Não havia nada em Veneza que me prendesse.
Nada mesmo.
Por um segundo quis que algo me prendesse ali. Era verão, e eu não queria voltar para casa. Queria rever meus pais, é claro, mas o verão era especial pr'aquelas bandas.
Todo verão minha mãe recebia um estudante - era uma espécie de intercâmbio - e ali eles estudavam por horas e horas. Minha mãe é arqueóloga, e ela vive procurando O MOTIVO. O MOTIVO seria, basicamente, o motivo pelo qual ela estudou arqueologia. Ela queria encontrar alguma coisa importante, traduzir alguma coisa importante, e bem, ela já havia feito isso, várias vezes para ser mais exata, mas para ela O MOTIVO ainda não havia aparecido frente a seus olhos. Ela nunca me disse que forma O MOTIVO teria, como O MOTIVO a faria sentir. Eu queria que ela o encontrasse de uma vez por todas. Aquilo era estranho, me incomodava - pelo menos no meu ponto de vista - essa coisa toda de ter estudado arqueologia e buscar o motivo só depois. Minha mãe era assim: pouco convencional. Mesmo depois de haver traduzido frases de línguas mortas em desenhos rústicos e livros quase desaparecidos pela maldade do tempo debaixo de alguns metros de areia, minha mãe ainda não havia encontrado o tal dO MOTIVO.
Vivíamos fora da cidade, em uma pequena fazenda no interiorzinho do Arizona. Parecia um daqueles lugares esquecidos onde poucas pessoas têm a coragem de entrar. Digo coragem porque o tédio daquele lugar ás vezes poderia ser desafiante, quase um martírio. No entanto, eu não tinha problemas com o tédio. Estava acostumada com o lugar, e além disso, não era tão ruim quanto parecia nos primeiros dias... A cidade ficava perto, e tinha um punhado de coisas interessantes para fazer por lá, mas aquele verão já havia se tornado entediante demais, até para mim. Todos os alunos que minha mãe recebia tinham de ficar no meu pé, ou - como se fosse impossível piorar - quando ela inventava de hospedar alguma garota, ela dividia o quarto comigo. Eu gostava de interagir com cada hóspede, isso eu jamais negaria. Sempre gostei de conhecer pessoas novas e descobrir o que elas tinham em mente - assim, sem precisar perguntar a respeito -, descobrir o que as levavam para o interiorzinho do Arizona onde o vento faria a curva sem pensar duas vezes. No começo, é claro - com a curiosidade que me era acometida - eu cedia um tanto do meu tempo, sentada no sofá do escritório da minha mãe, observando-a debater com algum aluno, ou aluna, sobre algum hieróglifo específico encontrado em algum sítio arqueológico, ou conversando sobre arte, ou até mesmo filosofia.
Eu tinha boas lembranças, das pessoas que passavam por lá quero dizer. Uma vez uma garota do Alasca nos visitou, ela se chamava Ashley, e não estava muito acostumada com o calor, sem contar que era tão branca que não se bronzeava, por mais que tentasse.
- Você fica linda assim, bronzeada. - ela me elogiou. Eu estava deitada na cadeira de descanso na beira do rio, usando óculos escuros estilo anos 60 e tentando fazer com que se bronzeasse também, mas era impossível, literalmente impossível. Ashley ficava vermelha, quase como uma queimadura que estava se recuperando, e não havia nada nesse mundo que a fizesse pegar uma corzinha. Quando alguém me disser que nada é impossível, vou responder que a Ashley do Alasca nunca conseguiu se bronzear.
Ela era uma boa garota. Estudante de história e muito crítica, ás vezes crítica demais, mas aquilo era só um defeito corriqueiro do tipo que você pode ignorar e fingir que não está vendo. Fomos boas amigas, mas ela foi embora e então, como uma passe de mágica as coisas se dissolveram, quando digo coisas, quero dizer nossa amizade e os cartõezinhos de natal quando dezembro se acercava. Muita gente mandava cartas e cartões postais ao longo do ano, normalmente ex-alunos da minha mãe que ficaram estudando em nossa casa durante o verão. No entanto, poucas coisas boas duram muito tempo e com Ashley não foi diferente. O tempo foi passando e nossa amizade construída em seis semanas também.

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ME CHAME PELO SEU NOME ● Camren version
FanfictionApós alguns meses viajando, Camila sente que não há mais nada que a prenda em Veneza e resolve voltar para casa, embora seja verão, ela não gosta de estar em seu lar nessa época do ano, pois as atividades de sua mãe já lhe parecem tediosas. Todo ver...