Conto dos Mortos - Final

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A noite estava bela. A lua cheia irradiava sua gloriosa magnitude. Eu sabia, era a noite perfeita para uma morte gostosa e divertida. Isso para Martin, ele tinha calculado os mínimos detalhes, desde como escolheria sua vítima até onde e como se livraria de seus restos mortais. O que descobri também é que ele era um brilhante roteirista. Ele escreveu toda a rotina desse dia tão esperado, que parecia um filme, e posso dizer que particularmente eu assistiria esse filme. Mas, enfim, Lucy e eu também não estávamos atrás, também nos preparamos para a nossa brincadeira não tão divertida assim. Acredite se quiser, isso vai doer bem mais em mim do que nele. Mas o que precisava ser feito iria ser feito.

Martin chegou. Como eu previa, estava acompanhado de sua próxima vítima, e assim como Lucy, também era uma jovem garota dos caminhos da perdição. Mas essa era diferente; Lucy era uma garota com beleza angelical e infantil, mas essa tinha um olhar malicioso e sua sensualidade era apimentada e extremamente fatal. Era uma bela mulher loira com olhos penetrantes e intimidadores. Tenho que confessar que fiquei surpreendido pela escolha do meu amiguinho psicopata, ele era do tipo que escolhia as vítimas mais fáceis e vulneráveis, parece que dessa vez ele queria um pouco mais de ação.

Os dois não perderam tempo, mal entraram no quarto já estavam todos despidos e se esfregando. Martin não era chegado em preliminares, ele já chegou colocando a puta de quatro e começou a se deliciar com aquele frenesi. Pude notar o horror nos olhos de Lucy, ela sentia repugnância daquele desgraçado. Fiquei com pena dela, mas também fiquei mais feliz, agora eu tinha certeza absoluta de que ela não iria dar para trás, ela iria fazer o que fosse preciso para impedir Martin.

- Não perca o foco, nós treinamos isso o dia todo. Precisamos nos concentrar e assim vamos conseguir influenciá-la – eu disse para a garota. Ela fez um sim com a cabeça, não disse uma palavra, apenas olhava com ódio mortal para a cara de prazer e excitação de Martin.

Assim que eles terminaram ficamos atentos, sabíamos o que viria em seguida.

- Lucy é agora…

- Posso tomar um banho? – Era a voz da prostituta, irei chamá-la de Laura.

Eu me distraí por um tempo, Martin estava deitado e relaxado, não tinha a atitude de alguém que estava prestes a matar. Fiquei confuso, aliás, ele estava se preparando por esse momento há dias. O que estava esperando? Será que tinha outros planos? Será que iria matá-la um pouco mais tarde? À meia-noite?

- O que houve? Por que parou? – indagou Lucy.

- Tem algo errado, ele ia matá-la agora, mas não matou.

- Perfeito, então vamos aproveitar o momento e fazer ela matá-lo.

- Ok.

Nos concentramos e nada aconteceu. Não entendi, ela não estava sendo atingida por nossa influência, não conseguimos possuir o corpo daquela desgraçada.

- E agora? Ela vai morrer! Achei que você sabia o que estava fazendo!

Lucy estava desesperada. Eu também estava.

- Eu estou tão confuso quanto você, eu sabia exatamente o que fazer, mas não está dando certo com ela.

- E como sabia se daria certo? Você já possuiu alguém antes?

-Não.

Ela me olhou com desprezo e raiva, ela me mataria se pudesse. Começou a berrar e a gritar, eu tentei acalmá-la, mas não adiantava. De repente as luzes começaram a piscar, a porta do quarto bateu, as janelas se fecharam. O quarto ficou lacrado e escuro.

- Que merda é essa? – disse Martin apavorado. Eu estava com tanto medo quanto ele, mas foi gratificante ver sua cara de espanto.

Os móveis do quarto começaram a cair, os livros foram arremessados contra a parede, um deles voou contra a janela e despencou andar a baixo. Martin ficou realmente desesperado. Mas agora eu estava preocupado com Lucy, eu nunca a vi assim antes; sua aparência juvenil e angelical havia desaparecido, ela estava mais parecida com um demônio.

Laura saiu do banheiro totalmente nua e molhada, começou a gritar também.

- Que merda é essa?! Eu quero sair daqui!

- Cala a boca sua vagabunda, quer atrair atenção para cá?

Martin pegou uma navalha que estava no bolso de sua calça e pulou em cima da mulher, porém ela havia percebido, e antes mesmo de Martin chegar a um centímetro de seu pescoço, ela havia jogado um abajur em sua cabeça.

Martin cambaleou e caiu. Laura não perdeu tempo, calçou seu tamanco e começou a pisar na cabeça do infeliz.

- Seu desgraçado! Quem você pensa que é para tentar me matar? Veado, filho da puta!

A cabeça de Martin estava toda furada do salto de tamanco, mas o infeliz ainda estava vivo. Eu não conseguia parar de admirar aquele momento tão inusitado. Depois de esburacar a cabeça de Martin, ela pegou o canivete que estava preso na mão do rapaz e sem hesitação enfiou em sua jugular, e para encerrar cuspiu na cara dele. Eu sabia, aquela mulher não era flor que se cheirasse, desde o começo eu sabia. Fiquei impressionado, mas fiquei mais ainda quando ela olhou em minha direção e deu um sorrisinho e uma piscada de olho. Fiquei paralisado, meus olhos não conseguiam nem piscar, eu fiquei sério e extasiado. Olhei para o lado para ver a reação de Lucy, ela não estava mais lá.

Laura me encarou mais um pouco, depois foi para a porta do quarto, me deu um tchauzinho e saiu. Eu fiquei lá, com minha cara de debiloide, apenas olhando a saída triunfal daquela “femme fatale”.

- O que aconteceu?

Olhei para o lado e vi nada mais nada menos que Martin, um garoto perdido e sem rumo que não fazia a menor ideia do que estava acontecendo.

- O que houve?

- Você morreu Martin.

- Por que?

- Ainda pergunta por que? Você foi um tremendo filho da puta.

- Eu conheço você, não é aquele antigo morador daqui? Aquele que se matou com veneno de rato?

- É, nós dois causamos nossa morte, e estamos condenados a passar o resto de nossa existência na solidão eterna. Mas juro que pensei que quando morresse você iria para o inferno.

- Quem se mata também não vai para o inferno?

- É o que eu pensava também.

- E agora?

- Bom, parece que agora só nos resta  conversar para passar o tempo, e distrair um ao outro. Te observei durante anos, te considerava meu companheiro de quarto, parece que agora vamos ser  de verdade.

Ficamos mais ou menos um mês juntos. Parece estranho, mas conhecendo Martin melhor eu passei a me simpatizar com ele. Parece que ele só era mais uma vítima do mundo chato e sem graça que vivemos. Como uma forma de escape ele buscava assumir a identidade de seus ídolos de filmes de terror e saborear uma diversão peculiar, ele era insano, isso é fato, mas no fundo não era um cara ruim. Depois de algum tempo nossa casa foi invadida e o seu corpo descoberto. Depois desse dia não vi mais Martin, não faço ideia do que aconteceu com ele, e também Lucy, que havia ganhado uma nova oportunidade. Estava feliz por ela, de uma certa forma acho que ajudei.

Bom, eu continuo aqui, observando cada membro que passa uma temporada com esse pobre fantasma. Um casal de gays com fetiches bem estranhos, uma mulher que era constantemente agredida pelo marido, um pai com dez filhos… Atualmente eu faço companhia a uma adolescente de quinze anos adepta ao sobrenatural, ela até tem uma tábua ouija, estou esperando ela usar para falar com ela, acho que podemos ser bons amigos.

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⏰ Última atualização: Jul 01, 2014 ⏰

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