Prólogo - Parte 1

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Os gritos do lado de fora do palácio imperial ecoavam com tanta força, que a sensação daqueles que estavam do lado de dentro era que as paredes estavam tremendo. Aquelas vozes retumbavam com tanta ira que poucos sequer ousavam se aproximar das janelas para visualizar a multidão. A verdade havia sido revelada, acabando com uma farsa que já durava duas gerações.

O líder do conselho, no entanto, parecia alheio a fúria do povo. Helzor, cuja idade nem mesmo os outros membros do conselho tinham conhecimento, parecia ignorar a fúria do povo e andava calmamente pela sala, enquanto seus cabelos brancos pareciam se misturar a sua túnica ornamentada com pedras preciosas que davam a ele um ar majestoso.

Os outros conselheiros haviam se reunido num dos cantos do salão, como se estivessem confabulando uma maneira de saírem daquela situação. Porém, Helzor percebeu que um deles havia se isolado em outro canto, como se de alguma forma os acontecimentos do lado de fora não o estivessem preocupando. Curioso, ele fez questão de se aproximar.

– No que está pensando, meu bom amigo?

O homem a quem Helzor se dirigira era Fagur, o membro do conselho responsável pelo Clã Técnológico. No alto de seus quase 1,90cm e cabelos levemente grisalhos, o homem de olhos verdes fitou o líder do conselho antes da resposta.

– Minha única preocupação no momento, Helzor, é com meu filho.

– Não queria que tivéssemos chegado a esse ponto, meu amigo. Mas seu filho expôs algo que pode destruir esse planeta.

– E o que pretende fazer?

– Tenho que seguir o livro, infelizmente.

Aquela frase logo trouxe lembranças a Fagur. E a história do planeta logo veio a sua mente.

Há muitos anos, o imperador Leotã anunciava ao povo de Veltron a criação do livro da ordem, cujo propósito era colocar nos eixos uma sociedade caótica mergulhada em fome, doenças e violência que cresciam de forma gradual graças a falta de recursos que assolava o planeta. Aquele livro continha diversas leis que o povo deveria seguir para que se desse inicio a uma nova era, que se bem-sucedida viria a ser conhecida como a era da perfeição. Contudo, temendo que parte da sociedade pudesse se rebelar contras as leis que passariam a ser impostas, o então Jovem Helzor, recém empossado líder do conselho, solicitou a Jazyr, responsável pelo Clã Medicinal e o próprio Fagur que criassem um instrumento capaz de punir os rebeldes. Porém, com a ressalva direta do imperador, de que o que quer que eles criassem, jamais poderia ir contra a primeira lei do livro da ordem que era: proibido matar.

Cintes disso, Jazyr e Fagur iniciaram seu trabalho. Enquanto um se concentrava na estrutura do instrumento que iriam criar, o outro se dedicava em seu laboratório ao que seria necessário para se exercer a punição. E quando finalmente terminaram, ambos foram chamados pelo imperador para que lhe explicassem o que haviam criado.

– Se tudo der certo, tenho a ambição de revelar este livro ao povo amanhã – disse o imperador. – Desta maneira, quero antes saber se o que criaram é de fato efetivo ao que queremos?

– Será, senhor. – garantiu Fagur.

– Então me mostrem.

Os olhos cinzentos de Jazyr brilharam neste momento. A honra de apresentar sua criação ao imperador era evidente. Ele rapidamente retirou o imenso pano que cobria a invenção. E tão logo o imperador colocou os olhos sobre a estrutura em formato oval, feita em cristal transparente, sua curiosidade foi aguçada.

– O que é isso? – indagou Leotã.

– Esta é a redoma do destino, meu senhor. – Jazyr demonstrava total humildade em suas palavras. – E ela será a responsável pela manutenção da vindoura era da perfeição.

– E posso saber como ela funciona?

A pergunta do imperador fez com que Jazyr logo apertasse o botão de um dispositivo que tinha na mão direita, fazendo com que a redoma começasse a se abrir. Quando ela se abriu por completo, o conselheiro caminhou até a cadeira metálica localizada ao centro e sentou-se nela antes de iniciar sua explicação.

– Como o senhor pode ver, cada braço desta cadeira possui um compartimento que será carregado cada um com um dos dois soros que eu criei. E um deles será a sentença daquele que nesta cadeira vier a se sentar.

– E como será aplicado o soro?

– De modo intravenoso, meu senhor – disse Jazyr – Esses compartimentos serão utilizados como embolos que serão acionados mediante o botão que o réu escolher.

Leotã permaneceu em silencio, como se esperasse pelo restante da explicação. Mas como ambos os conselheiros permaneceram também calados, ele se viu obrigado a fazer um novo questionamento:

– E o que esses soros fazem?

Entusiasmado com a pergunta do imperador, Jazyr logo se manifestou:

– O soro do lado esquerdo apagará a memória do prisioneiro, meu senhor – disse ele. – Todo o passado de transgressão do réu será anulado de sua mente e ele estará apto a ser reprogramado, tornando-se um cidadão modelo. Aquele que optar por este soro, estará declarando arrependimento por seus crimes.

– E quanto ao segundo soro? - questionou o cada vez mais curioso Imperador.

– O segundo soro, meu senhor, é o que chamamos de castigo. Pois ao optar por ele, nosso prisioneiro terá demonstrado total falta de arrependimento. Logo, ao receber este soro, o réu estará se condenando ao exílio.

– Como assim? - perguntou Leotã.

– Esse soro, ao penetrar na corrente sanguínea, começa um processo de mutação, que tornará a atmosfera de nosso planeta, letal ao prisioneiro. E como o senhor proibiu a morte como sentença, não restará outra opção ao prisioneiro, a não ser deixar o planeta.

Leotã virou-se de costas para a redoma, sendo observado pelos dois. Mão no queixo, ele parecia relutante. De repente, ele se virou já falando.

– Na teoria, a ideia é boa, mas algo me preocupa.

– O que lhe preocupa, meu senhor? – indagou Jazyr.

– O funcionamento do primeiro soro me preocupa. – disse o imperador. – Quanto da memória será apagada? Eu não quero Veltronianos sem passado, sendo devolvidos às suas famílias e à sociedade.

– Isso não acontecerá. As memórias serão apagadas conforme a dosagem recebida. Além disso, após a aplicação do soro, o prisioneiro redimido será colocado em animação suspensa, por três dias na Câmara de Reprogramação, onde apenas as memórias necessárias serão devolvidas.

– Devolvidas? Vocês primeiro tiram as memórias e depois as devolvem?

– Isso mesmo, meu senhor. O soro será levado ao cérebro do prisioneiro através de nanorobôs que literalmente farão um Download das memórias. – disse Fagur. – Esses nanorobôs tem uma vida útil de 72 horas. Por isso, ao levarmos o prisioneiro para a câmara da reprogramação, iremos scannear aqueles que contenham as memórias as quais queremos apagar e logo após, vamos extrai-los. Assim, quando os três dias se passarem, os nanorobôs remanescentes irão se desmanchar, liberando as memórias de volta ao cérebro do agora, novo Veltroniano. – concluiu.

– Interessante. Mas já foi testado?

– Sim, meu senhor. – respondeu Jazyr.

– E funcionou mesmo? – O imperador queria a certeza do funcionamento do soro.

– Sim, foi um sucesso. – garantiu Fagur.

Dando novamente as costas aos dois, Leotã começou a caminhar.

– Ok, nós já terminamos aqui. Digam a Helzor que o quero diante de mim, imediatamente.

E assim, trinta minutos após reunir-se com o imperador, Helzor surgia diante do conselho, com o Livro da Ordem nas mãos.

– Ele aprovou!– comemorou. – A partir de amanhã, Veltron irá iniciar uma nova era!

Os Filhos de VeltronWhere stories live. Discover now