Sinto o cheiro da fragrância do sabonete de bebê. Respiro e inspiro mais de uma vez, querendo lembrar da sensação de dobrar as roupinhas de bebê e guardar com todo o carinho dentro da bolsa rosa que eu levaria para o hospital. Junto com o cheiro de sabonete de bebê vem também o cheiro metálico. Sinto uma pontada leve na barriga, eu jurava que já era a minha tão querida Ana Clara chutando-a, mas a segunda pancada veio como uma dor aguda que parecia que iria rasgar todo o meu ser.
Elevei minha mão sobre as costas e a outra apoiei na cama. O cheiro de sabonete abraçou o cheiro de sangue, e eu acordei atordoada em uma cama. Agarrei o lençol e o puxei rente ao meu corpo. Meus olhos encheram de lágrimas. Estava frio, e eu senti o ar um pouco nebuloso. Olhei para cima, o teto branco indicava que eu não estava em minha casa. Olhei ao redor, bem, aonde meus olhos conseguiam alcançar, vi algumas máquinas ligadas ao meu corpo. Os sons de bipes não cessavam, elevei a mão na minha barriga, agora murcha, pensei no pior, enquanto a minha mão ia de encontro a algo plástico e fino.
Apertei os olhos querendo evitar as lágrimas, queria gritar por alguém, mas o tubo preso em meu pescoço me impedia de fazer isso, até que um par de olhos pretos me fitou maravilhada, ao mesmo tempo em que uma lágrima transbordava indo de encontro a minha face. Me agitei algumas vezes na cama. Eu tinha certeza que escutei uma música, foi quando a minha mãe desligou o celular e o colocou ao meu lado sobre a cama. Ela elevou a sua mão sobre a minha face, acariciando-a com ternura. Chorou copiosamente, até que eu vi uma mulher vestida de branco adentrar ao quarto.
— Minha filha, você voltou. — Disse mamãe, pensei em onde eu poderia ter ido. E a imagem da minha barriga de grávida veio a minha mente. Minha barriga não estava mais assim, será que tudo foi um sonho?
— Onde está o meu bebê? — A pergunta ficou presa no meu pensamento. A mulher de branco me olhou atordoada, enquanto apoiava a minha mãe para ela não ir ao chão.
— Vocês disseram que ela voltaria...
— Senhora, eu entendo sua surpresa, mas cada caso é diferente. Eu vou chamar o doutor.
2 semanas depois
Era a quarta vez que eu perguntava ao médico sobre a minha filha. Era a quarta vez que ele não me respondia. Tudo se resumia nos últimos dias em: você tem que se recuperar. E foi o que eu fiz. Não resmunguei em nenhum minuto sequer, mesmo quando meu corpo gritava de dor, mesmo quando eu sentia minhas pernas bambas, mas ainda assim, eu ficava de pé.
— Eu preciso saber. Eu me lembro de ter passado mal. Eu sabia que a Ana Clara estava chegando. — O médico ajeitou os ósculos, olhando-me através deles, liberou as palavras de forma melancólica, parecia ter medo de que todo o tratamento tivesse um regresso depois de tudo o que ele estava dizendo.
A minha cabeça rodopiou assim que ele foi pronunciando as palavras. Senti uma pontada no meu coração. As lágrimas mancharam meu rosto.
Você esteve em coma por cinco anos. Sua filha está bem. Ela tem cinco anos. Você poderá ver ela em breve. Só precisa se esforçar e se curar. Você não quer que ela te veja assim?
Olhei para a prisão que era a minha cama. Tentei assimilar tudo o que estava acontecendo. O que eu perdi nesses anos, entre elas o crescimento da pessoa mais importante da minha vida. Nunca vi a face da minha garotinha. Não sei quem ela puxou, se foi eu ou o meu querido Vitor. Vitor. Meu coração doe ao pensar nele. Por que ele ainda não apareceu? Já faz mais de duas semanas que eu acordei e algumas horas que eu recebera o choque de ter perdido todo o crescimento da minha filha, e que eu nunca pude alimentar ela em meu seio.
Vi o céu escurecer, deixando de lado a esperança que eu iria ver a minha filha ainda hoje. A persiana fora deixada aberta a pedido meu. Em uma mesa ao lado da minha cama estava uma foto minha com a minha mãe. Ela adentrou o quarto ainda visivelmente emocionada, era assim que eu sempre a vejo depois que eu acordei. Depositou um beijo em minha cabeça e me estendeu um álbum de fotografia. Ficou pensativa antes de entregá-lo definitivamente em minha mão.
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O Despertar Da Bela (desgustação)
ChickLitMayra Costa acaba de acordar de um coma. Lembra-se que estava prestes a dar à luz a sua filha e que era casada com Vitor, seu amor desde os tempos da faculdade. Ao acordar atordoada em um hospital, não tem a mínima ideia que ela passou cinco anos em...