Joaquim era um rapaz bonito, forte, musculoso, que desde os dezenove anos trabalhava na estiva. Seus pais, José e Joaquina, eram caseiros em um sítio situado à beira de um rio, e quase todos os finais de semana Joaquim ia visita-los, a fim de pescar, nadar, e se divertir.
Jamais havia levado alguém em sua companhia, até que um dia Murilo, companheiro de trabalho, o convidou para almoçar em sua casa; depois disso os dois tornaram-se amigos e um dia, com o consentimento do pai, Joaquim o convidou para passar o domingo no sítio.
Murilo adorou. A amizade entre eles foi crescendo e de vez em quando ele acompanhava Joaquim ao sítio, e vez ou outra o convidava para almoçar com a família. Murilo tinha uma irmã muito bonita e Joaquim se apaixonou. Gilda, assim se chamava a moça, não ficou imune aos seus galanteios e em breve os dois estavam namorando.
Casaram-se cerca de um ano depois e os filhos começaram a nascer. Maria de Fátima foi a primeira, depois veio Maria de Lurdes, e quando nasceu Joaquim Junior, Joaquim vibrou de alegria: finalmente tinha um filho homem.
E os filhos continuaram nascendo. Antes que um completasse dois anos, já um novo bebê ocupava o berço. Foi assim que nasceu Mário e pouco depois Maria das Dores.
Como bom português, Joaquim fazia questão de frequentar a igreja com a família, de batizar seus filhos, de confessar e comungar pelo menos uma vez por mês. Os filhos aprenderam a rezar ainda pequeninos com a mãe, e jamais iam dormir sem antes rezarem o Pai nosso e a Ave Maria.
Maria das Dores tinha completado um ano, quando Gilda novamente engravidou, Eram gêmeos e ela ficou muito preocupada, pois logo nos primeiros meses começou a sentir muita dor. Exames médicos mostraram um tumor no colo do útero e, para salvar as crianças, aos sete meses foi feita uma cesariana. Foi assim que nasceram Maria da Encarnação e Antônio.
Enquanto Gilda procurava tratamento médico, Fátima, com apenas dez anos, cuidava dos bebês com a ajuda de Glória, irmã de Gilda, que estava grávida e pouco podia fazer. Foi diagnosticado um câncer no colo do útero, que mesmo sendo extirpado, tinha deixado raízes. Apesar de lutar com todas as suas forças, Gilda não conseguiu vencer a doença, que um ano depois a levou desse mundo, deixando sete crianças para o pai criar.
Maria de Fátima, com onze anos, e Maria de Lurdes, prestes há completar nove, cuidavam dos irmãos menores, conforme a mãe lhes tinha ensinado antes de falecer, pois a tia Glória agora tinha seu próprio bebê para cuidar. Maria de Fátima teve que abandonar a escola para não deixar os irmãos sozinhos, pois Junior estava com sete anos, Mário, com cinco, Maria das Dores com três, e os gêmeos com um ano apenas. Maria de Lurdes e Júnior continuaram estudando e ajudando Maria de Fátima quando voltavam da escola. Com isso Joaquim se acomodou. Enquanto a filha mais velha cuidava dos irmãos, ele satisfazia suas necessidades de homem viril nos prostíbulos do cais.
Só que a família de Gilda começou a pressionar. Ele tinha que arrumar uma pessoa para cuidar das crianças, insistiam. Era muito perigoso para Fátima cozinhar, pois os gêmeos começavam a andar e a atrapalhavam quando seguravam suas pernas. Ela tinha que cuidar deles enquanto Maria de Lurdes e Júnior estavam na escola, além de olhar os maiorzinhos. A sogra não podia ajudar, pois sofria muito com o reumatismo. As cunhadas, todas casadas, tinham suas casas e os próprios filhos para cuidar.
Atendendo a imposição da família, que mandava, mas não se dispunha a ajudar, Joaquim contratou uma empregada. Mulher de uns trinta anos, Elizete até que cuidava bem de tudo, mas não quis ir para a cama com ele, e, devido à sua insistência, demitiu-se três meses depois. Mais duas mulheres passaram por ali, mas não se demoraram; não aceitaram a condição de amantes do patrão.
Foi então que Joaquim, olhando para sua filha Maria de Fátima, encontrou um modo de resolver o problema. Naquele dia, ao voltar do trabalho, ele lavou toda a roupa suja e ainda ajudou na cozinha. Depois, mandando Maria de Lurdes e Júnior cuidar dos irmãos, chamou Maria de Fátima no quarto e lhe fez uma proposta:
_Já estás ficando uma mocinha, Fátima, e papai precisa que entendas o que está acontecendo aqui em casa. Tua mãe morreu e deixou vocês pra eu criar, mas eu não tenho condições de fazer isso sozinho, pois preciso trabalhar. As empregadas que contratei não quiseram fazer tudo o que tinham que fazer, por isso eu as despedi... Estás entendendo, minha filhinha?
_Sim senhor. Só não entendo por que o senhor despediu as empregadas; elas cuidavam dos meus irmãos e eu queria voltar para a escola.
_Para a escola, meu benzinho? Tens certeza?
_Sim senhor; acho que ainda posso recuperar o tempo que perdi.
_Então infelizmente vou ter que separar vocês...
_Separar?! Por que, papai?
_Porque seus avós e tios vivem me cobrando, mas ninguém se oferece para ajudar, não vês? A única saída que tenho é dá-los para quem os possa criar; um para cada família, inclusive os gêmeos. Tenho pena, porque talvez vocês não se vejam nunca mais.
_Não papai; por favor. _implorou a menina chorando.
_Mas tu queres voltar para a escola, não queres, filhinha?
_Não quero mais, papai; vou cuidar dos meus irmãos pra gente continuar juntos.
_Mas não é só isso, filhinha...
_O que mais, papai?
_O papai está muito sozinho, filha. Preciso que tu sejas minha mulher, igual tua mãe foi.
_Mas eu sou sua filha, papai; o que o senhor quer que eu faça?
_Mais tarde eu te explico. Por enquanto quero que durmas comigo, no quarto que foi meu e de tua mãe.
_Na mesma cama?!
_Sim filhinha; dormiremos abraçadinhos, eu e tu. Em troca, quando voltar do trabalho eu lavo toda a roupa e faço a comida, para que tenhas tempo de cuidar dos teus irmãos e passar as roupas a ferro, como tua mãe te ensinou.
_Mas eu não sei passar as roupas como a mamãe fazia, papai.
_Não importa; irás aprendendo com o tempo. Mas tem uma condição Fátima. Não podes dizer a ninguém que és minha mulher, entendestes? Isso terá que ficar somente entre eu e tu.
_E meus irmãos?
_Quando tua mãe morreu, eu coloquei os berços dos gêmeos no quarto de vocês para que tu cuidasses deles, não foi? Agora vou coloca-los no nosso quarto, dizendo que vou te ajudar. Eles não farão perguntas.
_E se todos quiserem dormir com a gente?
_Trancarei a porta e fingiremos que não estamos ouvindo. Maria das Dores dorme cedo; os outros terão que ficar com ela. Depois que eles dormirem, nós dormiremos sossegados, tu queres?
_Se o senhor quer assim papai... Não quero me separar dos meus irmãos.
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O SEGREDO DE MARIA DE FÁTIMA
Short StoryNão pecar contra a castidade é um dos mandamentos que recebemos e devemos respeitar, seja qual for a nossa religião. Que dizer de um pai que, mentindo, ameaçando, usando de subterfúgios, peca contra a castidade de sua própria filha, de apenas onze a...