"Estenda sua mão,
E pinte-me como os raios de um pôr do Sol vermelho,
Para que eu não me perca."
Day6 - Colors
Quando as bombas explodiram naquele dia, tudo que conhecíamos havia desmoronado. A força derrubara prédios e destruíra vidas, como o fogo destrói a madeira. Como a água desmancha o papel. E, assim, tudo o que um dia fora importante se partiu para sempre.
E, mesmo com todas as maravilhas criadas e idolatradas décadas atrás, não conseguiram inventar uma cola que conseguisse unir os pedaços daquele mundo partido ao meio.
Destruído por ganância e um ódio que ultrapassou limites, a Terra já não possuía qualquer cor que não fosse o cinza que cobria boa parte do céu tristonho.
As águas então valiam, literalmente, uma vida.
O mundo havia acabado e recomeçado com o que restara dele fazia apenas 60 anos. Jorge e Pietro já nasceram em meio ao caos. Entretanto, aquilo não queria dizer que eles não tivessem esperança de tempo melhores.
Era fim de tarde. Não se sabia ao certo as horas naquele novo mundo. Jorge havia ido até à casa de Pietro, seu amigo desde que o mundo já não era exatamente um mundo.
Talvez até mais que apenas amigos.
Curioso com a proposta, o garoto de cabelos pretos seguiu o outro, passando por entre destroços do velho mundo, esgueirando-se pelo resto daquele planeta há anos machucado.
Já bem distante do que chamavam de casa, Jorge pediu que Pietro fechasse seus olhos pequenos e meio juntos. Segurou sua mão e o guiou até onde ele queria chegar.
— Para onde diabos você tá me levando, Jay?
— Calma. Daqui a pouco você vai descobrir - respondeu o jovem de cabelos castanhos, entre sorrisos.
— Tudo bem - respondeu Pietro, já se corroendo de curiosidade.
Quando eles chegaram ao topo, Jay, como Jorge era apelidado, tocou os ombros do outro e o posicionou onde achou necessário. O cheiro de algo novo então invadiu as narinas de Pietro, que inspirou fundo quando percebeu.
— Que cheiro é esse? Posso ver agora? - questionou apressado.
— Prontinho!
O castanho então se afastou e deixou que a pessoa mais especial para ele fitasse aquilo. Desde que descobrira um sentimento quente e terno e que, principalmente, que aquilo era causado por Pietro, seu pequeno Pi, ele só conseguia pensar que era com ele que gostaria de passar todos os seus dias naquele pedaço de nada.
Era com ele que enfrentaria todas tempestades de areia e névoa, a fome, as doenças e quaisquer que fossem os momentos que aquele novo mundo os trouxesse.
Em meio aquele caos, era naquele garoto parado ali que ele encontrava amor.
— Jay... O que é isso?
— É natureza, Pi. É aquilo que um dias as pessoas não cuidaram. Aquilo que parecia ter desaparecido no tempo.
— É lindo! Eu não sei o que dizer... - proferia deslumbrado.
Numa colina perdida em meio à poeira e destroços lá em baixo, Jorge, que tinha olhos estreitos e de cor escura, encontrara o que havia sobrevivido da Antiga Terra. A grama era rasa, mas resistia. Algumas plantas pequenas começavam a nascer e ambos, já bem velhos, um dia descobririam que se tornaria uma grande árvore.
O pôr do Sol amarelo e meio acizentado se exibia decidido naquele pedacinho de esperança e o moreno se vestia numa surpresa trazida por aquela cena completamente inédita.
— Pi - disse baixo com um sorriso no tímido no rosto.
— Sim? - respondeu finalmente voltando os olhos para o outro.
— Eu te chamei aqui porque eu gostaria de te dizer algo. E não há testemunha melhor para esse dia do que todas essas coisas aqui - disse mostrando com a mão o lugar ao redor de si.
— O que quer dizer?
O garoto então aproximou-se do outro e segurou suas mãos. Os olhos cintilavam num brilho que até aquele céu sentia inveja.
— Pietro...
O outro entreabriu os lábios, mas nada saía de deles. Eram muitas sensações incríveis num momento só e ele não sabia lidar com toda aquela coisa.
— Eu queria dizer que, hoje, com toda essa maravilha nos observando - falou olhando para o céu rosa-alaranjado -, que você é pessoa que eu mais amo. E também que, se você quiser...
O jovem apertava de leve a mão do outro. Ele era belo demais com aqueles fios cor de caramelo balançando por causa do vento. Pi sorria fascinado com aquela pessoa extraordinária que tanto amava a sua frente e com o turbilhão de sentimentos naquele momento.
— Você aceitaria ser meu namorado?
O garoto já não aguentava mais segurar as lágrimas. Soltou as mãos do outro e o abraçou forte.
— Mas é claro, Jay. Você é a coisa mais especial que já me aconteceu. Se não fosse por você, todo esse cinza seria ainda mais escuro e triste. Você é como esse lugar aqui - desatou o abraço -, um fio verde em meio a toda aquela destruição.
Eles se encaravam numa sintonia bonita demais para o cenário em que viviam lá em baixo. Já ali em cima, o Sol ia baixando devagar, saindo de fininho, mas deixava aquela sensação de que sempre voltaria quando o dia amanhecesse.
E em nome do Universo inteiro e das estrelas que eles tinham certeza de que se escondiam lá no alto, eles se abraçaram, mergulhados no sentimento que sobrevivera, mesmo depois do que disseram ser o fim.
Amor.
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In The Name of Universe
RomanceO mundo já não era o mesmo, mas um sentimento ainda resistira a toda à confusão que fora o que chamaram de apocalipse. | Conto Gay | Pós-apocalipse |