Prólogo

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Entre todas as coisas, eu poderia dizer que aquele realmente era um dia frio — daqueles de congelar até a alma. Vincy estava brincando com algumas de suas bonecas e eu achava graça das altas gargalhadas que ela liberava enquanto falava com cada uma delas. Para minha irmã, aquilo era o sinônimo de felicidade: risos e bonecas eram a sua fuga. 

Eu gostaria de fugir, assim como ela fazia, mas para todos os lados em que olhava, eu notava a tensão que serpenteava no meio de nós. Algo errado estava acontecendo, eu entendia perfeitamente, mas nada do que eu perguntasse aos meus pais era respondido por eles.

Eles querem o seu bem. É melhor ficar longe de tudo isso.

— Luke, está na hora. — Mamãe vem até mim e tenta ajeitar a gola de minha camiseta branca, mas por mais que ela a alise e coloque-a no lugar, o pedaço de pano insiste em permanecer dobrado. Vejo que seus olhos encaram a gola com desconfiança e sua testa fica enrugada, entretanto, em questão de segundos, as coisas estão novamente perfeitas. — Assim está melhor, não é? Seu pai deve estar chegando.

Tento sorrir, mas este não é um bom dia. 

— O que está acontecendo? 

Dou de ombros.

— Nada, não é nada. — Ajeito uns fios de cabelo que caem sobre meus olhos. — Só estou um pouco entediado. 

O sorriso que brota nos lábios de minha mãe é o suficiente para que eu me sinta um pouco melhor.

— Sente-se aqui. — A cama é macia e o cheiro dos lençóis me faz pensar em pequenas flores. Eu adorava este aroma, pois me fazia lembrar de casa. Onde quer que estivesse, se eu o sentisse, sabia que estava seguro. — Eu quero dizer uma coisa.

Ela me puxa para perto de si, encostando minha cabeça em seu ombro.

— Tenho tanto orgulho de você e sua irmã, meu filho.

Desvencilho-me dela e a encaro com aflição. 

— Por que está dizendo isso? — Engulo a saliva com força, mas ela insiste em não descer por minha garganta.

Mamãe suspira e olha para cima; automaticamente entendo que ela está tentando controlar as lágrimas. Era o que ela sempre fazia para evitá-las.

— Eu quero que saiba o quanto eu os amo. 

Continuo confuso, mas consinto.

— Nós também te amamos. — Eu a abraço com força. — E amamos o papai.

Vejo o quanto ela balança a cabeça, soluçando em meus ouvidos.

Em seguida, suas mãos gélidas são encostadas em minhas bochechas que ainda estão um pouco quentes por causa da lareira. — Me prometa que cuidará de sua irmã, como sempre fez.

— É claro, mamãe. — Desta vez eu sorrio. — Vincy sempre estará em segurança.

Ela enxuga suas lágrimas com o dorso da mão. 

— Eu te admiro tanto, Luke. Você é um ótimo garoto. — Beijos estalados são depositados em minha cabeça. — Seja sempre esse garoto especial.

Antes que eu possa responder, meu pai entra no quarto fazendo um de seus sinais. Este era o meio de comunicação que eles usavam quando não queriam que escutássemos a conversa. As linhas de preocupação abaixo de seus olhos, também me preocupam.

— Depois nós buscaremos vocês dois, está certo? — Ela diz, mas sem tirar os olhos de meu pai. — Precisamos lidar com algumas situações e em seguida iremos à festa.

— Tudo bem. — Entrelaço meus dedos, olhando para cada um deles. Um dia, eu gostaria de ter um grande anel como o de meu pai. Eu faria por merecer.

Eles saem pela porta de entrada, sem olhar para trás. Vincy grita e acena, fazendo o possível para receber um pouco de atenção.

O máximo que eles lhe oferecem é um olhar, que dizia tantas coisas — que só compreenderíamos anos depois.

De um dia gélido e ruim, logo se transformaria no pior dia de minha vida.

Aquele silêncio que me concedi, foi o adeus que nunca pude entregar aos meus pais.

O ProibidoOnde histórias criam vida. Descubra agora