz. A crise estava tão terrível que até dois garotos se detinham em falar sobre o ocorrido.
- Eu também não lutarei contra você. Somos amigos.
Os dois se abraçaram de maneira leve e cansada, ainda faltava fôlego. Sabiam que os pais de Lemuel planejavam retornar em breve. Caminhões estranhos haviam ido algumas vezes até a casa deles buscar alguns equipamentos curiosos, os frutos dos trabalhos científicos deles. Lemuel explicou que quando isso acontecia logo eles tinham de partir, provavelmente para outro país desta vez.
- Será que vamos nos ver de novo? – perguntou Sete.
- Não sei. Vai ser difícil, mas, um dia, nós nos encontramos.
- Quando esse dia chegar eu espero que não seja no exército – Sete disse isso por causa do auto numero de jovens recrutados cada vez mais cedo. De fato, o futuro nunca havia sido tão incerto para uma geração desde as tensões da Guerra Fria.
De repente, eles viramum drone sobrevoando o campo em que estavam. Dez anos antes, isso seria umespetáculo para qualquer dupla de garotos, no contexto deles, era a coisa maisnormal do mundo. Os tempos realmente haviam mudado.
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O Duelo dos Deuses
AdventurePraticamente todos os livros romanceados cristãos que tratam do tema do fim do mundo trazem a cosmovisão dispensasionalista, com um arrebatamento secreto, sete anos de tribulção e tudo o mais. Porém, não é isso que a Bíblia ensina. Por isso, resolví...