O cheiro dos pãezinhos de sua vó o deliciava. Era a coisa mais aprazível de se sentir naquela casinha no meio de campos. Além do amor de sua vó, claro.
Ele ficava ali, apenas a observando fazer o bolo, podia vê-la mexendo na massa fofa. Sentia uma vontade de experimentar... mas devia se contentar, ao menos esperar. Então, sem muito o que fazer, foi esperar na varanda. Ali estavam uma rede e vasos de plantas de folhas grossas e compridas, sem um aparente caule.
Se deitou na rede e começou a olhar o céu azul claro. Já o vira muitas vezes, mas dessa vez ele estava especial. Raras e rasas nuvens lhe entregavam uma textura fofa de massa de pão. Parecia algo tateável, mas nunca conseguiu descobrir se o era mesmo ou não.
O pão quentinho na sua mão esfriara, e ele, viajou, mergulhou numa ideia e não saiu de lá, pois era tudo o que ele queria.
Então ele voou. Voou, alcançou os céus no instante em que não estava mais lá ou ali. Sentiu o vento bater no seu rosto e balançar sua camisa, sentiu não um frio na barriga, mas uma nevasca e uma avalanche de sentimentos novos. Mergulhou em velocidade no céu, com seus cabelos tremendo como se estivessem com medo ou frio; mergulhou em velocidade, como se estivesse caindo na água, mas estava subindo nos céus; mergulhou em tremendo êxtase, como se estivesse ao lado da pessoa que amava, porém, sozinho; mergulhou em um dia claro de sol leve, como se estivesse brincando com uma criança feliz, ou melhor, como se fosse uma criança feliz, o que talvez sentia falta.
Todo aquele instante pode ter demorado apenas segundos, ou uma hora inteira, apenas para começar a voar, mas no instante em que chegou lá, tudo virou segundos.
O céu estava na sua frente, maior do que nunca, mais tateável e palatável do que nunca. Era uma incrível massa de realidade e veracidade. Uma massa fofa de pão.
Ele mergulhou lá, sentindo seu rosto se comprimir naquela sólida massa de imaginações e pensamentos, atropelado pelo seu corpo e por pura energia acumulada sendo forçada contra ele. Enfiou a cabeça nos céus como se fosse um pedaço de terra macia. Foi comprimido pela força do seu próprio sonho e amassado, com sangue escorrendo de suas juntas quebradas e peles rasgadas, como um ser mole prestes a ser pintado de vermelho. E seu corpo ficou ali no céu, pendurado, enquanto seu sangue caía e molhava a terra, como uma chuva colorida de um grandioso sonho, um suco feito de sonhos realizados.