Calazart

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Senti o sol em meu rosto, fazendo com que eu acordasse mais cedo que o normal. Estava me espreguiçando quando virei e dei de cara com meu pai sentado em minha poltrona vermelha. Ele estava em meu quarto... Logo de manhãzinha... Olhando-me com cara de quem não quer nada... Ele quer alguma coisa. Ou ele vai me pedir algo ou veio falar sobre algo sério e pelo tanto que o conheço já sei até o que é.
 Você veio falar sobre o casamento, não veio? – Perguntei-lhe cerrando os olhos por conta da claridade.
 Primeiramente, bom dia! – Disse ele levantando da cadeira, vindo sentar-se ao meu lado. – E sim, vim falar sobre o casamento.
 Você sabe que minha resposta ainda é não, né? – Falei friamente. – Eu não quero casar pai. Não agora e quando eu for casar, quero que seja por amor.
 Você pode sentir algo por ele. Você pode conhecê-lo, você irá gostar dele. O amor irá vim com o tempo.
 Eu quero que o casamento venha acompanhando o amor, não o contrário.
 Na vida, nem tudo que queremos podemos ter – disse ele passando a mão pelos meus cabelos. – É por seu país. Calazart e Erthenio esta em suas mãos. Tudo vai depender de sua escolha.
 Eu já disse e vou repetir, pai. Desculpe-me, mas eu não irei me casar com Damián.
     Percebi o como ele estava com raiva por eu ter o contrariado. Não vou permitir que ele me obrigue a casar. Eu amo meu pai, mas ele na maioria das vezes põe o país antes da família. Principalmente dos filhos. Não quero fazer nada contra minha vontade. Levantei-me da cama e fui à cozinha. Precisava de algo para comer. Pedi para que a cozinheira me preparasse algo simples, rápido e gostoso. Ela me preparou uma salada básica com pão e geleia e um copo de suco de laranja. Comi bem rápido, tinha acordado com fome e precisa encher a minha barriga. Após comer fui para a sala de estar. Estava quase dormindo – novamente – no sofá quando alguém bateu a porta me chamando. Era Cecília, uma de nossas criadas.
 Sim? – Perguntei.
 Nada senhorita. Vossa majestade que mandou te procurar – disse ela já fechando a porta atrás de si.
     Porque meu pai estaria me procurando? Será que ele quer estourar meu juízo com a história do casamento? Ouvi a porta se abrir novamente.
 Pai, se veio para falar sobre o casamento de novo, pode esquecer! –Gritei. Quando virei-me para a porta percebi que não era ele.
 Desculpe-me senhorita, mas você é muito nova para ser minha filha e eu também não tenho nenhum interesse em falar sobre tal assunto – disse Damián vindo se sentar em uma cadeira do lado do sofá em que eu estava.
 Eu que devo pedir-lhe desculpas, achei que fosse meu pai. Ele logo cedo veio falar sobre isso e eu sinceramente estou cansada de falar sobre um assunto que eu não tenho interesse – decidi sentar no sofá. – Porque você está aqui? – Perguntei.
 Seu pai e meu pai fizeram com que eu viesse falar com você. Seu pai disse que estava com você, mas quando voltou no seu quarto você tinha sumido.
 É tinha ido comer algo – Cecília estava a minha procura por conta de meu pai. Ele queria me encontrar. – Bom, então...
 Ambos não queremos casar. Ambos somos herdeiros. Ambos estamos em um casamento arranjado onde não queríamos estar – disse ele.
 É. – comentei.
 Vamos fazer apenas uma coisa do que eles querem.
 Como o que? – Franzi o cenho. Se ele está achando que eu vou concordar em me casar com ele. Está ligeiramente enganado. – Nos casar?
 Não! – riu. – Nos conhecer. Talvez seja uma boa, vai que a gente cria uma amizade no meio de toda essa repercussão que estão fazendo em torno de um casório.
 Já estamos nos conhecendo. Prazer Vossa Alteza Luanda Rei.
     Levantei e fiz uma reverência. Ele fez o mesmo e ambos rimos. Ele é uma pessoa legal, mas não é a pessoa na qual me vejo ao lado daqui a 40 anos.
 Porque você está aqui? – Perguntou.
 Não sei ao certo como responder essa sua pergunta. Você eu sei que está aqui por obrigação. Onde você queria estar?
 Na verdade eu queria estar jogando cartas junto com... Alguém importante. -Ele se inclinou um pouco para trás e jogou as pernas por cima do centro. –  E você? O que queria estar fazendo?
 Tomando vinho junto com uns amigos – ri e depois continuei. – Ah! Nossa eu não tenho amigos – dei de ombros.
 Tem um agora.
Já se passaram duas semanas desde que meu pai e o Rei Silas fizeram com que Damián conversasse comigo. Foi uma boa. Eles pretendem ficar dois meses aqui em Calazart. Nessas tempo Damián tem ficado comigo o tempo todo. Ele sempre arruma algo para nós dois fazermos. E às vezes meu irmão vem também, mas percebi certo ciúme vindo dele por ter passado mais tempo com o Príncipe de Erthenio do que com ele. Damián me ensinou a jogar cartas. Temos feito bastantes cavalgadas junto com tiro ao alvo. Dois esportes que ambos gostamos muito. Tenho tido uma boa convivência com ele nesse tempo. Era época de inverno e já estava começando a nevar. Como sempre, o castelo fica cheio nesta época. Visitas de duques, duquesas, rei e rainhas de outros países. Em modo geral, as pessoas de alta importância. Meu pai gosta muito quando o palácio fica cheio. Ele se sente bem mais importante do que já é. Se bem que é uma das duas épocas do ano em que ele fica dia e noite na sala do trono. Sentado, obviamente, em seu trono com sua coroa reluzente. No dia de hoje especialmente, eu percebi que estavam todos em alerta. Todos estavam cochichando. Ao chegar à sala do trono, vi que meu pai andava de um lado para o outro, com seus braços grandes e fortes atrás de suas costas e de nariz empinado. Só algo grave para deixá-lo assim.
 Majestade – fiz uma reverência e entrei na sala.
 Luanda – falou friamente.
 Aconteceu algo que eu deveria saber? – Perguntei.
 Na verdade sim – ele acenou para que eu fosse até ele –, venha. Nove de nossos cavalheiros foram encontrados mortos na vila Tsariê. Os prenderam em árvores e fizeram um x em suas barrigas.
Até que ele parecia um pouco preocupado. Mas por conta dos rebeldes que fizeram isso, não por seus soldados terem sido capturados e mortos. Ele não se importa com ninguém, até o bendito momento em que seu trono está em jogo. Se fizeram isso com os soldados é porque querem atingir o rei. Um rei ganancioso, politicamente falando.
 Quanta crueldade. Tem idéia de quem poderia ter feito isso? – Perguntei. Ao contrário dele eu não me importo apenas com a minha segurança ou a dele.  Preocupa-me a segurança de todos os meus súditos. Toda essa preocupação vai trazer desgraça para mim.
 Na verdade, não. Por dois séculos estamos em paz. Não me vem ninguém a cabeça – disse ele passando a mão por seus cabelos negros. – Orglin tem um tratado de paz conosco. Ninguém de seu reino entra aqui. Nem mesmo um pássaro. A filha do rei de Klakend quer se casar com seu irmão. Eu rejeitei, mas estamos fazendo um acordo. Ele não estragaria o acordo por um pequeno atentado.
 Iremos à vila para investigar. Né, pai? – Perguntei
 Tome a frente nesse assunto. Logo mais será rainha – falou ele saindo de perto de mim.
Meu pai queria que eu arrumasse esse problema. Ele tem feito isso comigo a uns três meses. Pondo-me a frente de tudo. Tenho que pensar como ele. O que ele faria? Perguntei para mim mesma. Bom, a melhor opção até agora é ir à vila e perguntar aos moradores sobre tal crime. Dar um anúncio. Falei a meu pai sobre o meu plano de ir à vila nos pronunciar. Ele disse que poderia ser perigoso, mas que iríamos. Após o almoço fomos para a carruagem. Meu pai, minha mãe, meu irmão e eu fomos à carruagem e os nossos guardas foram em seus cavalos. Seis na frente e seis atrás. Tínhamos que atravessar o rio para chegar a Tsariê. Quando chegamos, havia um mini palco de pronunciamento onde os reis e rainhas ficavam para comunicar aos aldeões. Todos do vilarejo vieram nos saudar. Idosos, crianças e entre outros. Após os reis se pronunciarem, era a minha vez de dar a voz.
 Boa tarde! Aldeões do vilarejo de Tsariê. Estamos aqui hoje para fazer um pronunciamento. – Olhei uma última vez para meu pai. – Bom, como todos sabem, houve um ataque nessa noite, aos nossos soldados que faziam uma inspeção quinzenal. Não sabemos quem poderia ter feito isso, com tamanha crueldade. Gostaríamos de descobrir quem fez isso, para que possamos puni-los conforme a lei. Nove de nossos soldados mortos. Não poderia ser apenas uma pessoa. Peçamos a compreensão e ajuda de vocês. Para quem souber de algo, será muito bem recebido em nosso castelo e também daremos uma recompensa. Um emprego no Palácio de Inverno. Espero que entendam em como queremos achá-los e nos ajudem nessa busca. Obrigada pela atenção de vocês.
Meu pai se pôs a minha frente. E falou.
 Se ninguém se pronunciar, a vila pagara o pato de tais fatos cometidos por total desconhecido. Se por acaso descobrirmos que alguém está escondendo o assassino, será açoitado perante todos que aqui estão presentes, como um aviso prévio de que ninguém trai a coroa. Espero que tenham entendido.
Ele se direcionou para a carruagem e entrou. Fui logo atrás de meu irmão, seguido por minha mãe. Todos entraram e meu pai começou a falar em como eu deveria ter sido mais rígida. Em como eu deveria parecer forte para aqueles que nos seguem. Que eu deveria ser igual a ele. Mas eu não queria ser igual a ele, nem mesmo 0,1%. Meu pai só pensa em política, poder, riqueza. Eu não sou assim. Quando chegamos ao palácio, fomos avisados de que a rainha da Legião Ventre estava presente, que tinha chegado há pouco tempo. Ela estava na sala de reuniões. Legião Ventre é um reino governado por Catarina. Ela teve de assumir o trono aos 17 anos de idade. Pois seus pais faleceram por uma doença que não quiseram revelar. Atualmente ela está com 20 anos. Com certeza meu pai mandará eu assumir seja lá o que for. Dito e feito. Meu pai disse que qualquer caso grave, mandassem chamá-lo, mas eu assumiria daqui. Fui para a sala onde Catarina estava a espera. Ao entrar ela se levantou calmamente e fez uma reverência.
 Rainha Catarina. – Reverenciei.
 Vossa Alteza. Não esperava por você. Estava à espera do rei Taniel – disse ela franzindo o cenho. Seu cabelo estava solto, com apenas uma pequena trança. O ruivo vivo se destacava na claridade que entrava pela janela.
 Eu sei minha cara. Mas meu pai me mandou em seu lugar.  Gostaria de um chá?
 Não obrigada.
 Por favor, sente-se. – Ofereci e ambas sentamos.
 O que deseja rainha Catarina? – Perguntei diretamente.
 Como você deve saber, meu reino tem passado por vários ataques de rebeldes. Eles estão acabando com meus soldados. Vim em busca de um acordo.
 Pelo o que eu pude entender você quer um exercito certo? O que você tem a me oferecer em troca? – Não foi difícil adivinhar o que ela queria. Estava acontecendo no reino dela o que acabara de acontecer com alguns de nossos soldados.
 Bom, princesa Luanda, não tem nada para ser oferecido por ora. Mas eu posso ficar em divida com vocês. Agora eu preciso de um exercito, bem sei que você tem dois exércitos em reserva. Quando vocês precisarem, podem ir atrás de mim, podem ir a meu reino quando quiserem e me pedir o que for que eu atenderei a seus pedidos em troca do exército que eu tanto preciso para manter meu reino intacto. Posso me aliar a vocês.
Pensando bastante, pode ser ou não útil para mim. Catarina não é nossa aliada, mas também não é nossa inimiga. Não sei o que meu pai faria neste caso. Meu pai com certeza quer uma garantia, ele vai querer se sair bem nessa troca. Não posso chamá-lo, senão ele virá com mais sermões para cima de mim. Não posso liberar os exércitos sem nenhuma garantia de que ela irá cumprir a parte de seu acordo.  Eu tenho que pedir algo em troca, nem que seja uma coisa pequena, não posso sair de mãos abanando. Já sei! Gritei na minha mente.
 Tem algo que você poderia me oferecer em troca do exército.
 O que seria alteza? – Perguntou ela arqueando uma sobrancelha.
 Terras. – Falei.
 Terras? – Levantou-se em um salto.
 Sim, terras! É um acordo ruim para você? – Perguntei com um leve sorriso.
 Não, não... É só que, o que a leva querer terras em meu reino?
 Como você sabe, meu pai é bem ambicioso. Mas eu não quero qualquer terra, eu quero o Rio Pôr da Lua.
 O Rio Pôr da Lua é usado para os aldeões de meu reino para recursos pessoais – protestou.
 Eu não preciso ouvir seus argumentos Catarina – disse eu rispidamente. – Quer um exército? Esta é a troca. Troca justa, não? Você vai levar o meu exército, que eu posso precisar. Eu ficarei com o Rio Pôr da Lua. Que não te serve tanto além de seus súditos. Eles poderão usar normalmente, só que a terra passará para meu nome.
 O rei concordará com este acordo? – Perguntou contrariada.
A mulher vem em meu castelo para fazer uma troca, eu lhe dou uma oferta e ela ainda acha ruim? Sairia-me uma boa rainha, mas eu realmente não quero ser.
    — Eu que estou aqui. Ele me deixou para tomar a decisão que for. Eu sou a rainha neste momento. Ele com certeza vai concordar com este acordo.
—Feito – disse ela vindo até mim. – Grande rainha você irá se tornar alteza – sorri. – Prepare o contrato para que possamos selar este acordo. Obrigada por sua atenção.
— Obrigada a você, rainha Catarina da Legião Ventre. Sinta-se a vontade para se hospedar aqui até o contrato ser feito.
— Terei de ir embora amanhã alteza. Como lhe disse, meu reino está sob ataque, não posso deixá-los por tanto tempo.
— Decerto o contrato estará pronto amanhã pela manhã. Mando lhe chamar. Pode ficar a vontade. Minha casa, sua casa. Avisarei Cecília de que você ficará por uma noite. Mandarei ela lhe levar para seus aposentos quando estiverem prontos.
Ambas fizemos uma reverência e ela saiu, assim que as portas foram fechadas eu me sentei na cadeira e soltei um suspiro bem aliviado. Esperei por cinco minutos exatos para que meu pai viesse falar comigo, mas ele não veio, então fui atrás dele. Não sabia exatamente por onde começar a procurar. Ainda estava de dia, ele poderia estar em qualquer lugar do castelo. Chamei Cecília para que ela fosse atrás dele, mandei que ela dissesse que eu estava esperando por ele no salão principal.

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⏰ Última atualização: May 21, 2018 ⏰

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