Flight

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Sydney, Austrália

— Aceita um pouco de champanhe? — foi o que uma aeromoça me ofereceu antes de eu dizer um "não, obrigado." Eu preferia contemplar as nuvens e o mar dourado de Sydney antes do anoitecer.

5 da tarde. Eu havia dormido desde o embarque, e minha mente já não pedia mais descanso. Pensamentos inquietos, insegurança e medo costumam ser recorrentes, e tudo fica à flor da pele quando eu decidia lançar mais um livro nas mãos do público. Ser escritor não é apenas lidar com suas próprias emoções e lançá-las em palavras. Exige sensatez, pensar além de si, principalmente se você tem seguidores ou fãs.

Já publiquei cinco livros ao longo de dez anos. Entre eles, dois adaptados para o cinema e televisão. Posso dizer que minhas ideias deram algum resultado.

Agora estou rumo ao lançamento do sexto. É por isso que não consigo mais ter sossego. Decidi que começaria a divulgação aqui, na cidade onde nasci.

Algo me diz que talvez eu tenha feito a escolha certa.

***

Noite. Fui molhar os pés no mar para refletir. O que eu sou agora? Não estou triste, porém não sei explicar a sensação ruim que emana dentro de mim. Já contei tantas histórias para o mundo, mas e a minha? Divorciado, solteiro e se perdendo em crises adolescentes.

Quem é você afinal, Thomas? Porque talvez, só talvez eu fosse um daqueles caras que se perdem no tempo depois de uma longa caminhada. Paro para pensar agora e tantos erros no passado que poderiam ter se resolvido de formas tão simples. Uma pena.

Casar foi um erro. Fazer planos com alguém que eu não amo foi um baita de outro erro.

Estou tentando não errar com as pessoas. Não se envolver com homens ou mulheres a não ser por uma noite.

Agora estou me olhando em um espelho. Vejo um homem de 33 anos. Olheiras debaixo dos óculos. Cabelos e barba mal feita. Quem sabe um ou outro fio branco por ali. Um certo vício em me analisar antes de dormir.

Camas de hotel são tão aconchegantes.

***

Ser perseguido por fotógrafos até a Amazon não era nem um pouco estressante se comparado a ansiedade que eu sentia minutos antes do lançamento oficial do livro. Sei que ele foi revisado há meses e que eu não alteraria mais nenhuma vírgula, entretanto, é como se lançar para o público em um show de rock. O resultado pode ser lindo ou um desastre.

Entro pelos fundos, como o combinado. Caneta na mão, tudo pronto para os autógrafos. A livraria é oficialmente aberta, e sou recebido graciosamente por leitores ávidos em devorar o enredo do meu livro. Todos me pedem para pôr seus nomes, e de vez em quando, uma foto ou outra. Tudo nos conformes. A imprensa chegara, ávida em conseguir uma calorosa entrevista comigo.

O trem começou a sair dos trilhos quando um alguém segurando o livro emergiu da fila. Aquela mão. A tatuagem meio apagada no braço. O tom de pele inconfundível.

"Sob os Olhos de uma Coruja". Título Interessante.

Fiquei trêmulo, sem absoluta reação. Meu olhar se arregalou, a boca se escancarou por um segundo.

— Não vai autografar o meu exemplar? — perguntou ele.

— Sim, sim. — disfarcei, e mesmo sabendo que conheço seu nome, ele o pronunciou.

Fiquei relutante em assinar. O vi sorrindo por um breve instante e desaparecer da fila.

Estava deixando-o ir mais uma vez. Naquela altura, eu já não estava mais me importando com a imprensa nem o resto das pessoas. Fiquei inebriado, em choque. Levantei e saí correndo atrás da figura que desaparecia do lado de fora.

Consegui alcançá-lo quando ele estava prestes a subir numa moto.

Cheguei perto, bem perto. Parei por um instante. Por que eu estava voltando atrás? 

Mas eu já estava ali de qualquer maneira.

Meu Deus, era ele. Estava fascinado. Tão diferente. Eu não podia acreditar.

— Newt, é você mesmo?!

Ele parou por um instante, seu sorriso de canto se abrindo de um jeito malicioso, como sempre.

É claro.

28 Years // NewtmasWhere stories live. Discover now