he is back

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A chuva era angustiante. A partir do momento que escurecera, a água caia dos céus terrivelmente, o vento forçava as árvores a dançarem desesperadamente e os animais corriam em busca de abrigo. As gotas na janela iriam demorar para sair.

Nesse cenário certamente abrupto, Jungkook estava sentado na sala da grande casa, que segundo seus pais, havia herdado de seus avós – parentes que não teve a sorte de conhecer. A casa era longe até demais de algum tipo de cidade e o contato com o resto do mundo era pouco, mas nada disso incomodava a família que residia ali. Na verdade, isso a aliviava.

A lareira esquentava a sala e fazia pouco tempo desde que Jungkook terminara seu chocolate quente, que era irrecusável num clima chuvoso como aquele. Mas, de repente, um sentimento estranho passou pelo herdeiro da casa, e de certo modo, sentia que algo estava errado.

Checou o topo das escadas. O andar de cima já estava com todas as luzes desligadas, o que significava que seu pai já tinha saído do escritório e ido dormir. Ou seja, Jungkook poderia ir para seu quarto sem precisar passar por seu progenitor, com quem tivera uma briga terrível naquela manhã. Por algum motivo, não se lembrava direito a razão, mas sabia que tinha algo a ver com algo que fizera, que seu pai julgava indesculpável. Deu de ombros e seguiu seu caminho.

Subiu cada degrau com cuidado, afinal a casa não era nova e barulhos eram comuns. Na parede, havia pendurada fotos da família e de poucos amigos. Quando Jungkook chegou no sexto degrau, suspirou ao ver a fotografia que havia ali.

Era ele e seu velho amigo, Park Jimin. Estavam num campo verde, onde acamparam por sete dias, tendo todo aquele tempo apenas para eles. Foi maravilhoso, conversaram sobre tudo: fim do mundo, livros, noites chuvosas... Até que, numa noite especial, descobriram um sentimento em comum que gerou outras coisas, e até fizeram as famosas juras de amor. Jungkook poderia até dizer que aqueles foram os melhores sete dias da vida de ambos. Os dois eram perfeitos juntos. No final, eram muito mais que amigos.

Mas, mais tarde, parecia que os acontecimentos entre eles não significaram muita coisa para Jimin. Ele simplesmente começou a ignorar as chamadas de Jungkook e toda vez que o encontrava pessoalmente — que eram muitas vezes, até porque seus pais também eram amigos —, ignorava-o. Talvez, se prestasse bastante atenção, Jungkook ainda era capaz de escutar: "Eu não quero mais lembrar do que aconteceu. Foi um erro, Jungkook. Não me procure mais".

Pena que Jimin foi encontrado morto três semanas depois disso. Ah, e inclusive, foi numa noite chuvosa como essa, sob circunstâncias duvidosas, que Jungkook recebeu a notícia que seu amado já não estava mais entre ele. Lembrando-se bem, também tomava chocolate quente naquela noite. Porém, aquilo fora há muito tempo. Ainda não entendia o que tinha feito de errado. Por que Jimin quis terminar as coisas do nada? Foi tudo perfeito! Jungkook queria ter Jimin sempre, e acabar com as coisas do nada foi, certamente, um ato sem pensar. Mesmo assim, não adiantava nada questionar. Não tem ninguém para responder às perguntas.

Jungkook continuou subindo as escadas e ligou a lanterna de seu celular para guiar-se na casa escura, tentando se esquecer das memórias que voltaram à tona.

Até que passou pela porta do sótão e escutou um barulho vindo lá de dentro. Aquele lugar também trazia algumas memórias, nem tão boas.

Justamente pelo tempo em que a casa fora construída, a entrada para o sótão era bem escondida: apenas ao puxar uma cordinha no teto, escada caia lentamente. Além disso, era difícil de encontrar. Certamente seria complicado subir ali carregando algo, ou até mesmo um corpo. Era incomum ter barulho e quando tinha, era provavelmente algum animal. Mas Jungkook sabia que havia algo errado ali. Foi levado pelo seu sentimento e puxou a cordinha.

Assim como a primeira escada, subiu com cuidado. Não queria acordar seus pais ou alertar o que quer que estivesse lá em cima.

O sótão era empoeirado e era repleto de coisas, agora inúteis, mas que tinham um grande valor sentimental.

Ele escutou outro barulho, mais grave dessa vez. Chegando no sótão, virou para trás, a fim de seguir o som. E, além de descobrir de onde vinha, descobriu de quem vinha.

Atrás de uma caixa, alguém se espreguiçava lentamente e com uma dificuldade extrema. A chuva fazia cada vez mais barulho e o vento ficava ainda mais forte. Jungkook se aproximou do ser atrás da caixa, dando cada passo com o maior cuidado do mundo, com os olhos arregalados e a boca trêmula. Segurava a respiração e isso fazia seu peito tremer.

Sua forma não era grande, porém magra e parecia fraca. Com a lanterna de Jungkook, era possível ver a cor cintilante e molhada pela chuva dos cabelos negros da pessoa, além de ter um excesso estranho de pêlos nas costas, também molhados pela chuva. Com uma virada instintiva de rosto, Jungkook reconheceu quem era.

Bem aonde tinha sido encontrado morto, lá estava ele.

Park Jimin.

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